Comentário ao caso tenorio roca outros vs. Peru

AutorJúlia Knauer Carvalho
Páginas31-32
31
ORGANIZADORA
PAULA WOJCIKIEWICZ ALMEIDA
B. B.
JURISPRUDÊNCIA INTERNACIONAL
COMENTÁRIO AO CASO TENORIO ROCA E OUTROS
VS. PERU
SENTENÇA DE 22 DE JUNHO DE 2016
Em sentença
promulgada em 22 de junho de
2016, a Corte Interamericana
de Direitos Humanos condenou
a República do Peru pelo
desaparecimento forçado do Sr.
Rigoberto Tenorio Roca, a partir
do dia 7 de julho de 1984. A corte
considerou violados os direitos
à liberdade e integridade física,
à vida e ao reconhecimento da
personalidade jurídica, conforme
artigos 7, 5.1, 5.2, 4.1 e 3 do Pacto
de San José da Costa Rica de
1969.
O caso diz respeito aos fatos
ocorridos na década de 1980,
quando a América Latina, de
modo geral, presenciava a
ocorrência de guerrilhas que
utilizavam a luta armada para
combater as ditaduras instaladas
nos países. No caso do Peru,
em 12 de outubro de 1981, foi
decretado Estado de Emergência,
suspendendo-se algumas
garantias constitucionais, e em
21 de janeiro de 1983 outorgou-se
à Marinha de Guerra o controle
da ordem interna da província
de Huanda. Nesse período,
expandiu-se o grupo guerrilheiro
Sendero Luminoso, inspirado na
teoria maoísta.
Narram os requerentes que, em
7 de julho de 1984, oficiais da
marinha abordaram o Sr. Tenorio
Roca em um ônibus e, após
conferirem seus documentos,
cobriram seu rosto com um saco
e o fizeram entrar em um tanque,
fato este testemunhado pela
esposa do mesmo e por diversos
passageiros do ônibus. Depois
desses acontecimentos, a família
nunca mais teve notícias de seu
paradeiro.
A Corte Interamericana concluiu
que houve uma negativa por
parte do Estado de reconhecer a
detenção e de revelar o paradeiro
do Sr. Tenorio Roca. Ademais, os
fatos indicam características de
desaparecimento forçado, com
participação de forças estatais.
Outrossim, as investigações
realizadas em foro local foram
infrutíferas, não determinando
Por Júlia Knauer Carvalho*
nem o paradeiro do Sr. Tenorio
Roca, tampouco identificando e
sancionando os culpados, ainda
após trinta e dois anos.
Assim, a Corte impôs a obrigação
estatal de realizar publicações
desta sentença e reconhecer a
responsabilidade internacional
do Peru pelos fatos do presente
caso, além do pagamento de
indenizações e outras sanções.
Ademais, a sentença reitera o
posicionamento da Corte sobre o
direito de acesso à justiça, tendo
em vista que uma das penas diz
respeito à correta averiguação
do ocorrido perante a justiça
nacional, de modo a identificar,
julgar e, sendo o caso, condenar
todos os responsáveis pelo
desaparecimento forçado do Sr.
Rigoberto Tenorio Roca.
Entretanto, como diversos países
latino-americanos, o Peru possui
uma Lei de Anistia que impede
investigações de crimes ocorridos
em certos períodos. A existência
dessa lei contraria a obrigação do
Estado de adequar sua legislação à
Convenção Americana, conforme
determina o artigo 2º, e viola o
direito às garantias judiciais (8.1)
e à proteção judicial (25.1). Nesse
sentido, outro dispositivo da
sentença é, justamente, a reforma
da legislação penal peruana de
modo a tipificar como crime
o desaparecimento forçado e
adequar a matéria aos parâmetros
internacionais.
Por fim, é justo ressaltar que a
Corte condenou o Brasil em 2010
em caso semelhante, relativo
à Guerrilha do Araguaia. A
sentença também determinava
a investigação dos crimes e
punição dos devidos culpados; a
obrigação de localizar o paradeiro
das vítimas; a tipificação penal
do desaparecimento forçado e
a adequação da legislação aos
parâmetros internacionais;
dentre outras medidas.
À época, a CIDH entendeu
que “as disposições da Lei de
Anistia brasileira que impedem
a investigação e sanção de
graves violações de direitos
humanos são incompatíveis
com a Convenção Americana,
carecem de efeitos jurídicos e
não podem seguir representando
um obstáculo para a investigação
dos fatos do presente caso, nem
para a identificação e punição dos
responsáveis, e tampouco podem
ter igual ou semelhante impacto a
respeito de outros casos de graves
violações de direitos humanos
consagrados na Convenção
Americana ocorridos no Brasil”.
O Supremo Tribunal Federal,
todavia, entendeu pela
constitucionalidade da Lei de
Anistia e decidiu mantê-la (ADPF
153/2008), impedindo que o caso
fosse devidamente julgado pela
justiça brasileira, mantendo o
Brasil em mora perante a Corte
Interamericana de Direitos
Humanos.
* Graduanda em Direito pela
Universidade Federal
Fluminense (UFF).
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