Comentários sobre a Lei n. 13.103/2015 - Motorista profissional

AutorCélio Pereira Oliveira Neto
Páginas195-213

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“Gente que não tem dúvida não cria, não avança, não inova, só repete.” Mario Sergio Cortella citando Paulo Freire

Objetivo

Por meio do presente artigo apresentam-se breves comentários sobre a Lei n. 13.103, que trata do exercício da profissão de moto rista, e foi sancionada pela Presidente da República em 2 de março de 2015 — traçando comparativo com a Lei n. 12.619. O objetivo é lançar as primeiras luzes sobre a nova lei, que não só revoga em parte a anterior, como também inclui disposições na lei do Transportador Autônomo de Carga (Lei n. 11.442, de 2007) criando a figura do TAC autônomo, assim como regulamenta dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro.

Introdução

A Lei n. 13.103 é fruto dos Projetos de Lei ns. 4.246/12 e 5.943/13, que tramitaram em conjunto no Congresso Nacional. Segundo o deputado Jerôni mo Goergen (PP/RS), autor do PL n. 4.246/12, a lei anterior “se mostrou completamente desconectada da realidade das estradas brasileiras”1, razão de terem sido feito alguns ajustes, afirma ele. O texto final aprovado é um substitutivo da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, relatado pelo deputado Jovair Arantes (PTB/GO).

Erroneamente intitulada pela imprensa de “Lei dos Caminhoneiros”, em verdade, a Lei n. 13.103 rege as relações dos motoristas profissionais nas atividades de transporte rodoviário de cargas e de passageiros.

A lei anterior (12.619) se aplicava aos motoristas profissionais que atuavam nas atividades de transporte de passageiros ou de cargas, desde que mediante vínculo empregatício. Com a Lei n. 13.103, há importantes modificações logo no início, não se exigindo a relação de emprego, estendendo-se, com isso benefícios de formação profissional, atendimento profilático, terapêutico, reabilitador principalmente quanto a doenças profissionais, proteção do Estado contra ações criminosas e atendimento especializado de medicina ocupacional também aos autônomos. Mexe-se também na Lei n. 11.442/2007, conforme será tratado ao longo da presente exposição.

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1. Autônomos e empregados

O Parágrafo Único do art. 1º da Lei n. 12.619 limitava a aplicação da lei pretérita aos motoristas empregados, ao passo que a atual retirou a exigência do vínculo, de modo a estender aos autônomos alguns dos direitos previstos. São eles:

  1. direito a participar de programa de formação profissional, preferencialmente mediante curso técnicos e especializados, normatizados pelo Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) em cooperação com o poder público, nos termos do art. 2º, inciso I da Lei n. 13.103. Comparada com a lei pretérita afora a extensão aos autônomos de que trata a lei, foi inserida disposição de preferência pelos cursos técnicos e especializados, normatizados pelo CONTRAN;

  2. direito de receber proteção do Estado contra ações criminosas que lhes sejam dirigidas no exercício da profissão, nos termos do art. 2º, inciso III da Lei n. 13.103 — que segue a mesma redação do art. 2º, inciso IV da Lei n. 12.619 — o que reforça a responsabilidade do Estado no que tange à segurança pública, mormente em se tratando de assaltos ou mesmos incêndios provocados por marginais;

  3. contar com atendimento profilático, terapêutico, reabilitador, especialmente no que tange às doenças do trabalho que mais os acometem, por meio do Sistema Único de Saúde. No mais, se comparada com a lei anterior, retirou-se a remissão ao levantamento oficial das doenças que mais acometem os motoristas e à observância do disposto no art. 162 da CLT, que trata das obrigações das empresas no que tange à medicina do trabalho;

  4. ser atendido pelo SUS, em se tratando de dependente de substância psicoativa, podendo ser realizados convênios com entidades privadas. A disposição do art. 3º da Lei n. 13.103 não constava da lei anterior, nem mesmo para os empregados.

1.1. Proibição de premiação

O art. 235-G da Lei n. 13.103 se apresenta de modo diverso de seu antecessor. Com efeito, enquanto o art. 235-G da Lei n. 12.619 dizia ser proibida a remuneração do motorista em função da distância percorrida, tempo de viagem, nature za e quantidade de produtos ofertados, mediante comissão ou outra vantagem, quando comprometesse a segurança rodoviária ou da coletividade ou ensejasse descumprimento da legislação — a nova redação diz ser permitida a remuneração, desde que se cumpram os preceitos de segurança da rodovia e da coletividade, e também das disposições previstas na Lei n. 13.103.

Muda-se, pois, a forma de apresentação da lei, de modo a se atrair o uso da premiação mediante a permissão, observadas as condicionantes impostas — ao passo que na lei anterior usava-se a proibição, para excepcionalmente permitir desde que cumpridos os requisitos impostos. O resultado final pode até parecer igual, e até é similar, mas não idêntico, haja vista o incentivo que a fórmula atual representa se comparada à anterior.

Ademais, o preceito se aplica não somente aos empregados, mas também aos autônomos.

2. Motoristas empregados
2.1. Direitos

A exemplo da Lei n. 12.619, o empregado motorista possui os seguintes direitos enumerados:

  1. não responder perante o empregador, por prejuízo patrimonial gerado por ação de terceiros, salvo na hipótese de comprovado dolo ou desídia no exercício das funções, consoante art. 2º, inciso V, alíne a “a” da Lei n. 13.103 — que guarda a mesma redação do art. 2º, inciso III da Lei n. 12.619;

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    b) jornada de trabalho controlada e registrada de maneira fidedigna, por meio de diário de bordo, papeleta ou ficha de trabalho externo, ou outros sistemas e meios eletrônicos instalados a critério do empregador, a teor do art. 2º, inciso V, alínea “b” da Lei n. 13.103 — que tem a mesma redação do art. 2º, inciso V da Lei n. 12.6192;

  2. seguro obrigatório destinado à cobertura de morte natural, morte por acidente, invalidez total ou parcial decorrente de acidente, traslado e auxílio para funeral, custeado pelo empregador, no valor mínimo de 10 (dez) vezes o piso da categoria, a fim de cobrir riscos pessoais inerentes às suas atividades, consoante art. 2º, inciso V, alínea “c” da Lei n. 13.103.

    No mais, faz-se remissão aos direitos relacionados no item antecedente, que são de todos os motoristas profissionais autônomos e empregados, que atuam no setor de transporte rodoviário de passageiros e de cargas.

2.2. Deveres

Permanecem os deveres do motorista profissional empregado de:

  1. estar atento às condições de segurança do veículo, bem como conduzir o veículo com perícia, prudência, zelo e observância aos princípios de direção defensiva, eis que inalterados os incisos I e II do art. 235-B da CLT, cuja redação foi dada pela Lei n. 12.619;

  2. ze lar pela carga transportada e pelo veículo, e colocar-se à disposição dos órgãos públicos de fiscalização na via pública, considerada a manutenção do disposto nos IV e V do art. 235-B, consoante redação da Lei n. 12.619;

  3. respeitar a legislação de trânsito, com destaque para as normas relativas ao tempo de direção e de descanso, conforme regra do inciso III do art. 235-B — constando remissão na nova lei ao controle e registro na forma do art. 67-E da Lei n. 9.503/97, nos termos da redação dada pela Lei n. 13.103;

  4. submeter-se a exames toxicológicos e programa de controle de uso de droga e bebida alcoólica, instituído pelo empregador. A lei anterior previa teste e participação em programa, sendo a Lei
    n. 13.103 expressa ao prever a submissão a exames toxicológicos.

2.3. Exames toxicológicos

O art. 168 da CLT recebeu a inclusão dos §§ 6º e 7º a fim de permitir a realização de exames toxicológicos quando da admissão e demissão de motoristas profissionais, admitida contraprova em caso de resultado positivo.

Nos termos da nova redação do art. 235-B da CLT, disciplinou-se a janela de detecção de 90 dias para exames toxicológicos, assim como peri odicidade para controle do uso de droga e bebida alcoólica (instituído pelo empregador e com ampla ciência do empregado) ao menos uma vez a cada 2 anos e 6 meses, assim como a possibilidade de uso do exame de que trata a Lei n. 9.503, de 19973,

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este desde que realizado nos últimos 60 dias. A recusa do empregado em participar do programa ou se submeter ao teste importa infração disciplinar, passível de punição.

O exame periódico será exigido para a renovação e a habilitação das categorias C, D e E consoante prazos e redação dada pela Lei n. 13.103 aos §§ 2º e 3º do art. 148-A do CTB, e se admitirá recurso administrativo e contraprova consoante redação do § 4º do art. 148-A do CTB.

A reprovação no exame em tela, terá por consequência a suspensão do direito de dirigir pelo período de 3 (três) meses, condicionado a resultado negativo em novo exame, e vedada a aplicação de outras penalidades, ainda que acessórias nos termos do § 5º do art. 148-A do CTB.

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