Comentários à reforma trabalhista: Processo do trabalho - justiça gratuita, honorários, custas, execução

AutorCassio Colombo Filho
Páginas431-442

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Ver Nota1

Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente,

mas o que melhor se adapta às mudanças. (Leon C. Megginson)

Neste ensaio segue resumo das ideias e fundamentos relativos aos temas que me foram solicitados ministrar no “ Seminário Reforma Trabalhista e a nova CLT ponto a ponto” organizado pelo ilustre Professor José Afonso Dallegrave Neto, realizado na Academia Paranaense de Estudos Jurídicos — APEJ nos meses de setembro e outubro de 2017, cabendo-me uma parte da matéria atinente ao direito processual do trabalho, conforme enuncia-se a seguir.

Por intermédio da Lei n. 13.467/20172, publicada em 14.7.2017, temos uma nova Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para ditar os rumos das relações de trabalho subordinado no Brasil.

Taí!! A “nova CLT” é fruto da alteração de cerca de uma centena de artigos e adveio de um projeto não discutido com a sociedade, feito à imagem e semelhança das “101 propostas para modernização trabalhista”3 da Confederação Nacional da Indústria, em gabinete fechado, por al-guns juristas escolhidos para adaptá-las e dar-lhes um ar de isenção, aprovada num Congresso Nacional que aparentemente nem entendeu o que aprovou, dado seu exíguo prazo de tramitação, e chancelada por um Poder Executivo mergulhado num mar de denúncias de corrupção.

Uma lei feita às pressas, carente de debates, num momento de grave crise política e economia abalada, só podia ensejar mais celeuma do que soluções.

Atualmente as opiniões dividem-se entre o acerto e vali-dade das normas e sua invalidade por afronta a garantias constitucionais, convenções e tratados internacionais (inconstitucionalidades e inconvencionalidades).

A ANAMATRA — Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho promoveu a 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, em Brasília-DF, nos dias 9 e 10 de outubro de 2017, na qual foram aprovadas

125 propostas de interpretação e aplicação da Lei n.
13.467/20174, das quais destaco as teses abaixo relativas à interpretação da Reforma Trabalhista:

Comissão 1 — Enunciado 2 das teses aglutinadas — INTER-PRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA LEI N. 13.467/2017. Os juízes do trabalho, à maneira de todos os demais magistrados, em todos os ramos do judiciário, devem cumprir e fazer cumprir a constituição e as leis, o que importa no exercício do controle difuso de constitucionalidade e no controle de convencionalidade das leis, bem como no uso de todos os métodos de interpretação/aplicação disponíveis. Nessa medida: I. Reputa-se autoritária e antirrepublicana toda ação política, midiática, administrativa ou correicional que pretender imputar ao juiz do trabalho o “dever” de interpretar a Lei n. 13.467/2017 de modo exclusivamente literal/gramatical; II. A interpretação judicial é atividade que tem por escopo o desvelamento do sentido e do alcance da lei trabalhista. É função primordial do poder judiciário trabalhista julgar as relações de trabalho e dizer o direito no caso concreto, observando o objetivo da república federativa do brasil de construir uma sociedade mais justa e igualitária. Exegese dos arts. , , , 5º, inciso XXXV, 60 e 93, IX e 114 da CRFB; III. Inconstitucionalidade do § 2º e do § 3º do art. 8º da CLT e do art. 611-a, § 1º, da CLT. Será inconstitucional qualquer norma que colime restringir a função judicial de interpretação da lei ou imunizar o conteúdo dos acordos e convenções coletivas de trabalho da apreciação da justiça do trabalho, inclusive quanto à sua constitucionalidade, convencionalidade, legalidade e conformidade com a ordem pública social. Não se admite qualquer interpretação que possa elidir a garantia da inafastabilidade da jurisdição, ademais, por ofensa ao disposto no art. 114, I, da CF/88 e por incompatibili-dade com os princípios da separação dos poderes, do acesso a justiça e da independência funcional.

Comissão 1 — Enunciado 4 das teses aglutinadas — FUNDAMENTOS, PRINCÍPIOS E HERMENÊUTICA DO DIREITO DO TRABALHO. LEI N. 13.467/2017. A Lei n. 13.467/2017, da Reforma Trabalhista, não afetou os fundamentos do direito do trabalho positivados na CLT (art. 8º), bem como os princípios da proteção (títulos II a IV), da primazia da realidade (arts. 3º e 442), da irrenunciabilidade (arts. 9º e 468), da norma mais

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favorável, da imodificabilidade contratual em prejuízo do trabalhador (art. 468), da supremacia do crédito trabalhista (arts. 100 da CF e 186 do CTN) e dos poderes inquisitórios do juiz do trabalho (art. 765), dentre outros, cuja observância é requisito para a validade da norma jurídica trabalhista.

Identificam-se na reforma trabalhista quatro grandes eixos:

  1. tentativa de modernização da legislação com remoção de alguns “entulhos” do passado, como salário mínimo regional, intervalo exclusivo para mulheres etc.;

  2. prevalência do negociado sobre o legislado, com o incentivo às negociações individuais em matérias como compensação de horas, término do contrato de trabalho e quitação de verbas trabalhistas; e, fomento aos acordos e convenções coletivas de trabalho;

  3. diminuição de custos nas contratações, mediante supressão de direitos (horas de trajeto, por exemplo), incentivo à terceirização e à precarização, com formas alternativas de contratos (aumento da carga horário do contrato a tempo parcial, ressalva de trabalho autônomo, contrato de trabalho intermitente etc.);

  4. combate à litigiosidade processual, através de medidas tendentes à diminuição do número de ações perante o Poder Judiciário Trabalhista: sucumbência, litigância de má-fé, restrição à edição de súmulas, prescrição inter-corrente etc.

Neste ensaio o foco é direcionado para o 4º eixo.

No capítulo do Direito Processual houve acintosa invasão à competência privativa do Supremo Tribunal Federal para propor regras que alterem a organização e divisão judiciárias (Constituição Federal, art. 93, 96, I, “A”, e 113) principalmente nos pontos referentes aos recursos e edição de súmulas, além afronta direta às garantias do “acesso ao judiciário”, “devido processo legal”, posicionando-se na contramão do neosincretismo processual (formalismo valorativa ou ético).

Diante de tão acesa polêmica, neste ensaio propõe-se uma sintética análise das regras de direito processual do trabalho relativas aos institutos da justiça gratuita, honorários, custas, execução, mediante análise de cada dispositivo da Lei n. 13.467 referente a tais matérias.

Ainda, introdutoriamente, merece breve comentário a questão da intertemporalidade na aplicação das normas.

A máxima tempus regit actum (os atos jurídicos se regem pela lei vigente na data em que ocorreram) é regra antiga, mas que sucumbe à “teoria do isolamento dos atos processuais”, orientadora do direito processual civil — comum, e aplicável ao direito processual do trabalho, segundo a qual: a lei processual tem aplicação imediata e não retroage; e, portanto, não pode incidir sobre os atos já praticados ou sobre seus efeitos supervenientes.

Isto está consagrado no art. 14 do CPC em vigor: “A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada”.

Porém, tal regra não é absoluta.

Ao tratar deste assunto, o prof. Dinamarco alerta para os “momentos de intersecção, entre o plano substancial e o processual do ordenamento jurídico”5 conducentes à conclusão da existência de “institutos bifrontes”, que apesar de postados no plano do direito processual têm efeitos materiais.

Um dos melhores artigos sobre o tema na internet, tem a autoria de um magistrado da 3ª Região (MG) — Juiz Fabrício Lima Silva, cuja explicação objetiva e precisa, sana qualquer dúvida sobre a possibilidade de aplicação imediata das regras da Lei n. 13.467 pertinentes à “fixação de honorários advocatícios de sucumbência (art. 791-A), dos novos requisitos para concessão dos benefícios da justiça gratuita ao trabalhador (art. 790, §§ 3º e 4º) e da responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais em caso de sucumbência do trabalhador (art. 790-B)”6 aos processos em curso.

Logo, tais disposições processuais só podem ser aplicadas às ações e defesas ajuizadas posteriormente à vigência da Lei n. 13.467.

Tal conclusão foi ratificada por ampla maioria dos magistrados trabalhistas do Paraná, na 7ª Semana Institucional da Magistratura realizada de 11 a 15 de setembro de 2017 no Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT9), em tese apresentada pelo Des. Arion Mazurkevic, cujo teor foi o seguinte:

EMENTA:

  1. Lei processual no tempo. Petição inicial. Aplicação do princípio tempus regit actum. Os novos requisitos da petição inicial previstos na Lei n. 13.467/2017, que deu nova redação ao § 1º do art. 840 da CLT, somente serão exigíveis a partir das reclamatórias trabalhistas ajuizadas a partir da vigência da referida lei.

b) Honorários de sucumbência. A regra prevista no art. 791-a da CLT, introduzida pela Lei n. 13.467/2017, que previu a incidência

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de honorários de sucumbência, somente se aplica aos processos cujas ações foram ajuizadas a partir da vigência dessa lei.

Tal tese ainda não foi anunciada formalmente para utilização externa, porém seu resultado não é segredo, dado o caráter público do debate levado a efeito, e deve pautar o entendimento da maioria dos magistrados TRT9.

Entendimentos no mesmo sentido foram consagrados na “2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho”, promovida pela ANAMATRA:

Comissão 7 — Enunciado 1 das teses aglutinadas — HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. INAPLICABILIDADE AOS PROCESSOS EM CURSO. Em razão da natureza híbrida das normas que regem honorários advocatícios (material e processual), a condenação à verba sucumbencial só poderá ser imposta nos processos iniciados após a entrada em vigor da Lei n.
13.467/2017, haja vista a garantia de não surpresa, bem como em razão do princípio da causalidade, uma vez que a expectativa de custos e riscos é...

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