Os conceitos de cultura e linguagens na historiografia: um debate interdisciplinar

AutorFabio Feltrin de Souza
CargoDoutor em História pela Universidade Federal de Santa Catarina
Páginas18-33
http://dx.doi.org/10.5007/1807-1384.2015v12n2p18
Esta obra foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição 3.0 Não
Adaptada.
OS CONCEITOS DE CULTURA E LINGUAGENS NA HISTORIOGRAFIA: UM
DEBATE INTERDISCIPLINAR
Fabio Feltrin de Souza
1
Resumo:
Este artigo tem o objetivo de problematizar as noções de cultura e linguagens no
interior da historiografia contemporânea, a partir de uma abordagem interdisciplinar.
Para isso, propõe-se dois momentos: primeiro, analisar as apropriações do conceito
de cultura operadas pela Nova História Cultural, identificando seus limites e
ponderações; segundo, propor a noção de linguagens, recolhida dos estudos
culturais e pós-estruturalistas, como um possível caminho para o debate no interior
das ciências humanas. Por fim, é reconhecida importância dos modelos
estruturalistas e economicistas na metade do século XX, mas avalia-se que a Nova
História Cultural parece possuir as ferramentas mais adequadas para analisar os
problemas emergidos no contemporâneo.
Palavras-chave: Nova História Cultural; Estudos Culturais; Cultura, Linguagens;
interdisciplinaridade.
1 INTRODUÇÃO
A ampliação do arco de objetos, problemas e abordagens trazidos pela Nova
História Cultural (NHC) possibilitaram uma sofisticação de suas análises na busca
por compreender como mulheres e homens atribuíram sentido à suas vidas e ao
mundo. Essa ampliação aconteceu concomitante à denúncia da incapacidade dos
modelos explicativos da metade do século XX de abarcar a complexidade da vida
humana, desconsiderando sua radical historicidade. Ademais, os historiadores
culturais buscaram em pensadores como Marcel Mauss e Émile Durkheim chaves
interpretativas para compreender como a realidade era de fato construída mediante
uma complexa teia de sinais e sentidos atribuídos. Nesse jogo de representações, a
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Doutor em História pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professor do curso de História da
Universidade Federal da Fronteira Sul e do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências
Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil. Coordenador da
Especialização Gênero e Diversidade na Escola e vice-líder do grupo de pesquisa "Historiografia,
Linguagens e Memória na Universidade Federal da Fronteira Sul, Erechim, RS, Brasil. E-mail:
fabio.feltrin81@gmail.com
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R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.12, n.2, p.18-33, Jul-Dez. 2015
concretude dura de um real ausente fora substituído por uma intrincada rede de
significações produzida pela linguagem. Com isso, percebemos que os sujeitos
constroem verdades sobre o real, traduzindo-o através de práticas sociais, discursos
e imagens que, entrelaçados, qualificam o mundo e condicionam todas as relações
socais (PESAVENTO, 2008, p. 13).
O gesto de representar e significar o mundo é operado pela linguagem e
suas formas de expressão codificada. Dessa maneira, a língua, a literatura, as artes,
a fotografia, as imagens, os sons, a televisão, a internet, por exemplo, são potentes
instrumentos de consolidação de significados. E na medida em que fabricam
verdades, que carregam uma intrínseca historicidade de suas formas, conteúdos,
suportes e relação de produção, merecem ser objetos de estudo.
Pretendemos neste artigo examinar duas questões que suspeitamos
estarem diretamente ligadas à prática do historiador, do educador e do cientista
social neste incipiente século XXI: num primeiro momento, problematizaremos
algumas críticas proferidas à Nova História Cultural, sobretudo a partir do
prognóstico feito por Peter Burke de que após o paraíso vivido por este ramo da
historiografia, uma onda de ataques aos seus pressupostos e suas pretensas
fragilidades ganharia corpo numa espécie de vingança. Feito isso, e sem
buscarmos hierarquias entre vários campos ou domínios da história,
apresentaremos um possível caminho no interior da História Cultural a partir de um
debate interdisciplinar centrado nos Estudos Culturais. Este caminho mira o encontro
da história com as problematizações em torno das várias linguagens que constituem
os artefatos culturais na modernidade. Importante destacar que por linguagens
compreendemos todos os dispositivos que acionam e constroem a realidade
contemporânea. Assim, arriscaremos um tear relacional entre a noção de artefato
cultural e linguagens, aproximando os vários campos do saber das ditas Ciências
Humanas.
2 A VINGANÇA DO SOCIAL?
Publicado no Brasil em 2005 e reeditado em 2008, O que é História
Cultural?, do inglês Peter Burke, propõe-se a fazer um balanço da trajetória da

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