Conceitos de imóvel rural, imóvel urbano e regras do Código Tributário Nacional

AutorJorge Miranda Ribeiro
Páginas127-150

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5. 1 Conceitos de Imóvel Rural e Imóvel Urbano na Legislação Infraconstitucional

Visando não criar confusão cronológica nos normativos que tratam do conceito de imóvel rural, faz-se registro de dois decretos-lei de 1945, que também entram na grande discussão das inúmeras conceituações impingidas ao imóvel rural. Primeiramente, o Decreto-Lei n. 7.449, de 9 de abril de 1945, logo depois, o Decreto-Lei n. 8.127, de 24 de outubro de 1945, modificador do anterior e, por fim o Decreto-Lei n. 271, de 28 de fevereiro de 1967, disciplinando o conceito de área urbana para fins de loteamento nos municípios:

Decreto-Lei n. 7.449/1945

Art. 1º Cada Município terá uma associação rural, de que poderão fazer parte as pessoas naturais ou jurídicas que exercerem, profissionalmente atividades rurais, em qualquer das suas formas, agrícolas, extrativa, pastoril, ou industrial e, também, profissionais ligados a essas atividades.

§ 1º Para os efeitos desta lei, é considerado exercício de profissão rural todo aquele que for, legalmente, proprietário de estabelecimento rural.

§ 2º Estabelecimento rural é o imóvel, situado dentro ou fora dos limites urbanos, que se destina ao cultivo da terra, à extração de matérias primas de origem vegetal, à criação ou melhoria de animais e à industrialização conexa ou acessória dos produtos derivados dessas atividades.

Decreto-Lei n. 8.127/1945

Art. 1º Cada Município terá uma Associação Rural, de que poderão fazer parte as pessoas naturais ou jurídicas que exercerem profissionalmente atividades rurais, em qualquer de suas formas, agrícola, extrativa, pastoril ou industrial, e também técnicas ligados a essas atividades.

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§ 1º Para os efeitos deste Decreto-Lei, é considerado no exercício da profissão rural todo aquele que for proprietário, arrendatário ou parceiro de estabelecimento rural.

§ 2º Estabelecimento rural é o imóvel destinado ao cultivo da terra, à extração de matérias primas de origem animal e vegetal, à criação, à recriação, à invernagem ou engorda de animais e à industrialização conexa ou acessória dos produtos derivados dessas atividades."

Decreto-Lei n. 271, de 28 de fevereiro de 1967

Art. 1º O loteamento urbano rege-se por este Decreto-Lei.

§ 3º Considera-se zona urbana, para os fins deste Decreto-Lei, a da edificação contínua das povoações, as partes adjacentes e as áreas que, a critério dos Municípios, possivelmente venham a ser ocupadas por edificações contínuas dentro dos seguintes 10 (dez) anos.

5.1. 1 Estatuto da Terra (Lei n 4.504, de 30 de novembro de 1964)

O ano de 1964, embalado, ainda, pelos acontecimentos de 31 de março, quando ocorreu o golpe de estado, foi palco de audaciosa proposta no dia 26 de outubro, quando, pela Mensagem n. 33, o Poder Executivo remeteu ao Congresso Nacional o Projeto de Lei que dispunha sobre o chamado Estatuto da terra, que possuía propósitos amplos e inovadores de combinadas políticas de reforma agrária e desenvolvimento rural, aliadas à outra política de cunho agrícola, cujo intróito, mais especificamente no item 2, apresentava o perfil do novo governo recém instalado e da ação reformadora que pretendia implantar no País: "2. No estrito cumprimento do dever que Ato Institucional lhe conferiu de restaurar a ordem social, econômica e financeira do País, lembra o meu Governo em incluir este Estatuto entre os principais projetos de lei a serem submetidos ao Congresso Nacional". Grifou-se.

Em apertada síntese, dar-se-á ênfase àquilo que o Governo Militar teria chamado de: PROBLEMA POLÍTICO E SOCIAL; FUNDAMENTOS ECONÔMICOS; SOLUÇÃO DEMOCRÁTICA; REFORMA AGRÁRIA E DESENVOLVIMENTO RURAL; ÓRGÃO EXECUTOR, mencionados na Mensagem Presidencial ao Congresso Nacional.

O Problema Político Social levava em conta os anseios de reforma e justiça social de regiões e assalariados, parceiros e arrendatários, ocupantes a justo título e posseiros que não vislumbravam quaisquer perspectivas de se tornarem donos da terra que cultivavam. A ação governamental anterior, ao invés de dar solução ao problema, só levara tensões e agravamento das contradições do sistema rural brasileiro. As tentativas do Governo anterior eram irrealistas e inviá-

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veis, entretanto bastante para autorizar golpe de estado. O então atual Governo (militar) encontrara ambientes políticos e sociais hostis no País e, segundo entendia, não poderia permitir que o problema da Reforma Agrária continuasse sendo simplesmente utilizado por políticos inescrupulosos com propostas mirabolantes e que nunca se materializavam. Era preciso transformar o quadro em nova realidade nacional para, enfim, dar terra a quem nela trabalha e expurgar, principalmente, as propriedades minifundiárias e os imensos latifúndios improdutivos dominadores da estrutura agrária nacional.

Quanto aos que chamou de fundamentos Econômicos, discorreu sobre a necessidade de uma lei de reforma agrária, não só no Brasil, mas em diversos países. Buscou no Censo Agrícola de 1960 dados reveladores a demonstrar o perfil de um país injusto; desigual, excessiva concentração de propriedades nas mãos de poucos; a precariedade das condições no meio agrário; elevada população dependente da atividade agrícola e os baixos níveis de tecnologia e mecanização; traçar nova política de interdependência entre o campo, meio urbano e o industrial para melhor desenvolvimento econômico do País; reconhecimento da experiência universal mostrando que a modificação da estrutura agrária dos países que empreenderam a reforma agrária criara condições novas para o trabalho rural e forçar a modificação dos sistemas creditícios, assistencial e de mecanização.

A Solução Democrática estava intimamente atrelada em desestimular a manutenção da propriedade privada na forma como vinha sendo praticada; incentivar o agricultor proprietário à criação da propriedade de tamanho econômico em relação ao conjunto familiar. Nova metodologia de combate ao minifúndio e latifúndio por dimensão ou exploração, seria aviada com estrutura fundiária alicerçada em módulos rurais, permitindo, também, identificar empresas rurais, modelo de propriedade a ser disseminado no meio rural.

No que tange à Reforma Agrária e ao Desenvolvimento Rural, enfocou a compatibilização de uma política agrícola paralela ou concomitante com a de reforma agrária. Para estimular a política agrícola, criou-se o Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário - INDA, as Cooperativas Integrais de Reforma Agrária - CIRA, e institui o zoneamento do País e o cadastro de imóveis rurais.

A ação reformista direcionou-se à criação de um Órgão Executor daquelas novas políticas que facilitasse o acesso a terra; idéia essa materializada na criação do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária - IBRA.

O projeto de lei aprovado e transformado na Lei n. 4.504, de 30 de novembro de 1964, pelo Poder Legislativo foi denominado de Estatuto da terra, entrando em vigor na data de sua publicação, enquanto o País ainda vivia sob a égide da Constituição federal de 1946, já emendada na parte que disciplinava as rendas municipais.

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Na abalizada opinião do agrarista Augusto Ribeiro Garcia, em homenagem às quatro décadas do Estatuto, no artigo denominado "Quarenta anos de Estatuto da terra",62reconheceu na concepção da norma a base fundada nos princípios da função social da propriedade. Abre a matéria jornalística afirmando: "é a mais importante lei agrária brasileira e uma das mais completas do ordenamento jurídico do País. Combatido por uns, elogiado por outros, a verdade é que o Estatuto da terra é uma lei que, ao longo de seus quarenta anos de vigência, tem demonstrado o interesse de estudiosos de todo o mundo. Haja vista que países europeus como Espanha, Itália e frança estão entre os que mais o pesquisam. Na América Latina, a maioria deles tem grande interesse pelo estudo de nossa legislação agrária.

Não descuidou o articulista de considerar atual e de primeiro mundo o Estatuto, bem como teceu considerações sobre a proposta do ex-deputado francisco (Xico) Graziano de um Novo Estatuto da terra, objeto de polêmicas nos círculos rurais e nos mais diversos segmentos sociais, considerando-o de aprovação difícil, em razão de ter sido gestado sem a participação de outros interessados, mas na opinião pessoal do autor. Reconheceu como ousada a revogação pura e simples de importantes normativos como a Lei Agrícola (n. 8.171/1991) e a Lei fundiária (n. 8.629/1993), regulamentadora do art. 184 e seguintes da Constituição federal de 1988.

O novel marco legislativo materializado na Lei n. 4.504/1964 definiu no inciso I do art. 4º, o que vinha a ser "Imóvel Rural", para os efeitos daquela lei. O emprego da terminologia "definir" é abominado pela maioria dos doutrinadores que, em regra, têm preferência pelo termo "conceituar". A questão não é meramente semântica ou eivada de preferência, mas de precisão. Conceito exprime a ideia, o julgamento que se faz de alguma coisa, objeto ou pessoa; tem como característica a possibilidade de ser mudado em função de novos conhecimentos, acontecimentos, do avanço tecnológico, da qualidade etc. Definição tem caráter mais finalístico, ou seja, não se muda ao talante do legislador.

Buscou-se em De Plácido e Silva,63a melhor forma de entender a palavra conceito: "é derivada de conceptus, de concipiere (conceber, ter ideia, considerar), servindo na terminologia jurídica para indicar o sentido, a significação, a inter-pretação que se tem a respeito...

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