Condutas Vedadas aos Agentes Públicos em Campanha

AutorElmana Viana Lucena Esmeraldo
Ocupação do AutorAnalista Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral do Pará
Páginas447-476

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A Lei nº 9.504/97, elenca condutas vedadas aos agentes públicos na campanha eleitoral, cuja proibição visa preservar a igualdade de oportunidades entre os candidatos e a probidade administrativa, de forma a impedir abusos que possam viciar a eleição. A preocupação do legislador ao estabelecer essas vedações foi a de evitar o abuso de autoridade, do poder político, mormente diante da possibilidade de reeleição do Presidente da República, dos Governadores de Estado, do Distrito Federal e dos Prefeitos, sem necessidade de desincompatibilização, permitindo o desenvolvimento da campanha eleitoral com a permanência nos seus cargos.

A disciplina legal contida nos arts. 73 a 77 da Lei nº 9.504/97 visa, portanto, impedir o uso do aparelho estatal de qualquer esfera de poder (federal, estadual, distrital ou municipal) em favor de candidatura, com o fito de manter a isonomia entre os partidos políticos, coligações e candidatos envolvidos na disputa eleitoral, bem como evitar apadrinhamentos ou perseguições políticas.

Importante destacar que, embora o período eleitoral se inicie com a abertura dos prazos para os partidos realizarem suas convenções, e o título desse capítulo se refira a condutas praticadas durante as campanhas eleitorais, as vedações não se impõem apenas nesse período, mas também fora dele, como é o caso dos § § 10 e 11 do art. 73 da Lei nº 9.504/97, que já determinam proibições desde o primeiro dia do ano da eleição, e do inciso VIII do art. 73, caput, do mesmo dispositivo legal, cuja conduta está proibida nos 180 dias antes do pleito. Em outros casos, a lei não definiu o período em que as condutas ficam vedadas, limitando-se a proibi-las.

Por outro lado, parte das condutas estão vedadas apenas nos 3 meses antes do pleito. Nesses casos, práticas abusivas anteriores ao período vedado embora não sujeitem os infratores e beneficiários às penalidades previstas na

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norma proibitiva, podem configurar abuso de poder, nos termos dos arts. 19 e 22 da LC nº 64/90, a ser veiculado em AIJE, mas não a conduta vedada objeto da Representação em estudo.

A recente Lei nº 12.034 de 29 de setembro de 2009 trouxe importantes modificações aos artigos 73 a 77 da Lei nº 9.504/97, abordadas neste capítulo.

20. 1 Fundamento legal

As condutas vedadas estão previstas nos arts. 73 a 77 da Lei nº
9.504/97. A Resolução do TSE nº 23.370, de 13 de dezembro de 2011, regulamentou a propaganda eleitoral e as condutas vedadas aos agentes públicos em campanha para as eleições municipais de 2012.

20. 2 Conceitos de condutas vedadas e de agentes públicos

Segundo Zílio:

As condutas vedadas – na esteira de entendimento sedimentado pela doutrina e jurisprudência – constituem-se como espécie do gênero abuso de poder e surgiram como um antídoto à reeleição, a qual foi instituída através da Emenda Constitucional nº 16/97. Em verdade, pode-se conceituar os atos de conduta vedada como espécies de abuso de poder político que se manifestam através do desvirtuamento dos recursos materiais (incisos I, II, IV e § 10º do art. 73 da Lei nº 9.504/97), humanos (incisos III e V do art. 73 da Lei nº 9.504/97), financeiros (inciso VI, “a”, VII e VIII do art. 73 da Lei nº 9.504/97) e de comunicação (inciso VI, “b” e “c” do art. 73 da Lei nº 9.504/97) da Administração Pública (‘latu sensu’).29Nos termos do § 1º do art. 73 da Lei nº 9.504/1997, reputa-se agente público aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta, ou fundacional. O conceito contempla, portanto, toda pessoa física que, de qualquer modo, com ou sem vínculo empregatício, de forma definitiva ou transitória, exerça função pública ou de interesse público, na administração direta, indireta ou fundacional, dos entes da federação.

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A definição dada pela lei é a mais ampla possível, compreendendo desde os agentes políticos (Presidente da República, Governadores, Prefeitos e respectivos Vices, Ministros de Estado, Secretários, Senadores, Deputados Federais e Estaduais, Vereadores, etc.), os servidores titulares de cargos públicos ou empregados, sujeitos ao regime estatutário ou celetista em órgão ou entidade pública (autarquias e fundações), empresa pública ou sociedade de economia mista, as pessoas requisitadas para prestação de atividade pública (por exemplo, membro da mesa receptora ou apuradora de votos), gestores de negócios públicos, bem como aqueles que se vinculam contratualmente com o Poder Público, como é o caso de prestadores de serviços terceirizados, concessionários ou permissionários de serviços públicos, e os delegados de função ou ofício públicos (exemplo: titulares de serventias da justiça não oficializada).

20. 3 Análise das condutas vedadas

Inicialmente, cabe esclarecer que a enumeração das condutas vedadas pela Lei das Eleições é numerus clausus, porquanto não comporta acréscimos, uma vez que se trata de medidas restritivas, tampouco admite interpretação extensiva ou ampliativa.

  1. Inciso I do art. 73 da Lei nº 9.504/97 - Cessão e utilização de bens públicos

    Conduta: Ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária.

    Observação: São duas as condutas sujeitas à punição: a cessão ou o uso do bem. É indiferente se a cessão ou uso se dá a título gratuito ou oneroso.

    Período: Não foi estabelecido, pela legislação, um período certo para a configuração dessa conduta. A imposição de um lapso material de incidência dessa norma, como por exemplo, a partir da convenção partidária, ou a partir do início do ano eleitoral, como pretendem alguns doutrinadores, pode frustrar a aplicação da norma. Nesse caso, o mais justo é que seja analisada a conduta no caso concreto, verificando, além do momento em que foi praticada, sua lesivi-dade à igualdade entre os candidatos, para conclusão do que pode ou não ser considerada uma conduta vedada.

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    Penalidades: Suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso; multa aos agentes responsáveis, aos partidos políticos, às coligações e aos candidatos beneficiados, bem como a cassação do registro do candidato ou do diploma do eleito (ou suplente) que tenha sido beneficiado, agente público ou não.

    Observações: É necessário, para a configuração dessa conduta vedada, que o uso ou cessão do bem seja em benefício de candidato, partido ou coligação. Referida vedação atinge tanto os bens móveis e imóveis de propriedade da Administração Pública, bem como aqueles dos quais seja possuidora, detentora ou locatária, ou que estejam comprometidos com a realização de serviços de caráter público (exemplo: transporte urbano intermunicipal ou interestadual).

    Quanto à veiculação de propaganda eleitoral em veículos que se encontram à disposição de órgão público, manifestou-se, recentemente, o c. TSE:

    (...) 1. A utilização de veículos que se encontram a serviço da prefeitura do município para ostentar propaganda eleitoral de candidato configura a conduta vedada pelo art. 73, inciso I, da Lei nº 9.504/97.
    2. A gravidade da conduta vedada determina a aplicação da sanção.
    (...) (TSE – Recurso Especial Eleitoral nº 35.702/SP, rel. Min. Marcelo Ribeiro, JE,
    10.5.2010).

    Observe, ainda, que a restrição veiculada no art. 73, I, da lei eleitoral atinge apenas os bens empregados na realização do serviço público; não abrange o uso e a cessão de bens de uso comum do povo. É, portanto, permitida a utilização de praças públicas para a realização de comícios. Entretanto, mesmo nesses casos, se o bem, embora seja de fruição coletiva, é cedido exclusivamente a determinado candidato, partido ou coligação em detrimento dos demais participantes, ferindo o princípio da igualdade, poderá ficar caracterizada a conduta vedada, em análise.

    Exceções: Essa vedação não se aplica ao uso, em campanha, de transporte oficial pelo Presidente da República, obedecido o disposto no art. 76 da Lei nº 9.504/97, nem ao uso, em campanha, pelos candidatos a reeleição de Presidente e Vice-Presidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, Prefeito e Vice-Prefeito, de suas residências oficiais para realização de contatos, encontros e reuniões pertinentes à própria campanha, desde que não tenham caráter de ato público.

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    Em atenção ao princípio da isonomia, alguns Tribunais têm dado interpretação mais ampla à exceção, a fim de permitir que os presidentes das casas legislativas (Câmara dos Deputados, Senado, Assembleia Legislativa e Câmara dos Vereadores) façam uso de transporte oficial e de suas respectivas residências oficiais, caso tenham.

    Importante a consideração feita por José Jairo Gomes:

    Como consequência, também é permitido o emprego de servidores públicos que, no exercício de suas funções, cuidem da segurança, preparação de viagem ou conservação das residências oficiais das autoridades aludidas; entretanto, é-lhes vedada a participação em atos típicos de campanha, devendo limitar-se ao cumprimento dos deveres de seus cargos.

    No uso do transporte oficial, entretanto, não é possível cumular atos de campanha (exemplo: comício), com ato público (exemplo: reunião com Governa-dores para resolver uma questão do governo), a serem resolvidas no mesmo local e dia.

    Ressarcimento das despesas pela utilização de transporte oficial pelo Presidente da República (em veículos oficiais ou contratados), bem como de sua comitiva de campanha: Embora seja permitida a utilização...

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