Condutas vedadas aos agentes públicos durante a campanha eleitoral

AutorJoão Fernando Lopes de Carvalho
Ocupação do AutorBacharel pela faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
Páginas197-226
CONDUTAS VEDADAS AOS AGENTES
PÚBLICOS DURANTE A CAMPANHA ELEITORAL
João Fernando Lopes de Car valho
Bacharel pela faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, mestre na área de
concentração de Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
sócio da Alberto Rollo Advogados Associados, professor universitário e autor de diversos
artigos e obras jurídicas publicados.
Sumário: 1. Contornos – 2. Tipos infracionais; 2.1. Ceder ou usar bens móveis ou imóveis
pertencentes à administração em favor de campanha eleitoral.; 2.2. Usar materiais ou serviços,
custeados pelos Governos ou Casas Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas
nos regimentos.; 2.3 Usar servidor público em prol de campanha eleitoral durante o seu
horário de expediente.; 2.4. Fazer ou permitir uso promocional de distribuição gratuita e
serviços de caráter social; 2.5. Praticar atos de administração de pessoal durante o período de
vedação; 2.6. Realizar transferência voluntária de recursos entre as entidades da Federação
nos três meses anteriores ao pleito; 2.7. Fazer publicidade institucional de atos, programas,
obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos nos três meses anteriores às eleições; 2.8.
Fazer pronunciamento em rede de rádio e televisão nos três meses anteriores à eleição sem
autorização da Justiça Eleitoral; 2.9. Realizar despesas com publicidade institucional acima
da média em ano eleitoral; 2.10. Fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remunera-
ção dos servidores públicos em percentual superior à reposição inacionária; 2.11. Realizar
distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios no ano da eleição; 2.12. Execução de
programa social por entidade nominalmente vinculada a candidato ou por este mantida; 2.13.
Infringir o disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal; 2.14. Realizar shows artísticos
em inauguração de obra pública nos três meses anteriores ao pleito; 2.15. Comparecimento
de candidato a inauguração de obras públicas nos três meses anteriores ao pleito – 3. Rito
processual – 4. Sanções aplicáveis
1. CONTORNOS
A organização dos sistemas eleitorais brasileiros parte das regras inicialmente ins-
critas na Constituição Federal. Dentre tais normas, destaca-se o teor do art. 14, § 9º, do
Texto, assim redigido:
“Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a m de
proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa
do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a inuência do poder econômico ou
o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.” (destacamos)
A partir dessas determinações iniciais, a legislação eleitoral def‌ine várias condutas
tidos como ilícitas, por comprometerem, ao menos potencialmente, a normalidade e
legitimidade do processo de captação da vontade eleitoral, por comprometerem a igual-
dade entre os candidatos em disputa. Assim, a lei pune diversas irregularidades não
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penais, como os abusos de poder econômico e político, a captação ilícita de sufrágio e as
irregularidades pertinentes à arrecadação e gastos de recursos utilizados na campanha
eleitoral. Em cada uma dessas previsões o legislador está a dar efetividade às previsões
constitucionais acima anotadas, atuando para preservar a higidez das eleições e afastar
as inf‌luências indevidas que poderiam descaracterizar sua legitimidade.
As condutas vedadas aos agentes públicos durante a campanha eleitoral inserem-se
nesse rol de ilicitudes não penais estabelecidas em lei com o objetivo de proteger a regu-
laridade das eleições, dando cumprimento e efetividade concreta às normas inicialmente
inscritas na Constituição Federal. Cuida-se de condutas desenvolvidas por integrantes da
administração pública que a lei aponta como causadoras de desequilíbrio das condições
da disputa eleitoral, tratadas na Lei nº 9.504/97, nos seus artigos 73 a 78, sujeitas às san-
ções previstas nos mesmos dispositivos. Convém destacar que as condutas em comento
conf‌iguram ilícitos eleitorais, mas não têm caráter de infração criminal, sendo persegui-
das por meio de representações (ações) eleitorais de competência da Justiça Eleitoral.
As condutas vedadas estão dirigidas contra a atuação irregular de administradores
públicos durante a época da disputa eleitoral, apresentando rol de atuações típicas que,
na expressão legislada, conf‌iguram ações “tendentes a afetar a igualdade de oportunidade
entre candidatos nos pleitos eleitorais1. Assim, trata-se de atos aos quais a lei atribui ca-
pacidade de inf‌luência indevida na disputa eleitoral, estabelecendo-se presunção legal
de que a simples prática dos tipos é suf‌iciente para acarretar prejuízo à igualdade entre
os candidatos.
Os tipos infracionais em questão compreendem restrições dirigidas à atuação dos
agentes públicos em geral durante o período imediatamente anterior às eleições, im-
postas na lei, e sujeitas a severas penalidades. Esta é, também, uma característica que
distingue as condutas vedadas de outras ilicitudes eleitorais: as irregularidades podem ser
praticadas sem a participação do candidato, que pode ser punido apenas na condição de
benef‌iciário. Nessa esteira, para a conf‌iguração de atuação típica dessa natureza é preciso
identif‌icar a ação administrativa irregular correspondente aos atos ilícitos relacionados
na lei, bem como o agente administrativo por ela responsável. Por outro lado, não é
necessário comprovar a inf‌luência dos fatos na disputa eleitoral para a conf‌iguração do
ilícito, pois esta, como visto, parte de presunção expressamente inscrita no texto legal.
Os responsáveis f‌icam sujeitos a pena de multa de cinco a cem mil Uf‌ir, f‌icando os
candidatos benef‌iciados sujeitos à cassação do registro ou do diploma eleitoral. Além
disso, todos poderão sofrer inelegibilidade por 8 anos a contar da eleição em que se ve-
rif‌icou o ilícito, nos termos do art. 1º, I, “j”, da Lei Complementar nº 64/90.
É bem de ver que as condutas vedadas podem restar conf‌iguradas a partir da simples
acomodação da atuação de agente público aos tipos infracionais estabelecidos nos artigos
73 a 78 da Lei das Eleições, sem que seja necessário perquirir a respeito da intenção do
agente infrator para a caracterização do ilícito. Por isso mesmo, ainda que sobrevenha
condenação imposta pela Justiça Eleitoral em razão da prática de qualquer das condu-
tas vedadas em estudo, não é admissível dela extrair a conf‌iguração de ilícitos outros,
1. Tal é a expressão utilizada no caput do artigo 73 da Lei nº 9.504/97.
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