Confissão de dívidas. Mútuo feneratício. Agiotagem. Usura. Nulidade do título. Ação anulatória. Confissão de dívida feita por meio de instrumento público de escritura de mútuo com garantia hipotecária. Vinculação com execução e respectivos embargos. Recurso especial. Contrarrazões

AutorHélio Apoliano Cardoso
Páginas186-200

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EXMO. SR. PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO......

... por intermédio de seu advogado, ao final assinado, insatisfeito com a decisão que julgou improcedente a Apelação, já objeto de Embargos Declaratórios, vem, nesta oportunidade, guardado o prazo legal e satisfeitas todas as obrigações processuais, apresentar CONTRARRAZÕES AO RECURSO ESPECIAL, na forma das razões a seguir:

Cumpre esclarecer que o presente Recurso Especial, REsp 1.046.418/ RJ, referente à execução de título executivo extrajudicial, está vinculado ao REsp 1.046.443/RJ, interposto em sede de ação de anulação de escritura de confissão de dívida, a qual baseia a referida execução, e ao REsp 1.046.453/ RJ, correspondente aos respectivos Embargos do Devedor. Os três processos devem ser reunidos e julgados conjuntamente desde a Primeira Instância, devendo assim ser procedido no STJ, tendo em vista a relação de prejudicialidade entre eles e os princípios da celeridade e da economia processual, evitando-se, ademais, julgamentos conflitantes.

OFENSAS AOS ARTIGOS 458, II E 535, I E II, 20, § 3º, 128, 267, VI, 459 E 492 DO CPC. INEXISTÊNCIA

De início, não estão configuradas as alegadas ofensas aos arts. 489, II, e 1.022, I e II, do Código de Processo Civil.

É que, o colendo Tribunal estadual, embora não tenha examinado individualmente cada um dos argumentos suscitados pela parte, adotou fundamentação suficiente, decidindo integralmente a controvérsia.

É indevido, assim, conjecturar-se a existência de omissão ou contradição no julgado apenas porque decidido em desconformidade com os interesses da parte.

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No tocante aos arts. 82, § 2º, 141, 485, VI, 490 e 492 do Código de Processo Civil, ressalte-se que os Recorrentes limitaram-se a alegar sua violação de maneira genérica.

Contudo, na interposição de Recurso Especial, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, não basta a simples menção da norma federal tida por violada ou da divergência jurisprudencial, sendo necessária a demonstração clara e precisa da ofensa em que teria incorrido o v. aresto hostilizado, sob pena de incidência da Súmula 284 do eg. STF.

IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL OBJETO DE CONSTRIÇÃO

JUDICIAL. BEM DE FAMÍLIA. PRECLUSÃO

Relativamente à suscitada impenhorabilidade do imóvel objeto de constrição judicial nos autos da execução, sob a alegação de se tratar de bem de família, cumpre salientar que essa matéria apenas foi trazida pelos devedores, ora recorrentes, nos Embargos Declaratórios opostos contra o Acórdão em apelação, não tendo sido levantada nos Embargos do devedor ou em outro momento oportuno.

Daí a indiscutível preclusão, agravado pelo fato de o tema não foi objeto de debate e decisão na colenda Corte estadual.

Além disso, na petição de Recurso Especial, não há impugnação pelos Recorrentes desse fundamento do v. Acórdão hostilizado de que se operou a dita preclusão.

Portanto, diante da ausência de prequestionamento e da incidência da Súmula 283/STF, a questão da impenhorabilidade do bem de família não merece ser conhecida no presente especial.

MÉRITO

Informam as Instâncias ordinárias que ... e OUTROS contrataram mútuo com ... e OUTRO, no montante de R$ ..., mas assinaram um instrumento de confissão de dívida, com garantia hipotecária, no valor de R$ ..., com acréscimo de juros remuneratórios de 1% ao mês, o que totalizou R$ ....

Segundo consta dos autos, o valor de R$ ... foi repassado aos mutuários mediante três cheques emitidos por Ltda.

Em sede de ação anulatória de escritura de confissão de dívida, ajuizada em 11 de junho de 1997, e de Embargos à Execução, apresentados em 26 de

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novembro de 1997, ... e OUTROS alegaram a nulidade da escritura de confissão de dívida, por violação ao Decreto 22.626/33 e à Medida Provisória 2.172-32/2001, bem como pela prática indevida de anatocismo, usura e agiotagem. Suscitaram, outrossim, que o ato jurídico impugnado derivou de simulação e coação. Requereram, ao final, a nulidade do título e a consequente extinção da execução movida, em 26 de junho de 1997, por ... e OUTRO.

O d. Juízo a quo, na r. sentença, concluiu pela nulidade do negócio jurídico e do título, extinguindo a execução.

Na ocasião, reconheceu a existência de simulação, mas não de coação, entendendo que os Exequentes aproveitaram-se: da necessidade financeira dos Embargantes para vincular o fornecimento do dinheiro à celebração de uma escritura onde fossem consignadas informações falsas capazes de ocultar a utilização de taxas de juros acima do permissivo legal contido no Dec. 22.626/33 e a prática do anatocismo (...). O negócio dissimulado subjacente era nulo, porque consistia em um mútuo remunerado de forma absolutamente contrária ao direito. O negócio simulado materializado na Escritura de Confissão de dívida procurou adequar ao ordenamento jurídico vigente um mútuo que somente poderia ser celebrado com uma instituição autorizada pelo Banco Central do Brasil (...). A situação financeira dos Embargantes os obrigou à aceitação do negócio simulado e, apesar de terem recebido somente setenta mil reais de empréstimo declararam o recebimento de quantia bem superior para encobrir a capitalização de juros e a taxa ilegalmente praticada. A ... nunca foi autorizada pelo Banco Central do Brasil a realizar operações financeiras e apesar dos recursos terem tido origem naquela sociedade empresarial, conforme declarado pela testemunha .......a e comprovado nos extratos de fls., o mútuo foi celebrado com as pessoas físicas, embargadas, o que reafirma a simulação realizada. A sequência de atos simulados foi confirmada pelas cópias das declarações de bens e direitos dos Embargados. Tais documentos fiscais registram o mútuo que teria sido realizado com recursos oriundos da pessoa jurídica ........ Os patrimônios das pessoas físicas e jurídicas acabam se confundindo numa sequência de negócios jurídicos registrados de forma precária.

O colendo Tribunal de Justiça, em sede de Apelação, reformou a r. sentença, julgando parcialmente procedentes a Ação Anulatória e os Embargos à Execução, para declarar a nulidade da confissão de dívida apenas quanto ao montante excedente a R$ ... e à cobrança dos juros remuneratórios acima de 12%, ao ano, determinando o prosseguimento da execução relativamente à quantia reconhecida como devida e autorizando a subsistência da penhora.

No voto condutor do v. Acórdão hostilizado ficou consignado que:

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(I) foi comprovada a simulação, porquanto "parte-se do pressuposto de que o mútuo foi de R$... (...), posto não provado ter sido dos R$... (...) insertos no título. Verifica-se dos termos da aludida confissão de dívida datar o empréstimo de 23.12.96, assumindo os mutuários, a obrigação de quitá-lo em seis meses, ou seja, em 23.6.97, com juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, totalizando isso a quantia de R$... (...). O ágio é de 48,7% (quarenta e oito inteiros e sete décimos por cento). Como não se alude a correção monetária, mas a juros remuneratórios de 1% (um por cento) ao mês, na verdade se quis dissimular juros mensais de 8,11% (oito inteiros e onze centésimos por certo)", o que é vedado pelo art. 1º do Decreto 22.626/33;

(II) não houve demonstração da coação, cuja prova incumbia aos devedores;

(III) a nulidade somente inquina o ato jurídico na parte que excedeu ao montante realmente contratado de R$ ..., devendo ser mantido o título quanto a esse valor, prosseguindo-se a execução e mantendo-se hígida a penhora nesses termos. Daí a interposição do REsp 1.046.443/RJ (na ação de anulação de escritura), do REsp 1.046.418/RJ (na execução) e do REsp 1.046.453/RJ (nos Embargos do Devedor).

CONTROVÉRSIA DOS AUTOS

A controvérsia cinge-se, pois, a saber se o reconhecimento pelas Instâncias ordinárias da existência de mútuo feneratício decorrente de agiotagem e prática de usura gera nulidade total ou parcial do título exequendo, Confissão de Dívida feita por meio de Instrumento Público de Escritura de Mútuo com Garantia Hipotecária.

A referida escritura de confissão de dívida com garantia hipotecária foi lavrada em 23 de dezembro de 1996, durante a vigência do Decreto 22.626/33, que dispõe sobre os juros nos contratos, prevendo:

Art. 1º. É vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal.

Art. 11. O contrato celebrado com infração desta lei é nulo de pleno direito, ficando assegurado ao devedor a repetição do que houver pago a mais.

Por sua vez, a Medida Provisória 2.172-32/2001 também veda a prática de usura, nos seguintes termos:

Art. 1º São nulas de pleno direito as estipulações usurárias, assim consideradas as que estabeleçam:

I - nos contratos civis de mútuo, taxas de juros superiores às legalmente...

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