Conflitos federativos na formulação de políticas públicas voltadas ao enfrentamento da pandemia do coronavírus

AutorLarissa Santiago Gebrim e Raphael Barboza Correia
Ocupação do AutorGraduada em Direito pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas ? FGV Direito SP (2015)/Graduado em Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em 2016
Páginas203-229
203
Conflitos federativos na formulação de políticas públicas voltadas
ao enfrentamento da pandemia do coronavírus
Conflitos federativos na formulação de
políticas públicas voltadas ao enfrentamento
da pandemia do coronavírus
Larissa Santiago Gebrim345
Raphael Barboza Correia346
Resumo
A pandemia da Covid-19 impõe aos gestores públicos as rápi-
das formulação e aplicação de políticas públicas de enfrentamento,
mesmo que ainda não detenham informações completas sobre o
problema. O modelo federativo nacional e suas fragilidades confor-
mam a definição e a aplicação das políticas públicas elaboradas e
implementadas no contexto da pandemia, podendo a eles ser atri-
buídos (pelo menos em parte) seus êxitos ou alguns dos desafios.
A questão que se coloca neste artigo, portanto, é de que forma
instrumentos de cooperação e coordenação por entidades da fe-
deração, em última análise, são aptos a endereçar os obstáculos e
as dificuldades presentes em um modelo federativo cooperativo,
conforme instituído na Constituição Federal de 1988. Utilizando-se
como referência a pandemia da Covid-19, investigam-se as po-
tenciais vantagens, desvantagens e limitações de cada um desses
instrumentos.
Palavras-chave: Conflitos federativos. Políticas públicas. Pande-
mia. Cooperação.
1. Introdução: direito público, federalismo e
pandemia
O surgimento do coronavírus Sars Cov-2 (Covid-19) impôs um
desafio aos gestores dos mais diferentes países do globo, envolvendo
345 Graduada em Direito pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas — FGV
Direito SP (2015); mestranda em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo (em curso). Advogada no setor de infraestrutura do Escritório Machado, Meyer,
Sendacz e Opice Advogados.
346 Graduado em Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em 2016; mestrando em
Direito Regulatório pela Fundação Getulio Vargas — Rio de Janeiro (FGV-RJ). Advogado no
setor de infraestrutura do Escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados.
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Transformações do Direito Administrativo:
Direito Público e regulação em tempos de pandemia
a tomada de decisão e praticamente concomitante implantação (e
avaliação) de políticas públicas de combate à pandemia. Apenas no
Brasil, dados divulgados pelo Conselho Nacional de Secretários de
Saúde apontam que, de março a 26 de outubro de 2020, o total de
casos confirmados da doença totalizava 5.409.854, sendo o número
de óbitos aferido em 157.397.347 Acrescenta complexidade ao tema
o fato de o próprio objeto da política pública encontrar-se sob es-
tudo por parte da comunidade científica, voltada ao mapeamento
do vírus, à definição de técnicas de tratamento e redução do con-
tágio e, evidentemente, à imunização. Se o processo de formulação
de políticas públicas já é, por natureza, complexo, a agilidade re-
querida na adoção das medidas de combate à Covid-19 certamente
trouxe um componente adicional para essa equação.348 Em outras
palavras, o enfrentamento à pandemia da Covid-19 tem exigido a
adoção de diferentes ações e medidas pelos gestores públicos de
todas as esferas federativas.
Nesse contexto, observa-se uma clara situação de tensão no
modelo federativo brasileiro, conforme instituído com a edição da
Constituição Federal de 1988. Soluções federativas compõem o com-
plexo feixe de elementos que fazem parte do processo de formulação
de políticas públicas de enfrentamento à Covid-19. Evidente, portan-
to, que os modelos federativos — e suas fragilidades — conformam
a definição das políticas públicas elaboradas e implementadas no
contexto da pandemia, podendo a eles ser atribuído (pelo menos
em parte) o êxito ou as dificuldades em sua aplicação.349 A batalha
347 CONASS. Painel Conass COVID-19. Disponível em: https://www.conass.org.br/painelconass-
covid19/. Acesso em: 26 out. 2020.
348 De modo didático, Leonardo Secchi sistematiza as principais etapas que compõem o ciclo
de uma política pública, ferramenta que ilustra as fases sequenciais e interdependentes que
compõem o processo de elaboração de políticas públicas. O autor, assim, propõe um mo-
delo pautado em sete fases principais. São elas: a identificação do problema, a formação de
agenda, a formulação de alternativas, a tomada de decisão, a implementação, a avaliação e
a extinção. Em que pese seu valor ilustrativo, pondera o mencionado autor que “o ciclo de
política públicas raramente reflete a real dinâmica ou vida de uma política pública. As fases
geralmente se apresentam misturadas, as sequências se alternam”. (SECCHI. Leonardo. Polí-
ticas públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos. São Paulo: Cengage Learning,
2012, p. 33.)
349 ABRUCIO, Fernando Luiz et al. “Combate à COVID-19 sob o federalismo bolsonarista: um
caso de descoordenação intergovernamental”,Rev. Adm. Pública,Rio de Janeiro, v. 54,n.
4,p. 663-677, agosto de 2020. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0034-76122020000400663&lng=en&nrm=iso. Accesso em: 25 out. 2020.

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