Conflitos socioambientais e a ameaça ao processo de demarcação de terras quilombolas no brasil

AutorIris Pontes Soares
CargoAssistente Social
Páginas687-709
Artigo recebido em: 10/07/2018 Aprovado em: 10/10/2018
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v22n2 p687-709
CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS E A AMEAÇA
AO PROCESSO DE DEMARCAÇÃO DE
TERRAS QUILOMBOLAS NO BRASIL
Iris Pontes Soares1
Resumo
O objetivo do presente artigo é refl etir acerca dos confl itos socioambientais e
sua relação com os processos de demarcação de terras quilombolas no Brasil.
Pretende, ademais, apontar que o avanço do agronegócio e da mecanização do
campo vêm aumentando os confl itos que envolvem os processos de demarca-
ção restringindo o acesso à terra pelas comunidades quilombolas e, em muitos
casos, impossibilitando a manutenção de suas formas de vida e produção. Para
tanto, o artigo em questão, fruto dos processos de preparação de dissertação em
serviço social, realiza pesquisa bibliográfi ca e documental.
Palavras-chave: Confl itos socioambientais, populações quilombolas, demar-
cação de terras.
SOCIO-ENVIRONMENTAL CONFLICTS AND THE
THREAT TO THE DEMARCATION PROCESS OF
QUILOMBOLA LANDS IN BRAZIL
Abstract
The purpose of this article is to initiate the debate about the socio-environmen-
tal confl icts and their relations with the processes of demarcation of quilombola
lands in Brazil. It is the intended to point that the advancement of agribusiness
and the mechanization of the fi eld have increased the confl icts that surround the
1 Assistente Social, Mestranda em Serviço Social pela Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE). E-mail:
irispontessoares@yahoo.com.br
/ Endereço: Universidade Federal de
Pernambuco - UFPE: Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE.
CEP: 50670-901.
Iris Pontes Soares
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demarcation processes, restricting access to land by the quilombola communi-
ties and in many cases making it impossible to maintain their forms of life and
production. For the realization of the article in question, result of the processes
of preparation of dissertation in social service, bibliographical and documenta-
ry research was carried out.
Key words: Socio-environmental confl icts, quilombola populations, demarca-
tion of lands.
1 INTRODUÇÃO
Historicamente a população do campo teve
seus direitos
de acesso à terra e às políticas públicas negligenciados. O Brasil
tem como herança uma estrutura
fundiária escravocrata, repleta
de latifúndios, que manifesta a concentração de poder econômico
e
político em torno dos grandes proprietários de terras, a bur-
guesia rural. Já à população do campo foi destinada uma série
de condições precárias de vida
no que se refere, principalmente,
a esse acesso desigual. À negritude, foi direcionada a face mais
perversa desse processo, já que a ela foi negada, salvo raras exce-
ções desde sua chegada ao Brasil, o uso da terra e principalmente
a garantia de sua propriedade.
Com a abolição da escravatura em 1888 e a inserção do tra-
balho livre assalariado no Brasil, a população negra nascida livre ou
recém-liberta foi inserida nessa nova forma de organização do tra-
balho a partir das diferenças entre as regiões brasileiras. Aos que se
localizavam em territórios onde ainda existiam terras sem cultivo, os
recém-libertos se dedicaram à agricultura de subsistência, inserindo-
-se de maneira restrita na atividade assalariada. No entanto, essa foi
uma experiência rara. Na maior parte dos casos, os antigos escravos
foram incorporados ao trabalho livre. No Nordeste as mudanças fo-
ram principalmente de natureza geográfi ca, na qual os recém-liber-
tos foram inseridos como força de trabalho em engenhos distintos
dos anteriores. Inexistiam terras livres para o cultivo e as atividades
nos centros urbanos eram restritas. (GORENDER, 2016a).
No Sudeste, em especial em São Paulo, apesar de existirem
negros ou ex-escravos nos empregos industriais, estes foram ma-
joritariamente incorporados nas atividades mal remuneradas, em
especial do serviço doméstico, ao mesmo tempo em que passaram
a conviver com o desemprego, trabalho informal e precário. (MAR-
TINS, 2016). Nessa região, houve um grande incentivo à vinda de
imigrantes. Essa escolha tinha como um de seus fundamentos o re-

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