Contas digitais como meios de distribuição de recursos emergenciais

AutorMaria Eduarda Vianna
Ocupação do AutorMestranda em Direito da Regulação na Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ)
Páginas231-246
231Contas digitais como meios de distribuição de recursos emergenciais
Contas digitais como meios de
distribuição de recursos emergenciais
Maria Eduarda Vianna407
Resumo
Este trabalho pretende demonstrar que a escolha governamen-
tal de utilização de contas digitais como meio de distribuição de
recursos emergenciais em um contexto de pandemia de Sars-CoV-2
(coronavírus) decorre de uma tendência de consumo por produ-
tos e serviços financeiros digitais que foi possibilitada por uma
agenda regulatória voltada à inovação, à competitividade e
à inclusão financeira. Notou-se, a partir de dados coletados junto à
Febraban, que (i) não apenas houve o reforço dessa tendência de
digitalização em virtude da necessidade de prática de isolamento
social, aumentando o consumo de produtos e a utilização de meios
digitais, e a consequente e expressiva redução de utilização de ca-
nais físicos; como também (ii) houve uma bancarização massiva
da população por meio da criação de contas de poupança digitais
junto à Caixa Econômica Federal, permitindo que os recursos che-
gassem a seus destinatários finais, em virtude da capilaridade e da
conveniência das contas digitais.
Palavras-chave: Regulação financeira. Meios de pagamento. Con-
tas digitais. Pandemia.
1. Introdução
Em março de 2020, houve a decretação de regime de cala-
midade pública no Brasil, decorrente da pandemia de Sars-CoV-2
(coronavírus),408 trazendo, entre outros desafios, a necessidade de
rápida disponibilização de crédito e recursos a pessoas físicas ou ju-
rídicas, a fim de mitigar seus efeitos e manter aquecidos diferentes
407 Mestranda em Direito da Regulação na Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro (FGV- RJ),
com ênfase em Regulação Financeira; graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Ca-
tólica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), com ênfase em Direito Empresarial. Advogada.
408 BRASIL. DecretoLegislativo no 6, de 20 de março de 2020. Disponível em: http://www.pla-
nalto.gov.br/ccivil_03/portaria/DLG6-2020.htm. Acesso em: nov. 2020.
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Transformações do Direito Administrativo:
Direito Público e regulação em tempos de pandemia
setores da economia. Enquanto alguns segmentos, como farmácias
e supermercados, notaram aumento em seus faturamentos, outros,
como bares e restaurantes, precisaram não apenas reinventar seus
modelos de negócios para não falir,409 como também recorrer a
empréstimos para rolar dívidas e buscar manter o fluxo de caixa em
dia. Em muitos casos, houve a necessidade de demitir funcionários
como estratégia de redução de custos, e o prognóstico era bastante
ruim, com a formação de uma massa de desempregados, pessoas
em situações extremas (para além da dificuldade de acesso a ser-
viços de saúde), aumento de violência, entre outros.
Diante dessa nova realidade que se impôs, o governo deparou-se
com a necessidade de reagir rapidamente. Dadas as proporções
do difícil cenário, cujas consequências e desdobramentos seriam
ainda mais graves se o governo demorasse a reagir, a alternativa
era a rápida criação de programas emergenciais e de políticas re-
gulatórias focadas no combate aos efeitos da pandemia. Em abril
de 2020, foi editada a Lei n
o
13.982, a qual estabeleceu medidas
excepcionais de proteção social durante o enfrentamento da pan-
demia de coronavírus. Essa lei estabeleceu o auxílio emergencial
de R$600,00(seiscentos reais)410 pelo período de três meses ao
trabalhador que atendesse cumulativamente a determinados requi-
sitos ali previstos:
411
de forma geral, a condição de trabalhadores
409 Durante a pandemia de coronavírus, o IBGE criou o estudo Pulso Empresa, que pretende
acompanhar os efeitos desse evento sobre as empresas brasileiras. Para mais informações,
veja: https://covid19.ibge.gov.br/pulso-empresa/. Acesso em: nov. 2020.
410 Sendo R$1.200,00(mil e duzentos reais) no caso de mulher provedora de família monoparental.
411 “Art. 2o Durante o período de 3 (três) meses, a contar da publicação desta Lei, será conce-
dido auxílio emergencial no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais) mensais ao trabalhador
que cumpra cumulativamente os seguintes requisitos: I — seja maior de 18 (dezoito) anos de
idade, salvo no caso de mães adolescentes; II — não tenha emprego formal ativo; III — não
seja titular de benefício previdenciário ou assistencial ou beneficiário do seguro-desempre-
go ou de programa de transferência de renda federal, ressalvado, nos termos dos §§ 1o e 2o,
o Bolsa Família; IV — cuja renda familiar mensalper capitaseja de até 1/2 (meio) salário-mí-
nimo ou a renda familiar mensal total seja de até 3 (três) salários mínimos; V — que, no ano
de 2018, não tenha recebido rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 (vinte e oito
mil, quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos); e VI — que exerça atividade na
condição de: a) microempreendedor individual (MEI); b) contribuinte individual do Regime
Geral de Previdência Social que contribua na forma docaputou doinciso I do § 2o do art.
21 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991; ou c) trabalhador informal, seja empregado, autô-
nomo ou desempregado, de qualquer natureza, inclusive o intermitente inativo, inscrito no
Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) até 20 de março de
2020, ou que, nos termos de autodeclaração, cumpra o requisito do inciso IV.” Para maiores
informações, veja: BRASIL. Lei no 13.982, de 2 abril de 2020. http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13982.htm. Acesso em: nov. 2020.

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