Contrato de trabalho

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Ocupação do AutorDesembargador do Trabalho de carreira do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região
Páginas83-115

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1. As distintas formas de relações de trabalho

As relações de trabalho referem-se a todo tipo de prestação humana com ou sem subordinação a outrem. Existe relação de consumo que é regulada no Código de Defesa do Consumidor (CDC - Lei n. 8.078/1990), cujo objeto é determinado produto (compra de um bem, por exemplo) ou um serviço específico. Neste aspecto, entendemos que se a prestação for feita por trabalhador autônomo, como os profissionais liberais (médicos, engenheiros, advogados), existirá relação de trabalho e a competência será da Justiça do Trabalho, aplicando-se as normas do Código Civil, como prevê o art. 5º da CLT.

Quando nos deparamos com o consumidor de uma mercadoria adquirida em um estabelecimento comercial, a relação com o vendedor é de consumo, porque este aparece como preposto do proprietário (seu empregador), enquanto a relação entre vendedor e o dono da empresa é de emprego.

Há, igualmente, relação estatutária, que é a de trabalho desenvolvido por servidores do Estado, admitidos por concurso público ou ocupantes de cargo em comissão. No âmbito federal, é regida pela Lei n. 8.112, de 11.12.1990.

A relação de emprego tem seu conceito legal no art. 442 da CLT, verbis:

Art. 442. Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego.

Parágrafo único. Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela.

Em outros termos, a relação de emprego é caracterizada pela existência de um contrato de trabalho entre as partes, embora mais adequado fosse chamar de contrato de emprego.

1.1. Fases da contratação

A relação de emprego pode ser dividida em três fases: antes da contratação ou pré-contratação (quando o trabalhador regra geral está desempregado, e portanto fragilizado), durante a vigência do contrato (quando o trabalhador tem temor de perder seu emprego) e pós-contratual, aquela quando o trabalhador deixa o emprego (quando não há mais o que temer, podendo negociar livremente seus direitos).

Sendo assim, nos dois primeiros (o antes e o durante), pode-se questionar acerca da vulnerabilidade do trabalhador para garantir seus direitos trabalhistas pela posição inferior em que se encontra, o que não sucede na terceira ocasião (depois de deixar o emprego).

Comentando sobre indisponibilidade de direitos trabalhistas, Amauri Mascaro Nascimento destaca:

Quando parte da doutrina sustenta que o crédito trabalhista não pode ser cedido, refere-se não a todos os créditos trabalhistas, mas, apenas, aos créditos de natureza salarial e no curso do contrato individual de trabalho . Não

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está se referindo aos créditos não-salariais pagos na extinção do vinculo de emprego. O direito do trabalho admite, com restrições, a renúncia dos créditos trabalhistas, que é mais do que a cessão, desde que se verifique no momento ou após a rescisão do contrato individual o trabalho" (grifamos)1

A pré-contratação é a fase que suscita mais debates quanto aos seus efeitos. Podemos dividi-Ia em cinco etapas.

A primeira inicia com o anúncio de vagas, que deve apenas indicar critérios técnicos de admissão para deter-minada atividade, utilizando linguajar claro e preciso. Quaisquer referências a dados íntimos a serem fornecidos pelo possível futuro empregado devem ser evitados, tais como idade, gênero, preferências políticas, religiosas e sexuais, dentre outras que possam demonstrar violação da sua intimidade.

Segue-se a segunda etapa, a nosso ver, a mais importante, que é a entrevista, o primeiro encontro pessoal e oficial entre quem pretende contratar e quem pretende ser admitido. Nessa oportunidade, jamais devem ser formuladas perguntas sobre as mesmas preferências referidas acima, da mesma forma como sobre origem étnica, familiar, uso de substâncias químicas, informações sobre tendências ideológicas, filiação sindical, gravidez ou informações íntimas do candidato.

A terceira etapa é a documental, momento em que devem ser solicitados os documentos comprobatórios do candidato. De acordo com a função que vai ocupar, podem ser pedidos seus diplomas, carteiras funcionais, comprovantes de experiências profissionais anteriores. Há, todavia, documento que não devem ser exigidos, do tipo declaração de antecedentes criminais, certidões negativas de processos cíveis, criminais e trabalhistas, declarações de renda ou negativas de SPC, SERASA e entidades afins, boletins escolares ou prontuários médicos.

A quarta etapa pré-contratual chama-se punctuação. Neste momento, os futuros empregador e empregado negociam as condições efetivas do contrato a ser celebrado: jornada de trabalho a ser cumprida, inclusive intervalos, salário e forma de pagamento, fornecimento de transporte, uso de uniformes ou EPI, enfim, tudo aquilo que deverá, para garantia de ambos, ser consignado nas diversas cláusulas do contrato de trabalho.

A quinta etapa é de efetiva promessa de contratação, quando são solicitados os documentos indispensáveis para a admissão do trabalhador, inclusive, seu exame admissional, entrega de CTPS para anotação, entrega de uniformes e EPI (se for o caso) e marcação do dia de início de atividade. Segue-se o momento da assinatura do contrato por ambas as partes.

No dia assinalado, o candidato comparecerá regularmente e dará início ao seu trabalho como ajustado e ai passa à segunda fase, a da efetiva contratação com a regular vigência do contrato de emprego. Porém, se, na data aprazada, a expectativa de obtenção de emprego resultar frustrada, evidente que estará caracterizado dano ao trabalhador, violada sua dignidade enquanto pessoa humana. Esse dano in re ipsa é presumido porque decorrência de ato omissivo patronal, ensejando direito à reparação adequada.

2. Contrato individual de trabalho

A CLT conceitua contrato individual de trabalho como sendo o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego (art. 442 da CLT).

O ideal seria chamar contrato de emprego, como destacou, no passado, José Martins Catharino, no que foi seguido por Amauri Mascaro Nascimento, Alice Monteiro de Barros, Luciano Martinez, e muitos outros juristas brasileiros, e que alguns doutrinadores costumam chamar de "contrato de trabalho stricto sensu", usando a expressão de Délio Maranhão2.

Conservaremos a denominação contrato individual de trabalho (ou simplesmente contrato de trabalho), porque é a adotada na legislação trabalhista brasileira, sempre celebrado por duas partes: o empregador, que toma os serviços, e o empregado, que empresta a mão de obra em troca de salário. Eventualmente, até pela grande semelhança que os aproxima, chamaremos de contrato de emprego.

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2.1. Características do contrato de trabalho

São cinco as características do contrato de trabalho subordinado, os elementos que o distinguem de outro tipo qualquer de trabalho:

- sinalagmático - existem obrigações contrárias e equivalentes para as partes: o empregado dá sua força de trabalho; o empregador paga-lhe o salário;

- de trato sucessivo - decorre de sua natureza contínua, de duração geralmente ilimitada no tempo. E a sua não eventualidade, porque a prestação de serviço do empregado se dá normalmente por prazo indeterminado, o que faz o contrato ser duradouro;

- intuitu personae - é o caráter de pessoalidade do contrato. Nunca o empregado é uma pessoa jurídica, mas sempre uma pessoa física, uma pessoa singular, perfeitamente identificável como tal. Quando um empregador contrata um empregado, não quer interposta pessoa, mas aquela pessoa determinada;

- onerosidade - o salário é a contraprestação do empregador ao empregado pelo trabalho despendido a seu favor. Não se trata de um ônus patronal, mas de justa retribuição, a medida em que este deve responder pela remuneração do obreiro e os encargos sociais decorrentes da contratação e dos frutos que recebe a partir do trabalho desenvolvido;

- subordinação jurídica - é o mais importante elemento caracterizador da condição de empregado. Entende-se como tal aquela condição exclusiva do empregado de receber e cumprir ordens ao empregador, que lhe cuida das atividades, lhe autoriza cumprimento de jornada regular e suplementar, que lhe retribui pecuniariamente os serviços dispensados. O empregador possui dever de direção, de controle, de aplicação de penas disciplinares, e, do lado oposto, os deveres dos empregados de obediência, diligência e fidelidade3.

2.2. Classificação do contrato de trabalho

Podem existir cinco classificações de contrato de trabalho: quanto à forma de celebração, quanto ao prazo de duração, quanto ao local da prestação, quanto ao número de empregados e quanto ao seu objeto.

Quanto à forma de celebração, possui três espécies: escrito, verbal ou tácito, conforme prevê o art. 443, caput, da CLT. A forma escrita, certamente a mais solene, reconhece expressamente a relação do liame empregatício. Contudo, as duas outras formas (verbal e tácita)...

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