Contrato de trabalho

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Páginas95-134
CAPÍTULO V
CONTRATO DE TRABALHO
1. AS DISTINTAS FORMAS DE RELAÇÕES DE TRABALHO
As relações de trabalho referem-se a todo tipo de prestação humana com ou sem subordinação a outrem.
Existe relação de consumo que é regulada no Código de Defesa do Consumidor (CDC – Lei n. 8.078/1990),
cujo objeto é determinado produto (compra de um bem, por exemplo) ou um serviço específico. Neste aspecto,
entendemos que se a prestação for feita por trabalhador autônomo, como os profissionais liberais (médicos, en-
genheiros, advogados), existirá relação de trabalho e a competência será da Justiça do Trabalho, aplicando-se as
normas do Código Civil, como prevê o art. 5º da CLT.
Quando nos deparamos com o consumidor de uma mercadoria adquirida em um estabelecimento comercial,
a relação com o vendedor é de consumo, porque este aparece como preposto do proprietário (seu empregador),
enquanto a relação entre vendedor e o dono da empresa é de emprego.
Há, igualmente, relação estatutária, que é a de trabalho desenvolvido por servidores do Estado, admitidos por
concurso público ou ocupantes de cargo em comissão. No âmbito federal, é regida pela Lei n. 8.112, de 11.12.1990.
A relação de emprego tem seu conceito legal no art. 442 da CLT, verbis:
Art. 442. Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego.
Parágrafo único. Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício
entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela.
Em outros termos, a relação de emprego é caracterizada pela existência de um contrato de trabalho entre as
partes, embora mais adequado fosse chamar de contrato de emprego.
1.1. FASES DA CONTRATAÇÃO
A relação de emprego pode ser dividida em três fases: antes da contratação ou pré-contratação (quando o tra-
balhador regra geral está desempregado, e portanto fragilizado), durante a vigência do contrato (quando o traba-
lhador tem temor de perder seu emprego) e pós-contratual, aquela quando o trabalhador deixa o emprego (quando
não há mais o que temer, podendo negociar livremente seus direitos).
Sendo assim, nos dois primeiros (o antes e o durante), pode-se questionar acerca da vulnerabilidade do tra-
balhador para garantir seus direitos trabalhistas pela posição inferior em que se encontra, o que não sucede na
terceira ocasião (depois de deixar o emprego).
Comentando sobre indisponibilidade de direitos trabalhistas, Amauri Mascaro Nascimento destaca:
Quando parte da doutrina sustenta que o crédito trabalhista não pode ser cedido, refere-se não a todos os créditos
trabalhistas, mas, apenas, aos créditos de natureza salarial e no curso do contrato individual de trabalho. Não
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Curso de Direito do Trabalho
Georgenor de Sousa Franco Filho
está se referindo aos créditos não-salariais pagos na extinção do vínculo de emprego. O direito do trabalho admite,
com restrições, a renúncia dos créditos trabalhistas, que é mais do que a cessão, desde que se verifique no momento
ou após a rescisão do contrato individual o trabalho” (grifamos)(115)
A pré-contratação é a fase que suscita mais debates quanto aos seus efeitos. Podemos dividi-Ia em cinco etapas.
A primeira inicia com o anúncio de vagas, que deve apenas indicar critérios técnicos de admissão para deter-
minada atividade, utilizando linguajar claro e preciso. Quaisquer referências a dados íntimos a serem fornecidos
pelo possível futuro empregado devem ser evitados, tais como idade, gênero, preferências políticas, religiosas e
sexuais, dentre outras que possam demonstrar violação da sua intimidade.
Segue-se a segunda etapa, a nosso ver, a mais importante, que é a entrevista, o primeiro encontro pessoal e
oficial entre quem pretende contratar e quem pretende ser admitido. Nessa oportunidade, jamais devem ser formu-
ladas perguntas sobre as mesmas preferências referidas acima, da mesma forma como sobre origem étnica, familiar,
uso de substâncias químicas, informações sobre tendências ideológicas, filiação sindical, gravidez ou informações
íntimas do candidato.
A terceira etapa é a documental, momento em que devem ser solicitados os documentos comprobatórios do
candidato. De acordo com a função que vai ocupar, podem ser pedidos seus diplomas, carteiras funcionais, com-
provantes de experiências profissionais anteriores. Há, todavia, documento que não devem ser exigidos, do tipo
declaração de antecedentes criminais, certidões negativas de processos cíveis, criminais e trabalhistas, declarações
de renda ou negativas de SPC, SERASA e entidades afins, boletins escolares ou prontuários médicos.
A quarta etapa pré-contratual chama-se punctuação. Neste momento, os futuros empregador e empregado
negociam as condições efetivas do contrato a ser celebrado: jornada de trabalho a ser cumprida, inclusive interva-
los, salário e forma de pagamento, fornecimento de transporte, uso de uniformes ou EPI, enfim, tudo aquilo que
deverá, para garantia de ambos, ser consignado nas diversas cláusulas do contrato de trabalho.
A quinta etapa é de efetiva promessa de contratação, quando são solicitados os documentos indispensáveis
para a admissão do trabalhador, inclusive, seu exame admissional, entrega de CTPS para anotação, entrega de
uniformes e EPI (se for o caso) e marcação do dia de início de atividade. Segue-se o momento da assinatura do
contrato por ambas as partes.
No dia assinalado, o candidato comparecerá regularmente e dará início ao seu trabalho como ajustado e ai
passa à segunda fase, a da efetiva contratação com a regular vigência do contrato de emprego. Porém, se, na data
aprazada, a expectativa de obtenção de emprego resultar frustrada, evidente que estará caracterizado dano ao tra-
balhador, violada sua dignidade enquanto pessoa humana. Esse dano in re ipsa é presumido porque decorrência
de ato omissivo patronal, ensejando direito à reparação adequada.
2. CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO
A CLT conceitua contrato individual de trabalho como sendo o acordo tácito ou expresso, correspondente à rela-
ção de emprego (art. 442 da CLT).
O ideal seria chamar contrato de emprego, como destacou, no passado, José Martins Catharino, no que foi
seguido por Amauri Mascaro Nascimento, Alice Monteiro de Barros, Luciano Martinez, e muitos outros juristas
brasileiros, e que alguns doutrinadores costumam chamar de “contrato de trabalho stricto sensu”, usando a ex-
pressão de Délio Maranhão(116).
Conservaremos a denominação contrato individual de trabalho (ou simplesmente contrato de trabalho), porque
é a adotada na legislação trabalhista brasileira, sempre celebrado por duas partes: o empregador, que toma os
serviços, e o empregado, que empresta a mão de obra em troca de salário. Eventualmente, até pela grande seme-
lhança que os aproxima, chamaremos de contrato de emprego.
(115) NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 698.
(116) SÜSSEKIND, A. L. et alii. Instituições... cit. (I). 22. ed., p. 241.
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Parte I - Direito Individual do Trabalho
Capítulo V – Contrato de Trabalho
2.1. CARACTERÍSTICAS DO CONTRATO DE TRABALHO
São cinco as características do contrato de trabalho subordinado, os elementos que o distinguem de outro tipo
qualquer de trabalho:
sinalagmático – existem obrigações contrárias e equivalentes para as partes: o empregado dá sua força de
trabalho; o empregador paga-lhe o salário;
de trato sucessivo – decorre de sua natureza contínua, de duração geralmente ilimitada no tempo. E a sua
não eventualidade, porque a prestação de serviço do empregado se dá normalmente por prazo indetermi-
nado, o que faz o contrato ser duradouro;
intuitu personae – é o caráter de pessoalidade do contrato. Nunca o empregado é uma pessoa jurídica, mas
sempre uma pessoa física, uma pessoa singular, perfeitamente identificável como tal. Quando um empre-
gador contrata um empregado, não quer interposta pessoa, mas aquela pessoa determinada;
onerosidade – o salário é a contraprestação do empregador ao empregado pelo trabalho despendido a seu
favor. Não se trata de um ônus patronal, mas de justa retribuição, a medida em que este deve responder
pela remuneração do obreiro e os encargos sociais decorrentes da contratação e dos frutos que recebe a
partir do trabalho desenvolvido;
subordinação jurídica – é o mais importante elemento caracterizador da condição de empregado. Entende-
-se como tal aquela condição exclusiva do empregado de receber e cumprir ordens ao empregador, que lhe
cuida das atividades, lhe autoriza cumprimento de jornada regular e suplementar, que lhe retribui pecunia-
riamente os serviços dispensados. O empregador possui dever de direção, de controle, de aplicação de pe-
nas disciplinares, e, do lado oposto, os deveres dos empregados de obediência, diligência e fidelidade(117).
2.2. CLASSIFICAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
Podem existir cinco classificações de contrato de trabalho: quanto à forma de celebração, quanto ao prazo de
duração, quanto ao local da prestação, quanto ao número de empregados e quanto ao seu objeto.
Quanto à forma de celebração, possui três espécies: escrito, verbal ou tácito, conforme prevê o art. 443, caput,
da CLT. A forma escrita, certamente a mais solene, reconhece expressamente a relação do liame empregatício.
Contudo, as duas outras formas (verbal e tácita) são perfeitamente admissíveis considerando, na expressão que se
repete de Mario de La Cueva, ser o contrato de trabalho um contrato-realidade, que, portanto, pode ser provado,
em juízo, por todos os meios lícitos.
Quanto ao prazo de duração, a regra geral é o contrato por prazo indeterminado (art. 442 da CLT), porque
o pressuposto é de que a relação de emprego tenha caráter duradouro, podendo ainda ter seu prazo de validade
determinado. Esse caráter de indeterminação, como Plá Rodriguez explica, não significa tratar-se de contrato por
toda a vida ou vitalício ou eterno, porque o trabalhador pode dar por terminada a relação quando lhe convier, o
que não seria hipótese do primeiro, que só terminaria com a morte de uma das partes, ou do segundo, que teria
uma terminação prevista (o término da vida de trabalho do trabalhador)(118), ou do terceiro, que importaria mesmo
em transmissão do pacto para os herdeiros e sucessores do empregado.
Além dos contratos por prazo indeterminado ou por prazo determinado, a Lei n. 13.467/17 introduziu novo
tipo de contrato de prestação de trabalho descontínuo, que é o trabalho intermitente (art. 443, final, da CLT).
No quadro abaixo, demonstramos os principais tipos de ajuste temporal de contratação e as previsões legais
de cada um:
Contrato Previsão legal
contrato estipulado por até dois anos art. 445, da CLT
contrato de experiência art. 445, parágrafo único, da CLT
contratos de safra Lei n. 5.889, de 08.06.1973
(117) N. sent.: SÜSSEKIND, A. L. et alii. Idem (I). p. 247 passim.
(118) PLÁ RODRIGUEZ, A. Ob. cit., p. 145.

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