Convivência, afetividades e educação para paz como elementos de práticas educativas não escolares em contextos de violências

AutorLucas Salgueiro Lopes - Arthur Vianna Ferreira
CargoDoutor em Educação: Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) - Mestrando em Educação - Processos formativos e Desigualdades Sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ/FFP)
Páginas74-102
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 46, n. 252, p. 74-102, jan./abr., 2021 | ISSN 2447-861X
CONVIVÊNCIA, AFETIVIDADES E EDUCAÇÃO PARA PAZ COMO
ELEMENTOS DE PRÁTICAS EDUCATIVAS NÃO ESCOLARES EM
CONTEXTOS DE VIOLÊNCIAS
Coexistence, affection and education for peace as elements of non-school
educational practices in contexts of violences
Lucas Salgueiro Lopes
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ/FFP)
Arthur Vianna Ferreira
Faculdade de Formação de Professores da (UERJ/FFP)
Informações do artigo
Recebido em 22/12/2020
Aceito em 23/04/2021
doi>: https://doi.org/10.25247/2447-861X.2021.n252.p74-102
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Atribuição 4.0 Internacional.
Como ser citado (modelo ABNT)
FERREIRA, Arthur Vianna; LOPES, Lucas Salgueiro.
Convivência, afetividades e educação para paz como
elementos de práticas educativas não escolares em
contextos de violências. Cadernos do CEAS: Revista
Crítica de Humanidades. Salvador/Recife, v. 46, n. 252,
p. 74-102, jan./abr. 2021. DOI:
https://doi.org/10.25247/2447-861X.2021.n252.p74-102
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo investigar de que maneira as
práticas edu cativas não escolares podem atuar como uma ferrament a
potente nas regiões de vulnerabilidade social, de forma específica, em sua
relação com o contexto de violências cotidianas vistas a partir de estudo
realizado no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo -RJ. Assim, este
artigo se utiliza de um referencial teórico do campo da Ped agogia Social
de Xesús Jares (2002; 2007; 2008), da Psicologia, de Mahoney e Almeida
(2015), da Sociologia, como com J ohan Galtung (1969; 2016) e da
Filosofia, como com Byung-Chul Han (2017a; 2017b). Assim, tais autores
auxiliam na delimitação e desenvolvimento de práticas de ensino-
aprendizagem que denominamos Educação para Paz-Cidadania (LOPES,
2019). Para o diálogo com esses referenciais, utiliza-se a realidade
expressa em duas pesquisas de campo anteriores: Ferreira e Lopes (2019)
e Lopes (2019); nessas pesquisas, a metodologia u tilizada foi a de
observação de ca mpo a partir da fenomenologia de Edmund Husserl.
Dessa forma, busca-se ampliar a compreensão de conceitos como o de
violências e suas possíveis articulações nas práticas socioeduc ativas dos
indivíduos e nas relações de ensino-aprendizagem existentes nas regiões
periféricas. Os resultados deste artigo apontam para a importância da
atuação do terceiro setor nas práticas educativa s das camadas
empobrecidas, tal como para a possibilidade e importância de práticas de
ensino-aprendizagem carregadas de valores ligados à convivência
democrática, à afetividade, à paz positiva, à cidad ania, entre outros
elementos que possam gerar resultados favoráveis visando à s demandas
específicas dos educandos e da comunidade no seu entorno.
Palavras-Chave: Sociologia da Violência. Convivência. Afetividades.
Educação para Paz-Cidadania.
Abstract
The present article investigates how non-school educational practices act
as a potent tool in regions of social vulnerability, specifically, in their
relationship with the context of violences from a study at the Complexo
do Salgueiro, in São Gonçalo-RJ. This article uses a theoretical framework
from the field of Social Pedagogy of Xesus Jares (2002; 2007; 2008), from
Psychology, with Mahoney and Almeida (2015), Sociology, as with the
Typology of Violence used by Johan Galtung (1969; 2016) and Philosophy,
as with the Positivity’s violence by Byung-Chul Han (2017a, 2017b.). Thus,
such authors assist at the delimitation and development of teaching-
learning practices that we call Education for Peace-Citizenship (LOPES,
2019). For the dialogue with these references, we will use the re ality
expressed in two previous field: Ferreira e Lopes (2019) and Lopes (2019);
in these researches, the met hodology used was that of field observation
based on the phenomenology of the Edmund Husserl. Thus, it seeks to
understanding of concepts such as violence and its possible articulations
in the socio-educational practices of individuals and in the teaching-
learning relationships existing in peripheral regions. The results of this
article point to the importance of the performance of the third sector in
the educational practices for the poor’s people, as well as to the possibility
- and great importance - of teaching-learning practices loaded with values
linked to democratic coexistence, affectivity, peace, positive, citizenship,
among other elements that can generate favorable results aimed at the
specific demands of students and their community.
Keywords: Social Pedagogy. Sociology of Violence. Coexistence.
Affection. Education for Peace-Citizenship.
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 46, n. 252, p. 74-102, jan./abr., 2021
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Convivência, afetividades e educação para paz ... | Lucas S. Lopes e Arthur V. Ferreira
Introdução
O presente artigo parte de duas questões centrais: como as violências e o contexto
social presentes no Complexo do Salgueiro atualmente influenciam na vida cotidiana e
educacional dos moradores da região? Como a Educação pode servir como instrumento para
combater essas violências em um contexto tão marcado pela desigualdade social? Dessa
maneira, tem-se como objet ivo apontar as relações entre afetividade e convivência no
desenvolvimento dos processos de ensino-aprendizagem nas práticas socioeducativas dessa
localidade, tal como a possibilidade da implantação da Educação para Paz nesses ambientes.
Para os conceitos de convivência e Educação para Paz, o principal referencial foi o
educador Xesús Jares (2002; 2007; 2008). Para afetividade, partindo do pensamento de Henri
Wallon, foi utilizado o trabalho de Abigail Mahoney e Laurinda Almeida (2015). A partir
desses referenciais, visa-se vislumbrar as potencialidades da Educação na luta contra as
violências em suas mais diversas formas e a desigualdade social como um todo, resultando
no modelo que denominamos como Educação para Paz-Cidadania em Lopes (2019). As
violências, nesse sentido, serão abordadas a partir de suas formas direta, estrutural e cultural,
tal como proposto por Johan Galtung (1969; 2016), além dos significados e dos
desdobramentos contidos na violência da positividade, conforme visto em Byung-Chul Han
(2017a; 2017b).
Para a melhor compreensão desses conceitos, utilizou -se do contexto das práticas
socioeducativas no Complexo do Salgueiro,
1
referendadas por publicações referentes a duas
1
Denominamos aqui como “Complexo do Salgueiro” as favelas de alguns bairros do 1º distrito de São Gonçalo-
RJ, tais como: Salgueiro, Palmeira, Recanto das Acácias, Itaúna, Itaoca e Fazenda dos Mineiros. Essa
interligação se dá, inicialmente, sobr etudo, por essas regiões possuírem domínio de uma mesma facção
criminosa, o Comando Vermelho. Por outro lado, ainda que haja regiões com razoável nível de sa neamento
básico e uma atuação ainda que mínima do poder público em locais pontuais desses bairros (como, por
exemplo, o denominado “ Rodo de Itaúna”, região central do Complexo que abriga alguns estabelecimentos
comerciais e tem suas ruas e habitações mais distantes das características comuns das favelas ao entorno), a
maior parte dessa região seg ue um padrão sociocultural muito similar, caracterizado pela forte presença das
violências, problemas de urbanização, moradias precárias, falta de serviços públicos bás icos, alto índice de
desemprego, etc. Por fim, cabe acrescentar, para reiterar ainda mais tal posição de uso dessa denominação, que
esse é o termo usado pela maior parte das autoridades públicas para denominar a região, tal como, é aceito e
utilizado com frequência pelos mora dores desses locais. Dessa forma, definimos como “Complexo do
Salgueiro” o “cinturão” de favelas que circundam o bairro homônimo do Salgueiro, caracterizado como região
empobrecida e marginalizada, e possuindo entre si demandas e condições similares, tal como um considerável
sentimento de grupo entre seus moradores.

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