Coordenação na Agricultura Familiar e o Desenvolvimento Territorial: o caso das indicações geográficas para o café

AutorMara Elena Bereta de Godoi Pereira - Ana Elisa Bressan Smith Lourenzani - Sandra Mara Schiavi Bankuti - Giuliana Aparecida Santini Pigatto
CargoMestre em Agronegócio e Desenvolvimento pela Faculdade de Ciências e Engenharia - Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos - Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos - Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos
Páginas131-178
DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2016v15nesp1p131
131131 – 178
Coordenação na Agricultura Familiar e
o Desenvolvimento Territorial: o caso
das indicações geográf‌icas para o café
Mara Elena Bereta de Godoi Pereira1
Ana Elisa Bressan Smith Lourenzani2
Sandra Mara Schiavi Bankuti3
Giuliana Aparecida Santini Pigatto4
Resumo
As Indicações Geográf‌icas (IGs) são registros que garantem a qualidade e a reputação de um pro-
duto, ligando-o à sua origem, reduzindo as assimetrias informacionais e protegendo o território
das ações oportunistas. Considerando as dif‌iculdades encontradas pelos agricultores familiares
para acessar mercados, esta pesquisa analisou como esses registros favorecem a coordenação do
sistema agroalimentar de café na agricultura familiar e quais suas contribuições para o desenvol-
vimento territorial, especif‌icamente nos territórios da Mantiqueira, em Minas Gerais, e no Norte
Pioneiro do Paraná. A Nova Economia Institucional sustentou a análise da compreensão da coor-
denação vertical, considerando a escolha da estrutura de governança ef‌iciente. Já a abordagem
de Sistemas Agroalimentares Localizados auxiliou na compreensão da coordenação horizontal
e do desenvolvimento territorial. Um estudo de casos múltiplos foi realizado, cujos resultados
apontaram que a Indicação Geográf‌ica contribui, principalmente, para a coordenação horizontal
na medida em que reforça os laços entre os atores sociais que compõem o território.
Palavras-chave: Agricultura familiar. Indicações geográf‌icas. Coordenação. Desenvolvimento territorial.
1 Introdução
A agricultura familiar no Brasil tem sido importante objeto de estudos
por ser, entre outros fatores, fornecedora de produtos de primeira necessidade
1 Mestre em Agronegócio e Desenvolvimento pela Faculdade de Ciências e Engenharia, UNESP – Universidade
Estadual Paulista, Campus Tupã/SP. E-mail: mara@tupa.unesp.br.
2 Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos(UFSCAR), Faculdade de Ciências
e Engenharia, UNESP – Universidade Estadual Paulista, Campus Tupã/SP.. E-mail: anaelisa@tupa.unesp.br.
3 Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos(UFSCAR), Universidade Estadu-
al de Maringá (UEM). E-mail: sandraschiavi@gmail.com.
4 Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR),Faculdade de Ciências
e Engenharia, UNESP – Universidade Estadual Paulista, Campus Tupã/SP. E-mail: giusantini@tupa.unesp.br.
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Bereta de Godoi Pereira, Ana Elisa Bressan Smith Lourenzani, Sandra Mara Schiavi Bankuti e Giuliana Aparecida Santini Pigatto
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(BUAINAIN; ROMEIRO; GUANZIROLI, 2003). Isso permite que ela par-
ticipe do comércio de produtos in natura ao abastecer o mercado interno
e também do mercado de insumos, por meio do fornecimento de matéria-
-prima para a indústria de produtos processados (GUILHOTO et al., 2007).
Contudo, o agricultor familiar encontra várias diculdades na gestão da
propriedade rural e na sua inserção em cadeias agroindustriais. Na literatura,
verica-se que os fatores de acesso ao crédito, às inovações e à tecnologia co-
locam os produtores familiares numa posição competitiva desfavorável para
o acesso a grandes mercados (BUAINAIN; PIRES, 2003; VIEIRA FILHO,
2014). A sucessão geracional desse segmento é discutida por Kiyota e Perondi
(2014), os quais vericaram que os interesses pessoais dos lhos dos agricul-
tores familiares nem sempre estão na continuidade da atividade da família.
Já Poulton, Dorward e Kydd (2010) indicam que, para conseguir atender à
demanda dos consumidores por alimentos seguros e de qualidade, é necessário
que o agricultor familiar transponha as diculdades de acesso a insumos, de
acesso a informações técnicas e de informações sobre o mercado. Wilkinson
(2008) considera que o acesso ao mercado pode ser alcançado pela agricultura
familiar por meio de produtos “coloniais” ou associados à produção artesanal,
cuja qualidade está atrelada ao saber-fazer e à tradição. Nesse caso, segun-
do o autor, o desao está, para o agricultor familiar, no gerenciamento e na
comercialização.
Considerando o acesso a mercados, as Indicações Geográcas (IGs) po-
dem se tornar uma estratégia para facilitar a agregação de valor e o acesso a ca-
nais de comercialização, trazendo a possibilidade de aumento de renda e bem-
-estar individual. Tal estratégia deve promover o desenvolvimento territorial
na medida em que recursos locais e produtos típicos de um território são valo-
rizados (BRASIL, 2010). Segundo o Acordo TRIPS (em inglês, Agreementon
Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights), IGs são indicações que
identicam um produto como originário do território de um Membro (da
Organização Mundial do Comércio), ou região ou localidade desse território,
quando determinada qualidade, reputação ou outra característica do produto
seja essencialmente atribuída à sua origem geográca (BRASIL, 1994).
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 15 - Edição Especial - 2016
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No Brasil, há 53 registros atualmente, sendo 45 nacionais e oito estran-
geiros5. Os produtos registrados podem ser in natura ou processados, havendo
também registro para serviços. As regiões protegidas por registros de IGs estão
concentradas no Sul, Sudeste e Nordeste do país. Considerando os registros
de IG para o café, segundo o Instituto Nacional de Propriedade Industrial
(INPI), encontram-se quatro regiões protegidas: a Região do Cerrado Minei-
ro, a Região da Serra da Mantiqueira de Minas Gerais, o Norte Pioneiro do
Paraná e a Alta Mogiana em São Paulo (INPI, 2015).
Para acessar o uso do registro de IG, faz-se necessário atender aos requi-
sitos contidos em normas registradas no INPI, determinadas pelos agentes de
um dado território e que compõem uma entidade representativa da coletivi-
dade. Esse atendimento aos requisitos pode levar os produtores à necessidade
de especialização e de realização de investimentos para garantir o atendimento
aos requisitos e acesso ao uso do registro, segundo Mafra (2008). Conside-
rando que a IG é ligada ao território e que esta assegura determinados atri-
butos, os ativos envolvidos nas transações tendem a serem especícos, assim,
os investimentos realizados para alcançar essa diferenciação nem sempre são
recuperáveis. Tal característica faz com que o produtor rural necessite adotar
estruturas de governança mais complexas, visando à minimização dos custos
de transação.
A adoção de estruturas de governança alinhadas às características das
transações e dos agentes promove a coordenação vertical entre os diversos
agentes que compõem o território com registro de IG. A coordenação e-
ciente permite que as informações decorrentes da transação sejam recebidas,
processadas, difundidas e utilizadas por toda a cadeia produtiva, alinhando as
estratégias de governança (FARINA, 1999). Assim sendo, a coordenação se
torna capaz de reduzir os custos de transação e promover eciência e ecácia
para a cadeia produtiva.
Se, por um lado, as IGs devem promover o desenvolvimento territorial
como armado em Brasil (2010), estudos realizados sobre IGs e o desen-
volvimento territorial no sul do país vericaram situações de consequências
negativas relacionadas às IGs. Froehlich et al. (2010) e Champredonde et al.
5 Dado atualizado em 21 de dezembro de 2015 (INPI, 2015).

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