O covid-19 e as vísceras da necropolítica brasileira sobre a saúde dos corpos negros

AutorEliaidina Wagna Oliveira da Silva
CargoGraduação em Direito. Mestra em Políticas Públicas e Desenvolvimento Local (EMESCAM-ES)
Páginas636-655
O COVID-19 E AS VÍSCERAS DA NECROPOLÍTICA BRASILEIRA SOBRE A SAÚDE DOS CORPOS
NEGROS
Eliaidina Wagna Oliveira da Silva1
Resumo
Esta pesquisa integra literaturas sobre necropoder e segregação dos corpos negros como políticas de descartes raciais. A
leitura de Borges (2020), Fernandes (2008, 2017), Foucault (2005), Gomes (2019), Nascimento (2016), Mbembe (2019)
denuncia uma necropolítica de semente colonizadora, que é voltada ao genocídio negro, e encontra na pandemia do covid-
19 a estufa para as mortes etiquetadas pelo racismoDestaca que a maior mortandade da peste pandêmica a agir dentro
desses grupos mar ginalizados é a sistematização secular de um segregacionismo não oficializado, mas resistente.
Concluique o mito da democracia racial é o mecanismo de marginalização mais agressivo a ser combatido, porque é o que
mais reflete na desumanização das vidas negras, ao desacreditar medidas de inclusão social positiva.
Palavras-chave: Necropolítica. Covid-19. Racismo. Democracia Racial.
THE COVID-19 AND THE VISSCERA OF THE BRAZILIAN NECROPOLIT ICS CONCERNING THE HEALTH OF BLACK
BODIES
Abstract
This research integrates literature on necropower and segregation of black bodies as racial discard policies. Reading Borges
(2020), Fernandes (2008, 2017), Foucault (2005), Gomes (2019), Nascimento (2016), Mbembe (2019) denounces a
necropolitics of colonizing seed, which is focused on black genocide, and finds in the covid-19 pandemic, the stove for
deaths tagged by racism Highlig hts that the greatest death toll from the pan demic plague acting within these marginal ized
groups is the secular systematization of an unofficial but resistant segregationism. It is concluded that the myth of racial
democracy is the most aggressive marginalization mechanism to be fought, because it is the one that most reflects in the
dehumanization of black lives, by discrediting measures of positive social inclusion.
Keywords: Necropolitics. Covid-19. Racism. Racial Democracy.
Artigo recebido em: 2021-03-26Aprovado em: 20/11/2021
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v25n2p636-655
1 Gradua ção em Dir eito. Mestra em Políticas Públicas e Desenvolvi mento Local (EMESCAM-ES). Discente de Formação
Pedagógica em História e pós-graduando em Antropologia. E mail: eliaidinawagna @gmail.com
Eliaidina Wagna Oliveira da Silva
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1 INTRODUÇÃO
O Brasil, estruturado por uma cultura genocida, demarca-se pela exclusão dos corpos
negros naturalizados nos espaços periféricos como seus lugares sociais por natureza. Suas
humanidades foram expostas às marginalizações e desumanizadas não só pela omissão do poder
estatal, mas por uma sistematização sociocultural direcionada aos descartes das sobras escravizadas
que os distanciaram do acesso das políticas universalistas.
O descaso foi germinado por um processo de formação colonizada que hierarquizou, com
influência do contexto escravagista, uma metodificação racial categorizada pela cor da pele, em cuja
pirâmide fixou as pessoas de pele branca no pico da valorização e os escravizados a serviço da
Colônia Europeia com a validação estatal movimentada em garantia dos privilegiados. Essa dinâmica
encontrou o terreno fértil que sedimentou uma espécie de escalonamento de seres humanos tendo por
base ciências pseudocientíficas de superioridade das raças.
Desde a imigração europeia, o uso da miscigenação voltada ao genocídio dos corpos
negros até a dissimulada harmonia das raças, para a justificativa de ausência de medidas de inclusão
positiva, a atuação brasileira se direciona ao enjeitamento dos resíduos do passado escravagista. Essa
prática é permanente até os dias atuais, com uma política voltada ao segregacionismo em aberta
manipulação da morte física, moral e civil de uma população negra marginalizada.
Este artigo dialoga com Borges (2020), Fernandes (2008, 2017), Foucault (2005), Gomes
(2019), Nascimento (2016), Mbembe (2019), Miguel (2019) e outros autores a denunciar um
necropoder atuante no genocídio dos corpos negros. As análises descritivas expõem políticas
universalistas direcionadas a favor dos grupos dominantes e voltadas a uma atuação de aversão e
intolerância que se opera em torno de uma necropolítica.
Aponta-se o necropoder como uma construção doutrinária a conceituar a prática de um
poder soberano a serviço do genocídio de raças inferiorizadas pela visão elitista. Conclui-se pela
necessidade de mais produções acadêmicas a expor o massacre dos negros brasileiros operado por
intermédio de uma política da morte a usar mecanismos estatais para o segregacionismo racial.
Como ferramentas da necropolítica, a dissimulação de harmonia racial respalda ausências
de políticas de inclusão social positiva e encarceramento em massa levando ao cultivo de condições
mortíferas permanentes de minorias negras expostas à insegurança perene. Soma- se letalidades, o
descaso político para com as favelas vulnerabilizadas, mais ainda com a recente pandemia do covid-19
que, embora causando a mortandade de milhares de brasileiros, mostra agressividade mais funesta
sobre os corpos negros.

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