Por que criar uma licença pública?

AutorSérgio Branco - Walter Britto
Páginas23-61
Capítulo 1
Por que criar uma licença pública?
Acesso a um mundo mais criativo
Em junho de 2011, a Secretaria Municipal de Educação de
São Paulo decidiu licenciar seu material didático valendo-
-se de uma licença Creative Commons. A partir de então,
tornou-se possível copiar, modif‌icar e distribuir, desde que
sem f‌ins lucrativos, publicações elaboradas pela Secretaria
e disponíveis em seu portal (portalsme.prefeitura.sp.gov.
br), incluindo livros e apostilas com material de classe e de
apoio.
Ao fazer a opção pelo licenciamento, Alexandre Schneider,
secretário de Educação da cidade de São Paulo, af‌irmou que a
decisão se devia ao fato de que a prefeitura vinha recebendo
diversas solicitações de outras cidades do país para o uso do
material por eles desenvolvido. Disse ainda que, como não
tinham uma forma adequada de licenciar o conteúdo, opta-
ram por uma licença que permitia que qualquer um pudesse
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FGV de Bolso
utilizar e adaptar os materiais pelos quais o governo já havia
pagado.12
Iniciativas como esta têm se tornado cada vez mais comuns
em todo o mundo. Sites governamentais de países como Aus-
trália, Chile, Coreia do Sul, Grécia, Itália, México, Nova Ze-
lândia, Portugal, Rússia e Estados Unidos, entre muitos ou-
tros, são licenciados em Creative Commons. Dessa forma, é
possível – no mínimo – reproduzir e divulgar seu conteúdo
sem o risco de violar direitos autorais alheios. É o próprio
governo que autoriza, previamente, o uso do material dispo-
nível, e em que condições o uso deverá se dar.
Também em 2011, os documentaristas Paola Castaño e Dai-
los Batista realizaram um média-metragem intitulado Runa
Kuti – indígenas urbanos. O f‌ilme trata de descendentes de
comunidades indígenas que hoje vivem em Buenos Aires, da
luta por manter sua identidade e de como encontrar seu lugar
na cidade grande.
Os diretores decidiram tornar o f‌ilme disponível na inter-
net por meio de uma licença Creative Commons que permite
a qualquer interessado fazer cópias para uso privado e para
terceiros e divulgar o f‌ilme na íntegra, desde que não modi-
f‌ique a obra nem a explore comercialmente. Justif‌icam sua
decisão af‌irmando que a cultura deve ser livre para ser com-
partilhada, e que a lei de direitos autorais não se encontra
adequada para se adaptar a novas práticas culturais.13
Depois de seu lançamento, o f‌ilme contou com notícia no
prestigiado site Global Voices14 (cujo conteúdo também é licen-
12 Disponível em: ai-colocar-todo-seu-material
-pedagogico-na-internet,728448,0.htm>.
13 Disponível em: >.
14 Disponível em: online.org/2012/03/22/argentina-documentary-on-
-the-indigenous-people-in-buenos-aires/>.
O que é Creative Commons?
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ciado em Creative Commons) e já participou de alguns festivais
internacionais na América Latina. Pode ser acessado no portal
de vídeos Vimeo, inclusive com legendas em diversos idiomas.15
Como podemos perceber a partir dos dois exemplos men-
cionados, muito pouco há que os una. O primeiro trata de um
projeto educacional promovido pelo governo da maior cidade
do Brasil. Seu objetivo principal é democratizar o acesso a
conteúdos educativos. A f‌im de se atingir tal objetivo, auto-
riza a cópia e a adaptação de material didático desenvolvido
pela Secretaria Municipal de Educação.
Por se tratar de um ato governamental, é compreensível
que não haja interesse econômico envolvido. Af‌inal, o contri-
buinte já pagou pela elaboração daquele conteúdo. E, como
bem observou Alexandre Schneider, vários são os municípios
que não podem pagar para desenvolver seu próprio material
didático. Nada mais justo, portanto, do que autorizar que
seja reproduzido por terceiros.
Ainda que se possa alegar que foi exclusivamente a cidade
de São Paulo quem f‌inanciou o desenvolvimento dos livros e
apostilas licenciados, seu aproveitamento por alunos de ou-
tras localidades só pode reverter em benefício do país. Af‌inal,
ao se permitir que outras cidades utilizem o mesmo material
didático da Prefeitura de São Paulo, poderão aquelas destinar
seus próprios recursos à satisfação de outras necessidades.
Já quanto ao documentário argentino, foi realizado prova-
velmente com baixo orçamento e sem a ambição de atingir
milhões de espectadores (em um mês, foi visto por pouco
mais de 1.200 pessoas no site Vimeo).16 Trata-se de obra ar-
15 Disponível em: .html>.
16 Disponível em: >.

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