Criminalização de notícias falsas

AutorEduardo Luiz Santos Cabette
CargoDelegado aposentado
Páginas8-10
TRIBUNA LIVRE
8REVISTA BONIJURIS I ANO 31 I EDIÇÃO 661 I DEZ19/JAN20
Eduardo Luiz Santos Cabette DELEGADO APOSENTADO
CRIMINALIZAÇÃO DE NOTÍCIAS FALSAS: MAIS UMA FAKE NEWS
ALei 13.834/19 criou um
novo tipo penal no-
digo Eleitoral, preven-
do a chamada “denun-
ciação caluniosa eleitoral”,
consistente, resumidamente,
na conduta de imputar, com
ciência absoluta da falsidade,
a prática de infração penal ou
ato infracional a alguém, en-
sejando a instauração de algu-
ma investigação ou processo
contra a vítima, tudo isso com
f‌ins eleitorais (art. 326-A da Lei
4.737/65 – Código Eleitoral)1.
Havia, originalmente, um
§ 3º no artigo 326-A, que foi
vetado pelo Executivo e que
assim versava:
§ 3º Incorrerá nas mesmas pe-
nas deste artigo quem, comprova-
damente ciente da inocência do
denunciado e com f‌inalidade elei-
toral, divulga ou propala, por qual-
quer meio ou forma, o ato ou fato
que lhe foi falsamente atribuído.
As razões do veto foram
explicitadas nos seguintes
termos:
A propositura legislativa ao
acrescer o art. 326-A, caput, ao
Código Eleitoral, tipif‌ica como
crime a conduta de denunciação
caluniosa com f‌inalidade eleitoral.
Ocorre que o crime previsto no § 3º
do referido art. 326-A da proposi-
tura, de propalação ou divulgação
do crime ou ato infracional objeto
de denunciação caluniosa eleito-
ral, estabelece pena de reclusão, de
dois a oito anos, e multa, em pata-
mar muito superior à pena de con-
duta semelhante já tipif‌icada no
que é de propalar ou divulgar ca-
lúnia eleitoral, cuja pena prevista
é de detenção, de seis meses a dois
anos, e multa. Logo, o supracitado
§3º viola o princípio da proporcio-
nalidade entre o tipo penal descri-
to e a pena cominada.
Esse veto, entretanto, foi
derrubado pelo Congresso
Nacional, de modo que a pro-
palação ou divulgação da de-
nunciação caluniosa eleitoral
segue incriminada com as
mesmas penas do crime em
destaque2.
Com esse acontecimento
passou-se a veicular em vá-
rios canais, inclusive (pas-
mem) jurídicos, que teria
havido a “criminalização das
fake news”.
Derosa deixa claro que o
conceito de fake news é algo
muito amplo, podendo ser re-
sumido na noção de notícias
falsif‌icadas, as quais sempre
existiram, antes conf‌inadas
na chamada “grande mídia”,
agora expandidas para as re-
des sociais3.
O que foi vetado pelo Exe-
cutivo não foi a criminaliza-
ção das fake news, mas sim
a aplicação da mesma pena
por denunciação caluniosa
eleitoral. Além disso, não ao
autor da denunciação, mas a
todo aquele que a propale ou
divulgue, sabendo da falsida-
de. Com razão, o Executivo
apontou para a violação da
proporcionalidade, uma vez
que a pena para a mesma pro-
palação e divulgação no crime
de calúnia eleitoral (art. 324, §
do Código Eleitoral) é muito
menor. O motivo da distinção
de tratamento entre os cri-
mes de calúnia e de denuncia-
ção caluniosa é que o primei-
ro atinge tão somente a honra
do ofendido e, no caso da elei-
toral, o interesse na integrida-
de do pleito. Na denunciação
caluniosa há um bem jurídico
adicional, que é o interesse
da correta administração da
justiça e ainda o risco corrido
pelo denunciado caluniosa-
mente de sofrer uma conde-
nação e até prisão injusta.
Não há como comparar os
níveis de gravidade da denun-
ciação caluniosa e da mera
calúnia. Nenhuma conduta
dessa espécie é admissível ou
justif‌icável, mas a gravidade é
clara e evidentemente diver-
sa. Com um tratamento igual,
no que tange à pena comi-
nada, há violação patente da
proporcionalidade pelo fato
óbvio de que o propalador
ou divulgador não dá causa
à instauração de processo ou
investigação contra o ofen-
dido e, portanto, não coloca
em risco a liberdade deste e
muito menos movimenta in-
devidamente a administração
Rev-Bonijuris_661.indb 8 14/11/2019 17:44:10

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