Crise sistêmica: Sociedade fraterna como meta da Constituição

AutorRicardo Sayeg - Marcia de Souza Alvim - Luciana Monteiro da Cruz
CargoProfessor de direito quântico da PUCSP - Coordenadora de direito da PUCSP - Advogada
Páginas146-162
SELEÇÃO DO EDITOR
146 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 665 I AGO/SET 2020
Ricardo SayegPROFESSOR DE DRETO QUÂNTCO DA PUCSP
Marcia Cristina de Souza AlvimCOORDENADORA DE DRETO DA PUCSP
Luciana Sabbatine Neves Monteiro da CruzADVOGADA
SOCIEDADE FRATERNA COMO
META DA CONSTITUIÇÃO
O comando de edicação de uma sociedade fraterna tem natureza de
norma constitucional, encerrando em si preceito normativo magno e
com supremacia de todo o ordenamento jurídico
Segundo a Board of Innovation – consul-
toria internacional de global strategy
& business design, que atende a clien-
tes como Danone, Philips, , Roche e
Toyota –, o tsunami maligno da covid-19
implicará o aumento de tensão e conflitos em
todos os níveis. Conforme sua análise prospec-
tiva, muitas organizações e pessoas estão ope-
rando em modo de sobrevivência, mostrando-
-se inclinadas a quebrar contratos e regulações
ao longo do caminho1.
Nesse cenário, o papel do Poder Judiciário
será estratégico, central e determinante para o
sucesso nacional de superação da crise sistêmi-
ca, especialmente quanto à aplicação do prin-
cípio da fraternidade em consubstancialidade
quântica com os direitos contratuais e de pro-
priedade privada, incluindo a resposta penal de
violação à ordem pública.
A sociedade fraterna é uma meta constitu-
cional, como demonstra o Supremo Tribunal
Federal () em precedente da ministra Cár-
men Lúcia2 e na conduta de seu presidente, Dias
Toffoli, assim como dos demais ministros dian-
te da pandemia.
Em notável tarefa de requintada lapidação
jurídica, vêm se destacando no Poder Judiciário
magistrados de singular sensibilidade no tocan-
te à aplicação do princípio da fraternidade, sem
que isso signifique perspectiva paternalista em
favor dos devedores ou uma manifestação polí-
tica esquerdista, ambas censuráveis.
Esses magistrados estão a aplicar a frater-
nidade sem aviltar a confiança da nação e dos
investidores na justiça, o que é imprescindível,
pois, conforme o justice Felix Frankfurter, da
suprema corte dos 3, a autoridade da corte
não é oriunda da espada, mas sim se sustenta
na reiterada confiança pública na moralidade
de suas decisões, razão pela qual não cabem ao
Judiciário manifestações políticas.
A aplicação do princípio da fraternidade, com
a qual o país dá um salto civilizatório, está a se
sedimentar no Judiciário desde antes da decre-
tação de estado de calamidade pública, eis que,
em janeiro deste ano de 2020, o ministro Moura
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Ricardo Sayeg, Marcia Alvim, Luciana da CruzSELEÇÃO DO EDITOR
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REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 665 I AGO/SET 2020
É imprescindível destacar o pioneirismo do desembargador do TJPR Roberto
Portugal Bacellar, que, já em 1999, publicava seus escritos defendendo a mediação
e a relevância desse instituto de resolução de conitos pela via pacíca
Ribeiro, do , para quem é preciso compreen-
der que o “capital pode e deve ser humanístico”4,
foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz pela aplica-
ção do capitalismo humanista correspondente
à dimensão econômica dos direitos humanos na
edificação da sociedade fraterna.
Em paralelo, o ministro Reynaldo da Fonse-
ca, também do , que vem de profundo mer-
gulho científico no princípio constitucional da
fraternidade, consolidou no Brasil o conceito
de justiça restaurativa na aplicação da resposta
penal5, que, aos nossos olhos, trata-se da dimen-
são penal dos direitos humanos na edificação
da sociedade fraterna.
Ainda no , o ministro Marco Buzzi, como
pacifista e visionário da fraternidade, desde
muito defende que a mediação não é mera alter-
nativa, ao afirmar que “é preciso lutar por uma
cultura da conciliação como a primeira e me-
lhor técnica para a solução das controvérsias”6,
como de fato está correto. Como diz o professor
Luiz Ayoub, a mediação é “o caminho”. No Con-
selho Nacional de Justiça (), o conselheiro
Henrique Ávila igualmente defende a media-
ção como imprescindível instrumento de so-
lução das controvérsias. Contribuições de paz
e fraternas, invulgares à cultura da mediação,
atualmente encontram-se em todos os foros
jurídicos. Ademais, é imprescindível destacar o
pioneirismo do desembargador do  Roberto
Portugal Bacellar, que, já em 1999, quando pou-
cos falavam em medidas alternativas autocom-
positivas, publicava seus escritos defendendo a
mediação7 e a relevância desse instituto de reso-
lução de conflitos pela via pacífica, como faz até
os dias atuais. Naquela época, a mediação era
associada a uma prática pastoral e muito inci-
pientemente estimulada nos nossos tribunais.
Em São Paulo, a justiça está presidida pelo de-
sembargador Pinheiro Franco, que é de perfil de
enorme bom senso e nitidamente fraterno. Não
por acaso, jogando luz na fraternidade, o corre-
gedor-geral da justiça, desembargador Ricardo
Anafe, em 2020 instituiu o projeto de concilia-
ção e mediação pré-processual para disputas
empresariais, sob a condução dos juízes Renata
Maciel, Paulo Furtado e Maria Rita Dias8.
No Rio de Janeiro, a juíza Maria Penha Nobre
Mauro, cumprindo rigorosamente os ditames
do art. 8º do Código de Processo Civil, aplicou
nítida, embora implicitamente, a fraternidade
ao dar liminar a fim de impedir o corte de luz
dos vulneráveis9. Enfim, se vê a fraternidade
aplicada por todo o país, do Sul ao extremo Nor-
Guilherme Scarpim
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