Da extorsão (Art. 158)

AutorFrancisco Dirceu Barros
Ocupação do AutorProcurador-Geral de Justiça
Páginas1189-1204
Tratado Doutrinário de Direito Penal
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Art. 158
1. Conceito do delito de extorsão
O delito consiste no fato de o sujeito ativo cons-
tranger alguém, mediante violência ou grave ameaça,
e com o intuito de obter para si ou para outrem indevi da
vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou
deixar de fazer alguma coisa.
Leciona Paulo José da Costa Júnior que o con-
ceito do crime de extorsão (chantage dos franceses,
black mail dos americanos) resulta bastante claro da
fórmula normativa. A ratio da tutela penal é a exigência
de proteger, de um lado, a liberdade moral, ou seja,
a faculdade de cada um determinar-se livremente, e,
de outro, o patrimônio.3132
Proteção constitucional: veja que a Constituição
Federal dispõe, no seu art. 5o, II:“Ninguém será
obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude da lei.”
Bento de Faria3133arma:“Oconceitojurídico
deextorsãoseajustaàsignicaçãoetimológi-
ca do vocábulo (de extorquere – obter à força)
e consiste em procurar alguém, para si ou para
outrem, um proveito injusto, constrangendo ou-
tra pessoa, mediante violência ou ameaça grave,
a fazer ou omitir alguma coisa. O ataque à liber-
dadeé ummeio enão umm,dês queo delito
é praticado contra o patrimônio e não contra as
liberdades individuais.”
Magalhães Noronha defende que são dois os
elementos característicos do crime: o estado de
coação da vítima, e a ação ou omissão a que é obri-
gada, da qual resultará proveito ilícito para o sujeito
3132 Comentários ao Código Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva,
2002, p. 482.
3133 Obra citada.
ativo. Em toda a sua contextura, ela apresenta os
seguintes requisitos: a) o meio coativo do agente
(ameaça ou violência); b) o estado de coação do su-
jeito passivo; c) a ação ou omissão deste; d) o  m de
vantagem econômica ilícita do agente.
O STJ decidiu que a extorsão pode ser feita me-
diante ameaça de causar um prejuízo econômico à
vítima. Não se exige que a ameaça seja apenas de
causar prejuízo contra a integridade física ou moral
da vítima.
CURIOSIDADE INTERESSANTE
Relata Fragoso que, no período imperial, a ex-
torsão era dividida em duas hipóteses: “como crime
extraordinário, a concussio (D, 47, 12), que podia
ser pública ou privada. Concussio publica era o
fato de alguém simular autoridade ou exercício de
função pública, para extorquir dinheiro ou valores. A
concussio privata ou crimen minari era a ameaça de
ação pública para obter vantagem patrimonial”.3134
2. Análise didática do tipo penal
2.1. A extorsão majorada
A extorsão terá a pena aumentada de um terço
até metade em duas hipóteses, a seguir destacadas.
1a hipótese: se o crime é cometido por duas
ou mais pessoas.
INDAGAÇÃO PRÁTICA INTERESSANTE
O aumento de pena ocorrerá também em caso
de participação?
3134 No mesmo sentido: FrAgOSO, Heleno Cláudio. Lições de
Direito Penal, cit., v. l, p. 215.
Capítulo 4
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Entendemos que não. Essa é a lição de Mirabete,
Greco,3135 Rogério Sanches3136 Bitencourt e também
de Capez,3137 que arma: “Aqui a lei fala em cometi-
mento, não em concurso, sendo indispensável, pois,
que os coagentes pratiquem atos executórios do crime,
ou seja, constranjam a vítima, mediante o emprego de
violência ou grave ameaça. Desse modo, não se con-
gurará essa majorante se um dos agentes limitar-se a
realizar vigília para que o seu comparsa realize a extor-
são. Exige-se, portanto, a coautoria e não a mera parti-
cipação. Não se deve confundir essa majorante com a
prevista no crime de roubo e furto, pois os arts. 155, §
4o, IV, e 157, § 2o, II, preveem o concurso de pessoas, o
qual abrange a coautoria e a participação, ao contrário
da majorante em estudo.”3138
Neste sentido também é a orientação de Masson:3139
Ao contrário do que fez no roubo, em seu art.157, § 2º,
inciso II, o Código Penal fala em crime “cometido por
duas ou mais pessoas”, e não em “concurso de duas
ou mais pessoas”. É indispensável, destarte, que todos
os envolvidos na empreitada criminosa realizem atos
executivos de extorsão, mediante a utilização de vio-
lência à pessoa ou grave ameaça. A lei impõe a coautoria,
não se contentando com a simples participação. Exempli -
cativamente, não incide a majorante no caso no qual
uma pessoa constrange a vítima no interior de uma
agência bancária, enquanto seu comparsa a aguarda
para fuga com o dinheiro levantado.
POSIÇÃO DIVERGENTE
Luiz Regis Prado, em posição minoritária, defen-
de que “é dispensável que todos estejam presentes
no locus delicti, exigindo-se somente os requisitos
inerentes ao tema de concurso de pessoas (art. 29
do CP)”.3140
3135 GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. Niterói: Impetus,
2017, 11ª edição, versão digital, tópico – art.158 extorsão,
causas de aumento de pena.
3136 CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal – Parte
Especial (arts. 121 ao 361). Salvador: Juspodivm, 2015, 7ª
edição, p.269.
3137 Nesse sentido: CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal,
parte especial, v. 2, Editora Saraiva, 2003, p. 404.
3138 No mesmo sentido, Júlio MIRABETE, Fabbrini. Manual de
Direito Penal, cit., v, 2, p. 250.
3139 MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado: Parte Espe-
cial – vol 2. São Paulo: MÉTODO, 2016, 9ª edição, p.479.
3140 régiS PrADO, Luiz. Curso de Direito Penal brasileiro, cit.,
v. 2, p. 407.
2a hipótese: se o crime é cometido com o em-
prego de arma.
Obs.: remetemos o leitor aos comentários que
zemosàmajorantedoempregodearmanoroubo.
Note-se que o STJ tem entendido que a majorante
prevista no §1º do art. 158 pode ser aplicada não
só à modalidade simples (caput) como à modalidade
qualicada (§3º)3141.
2.2. A extorsão qualicada
A extorsão será qualicada em duas hipóteses:
a) e da violência resulta lesão corporal grave;
b) se da violência resulta morte.
Obs.: remetemos o leitor aos comentários que
zemosàs qualicadorasdo roubo,que sãoas
mesmas.
INDAGAÇÃO PRÁTICA
Veja esta questão, elaborada no contexto prático
forense.
O crime de extorsão é hediondo?
Resposta. Em apenas uma hipótese a extorsão
é considerada crime hediondo. Leia o art. 1o, inc. III,
da Lei no 8.072/1990, in verbis:
São considerados hediondos os seguintes crimes, todos
tipicados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 – Código Penal, consumados ou tentados:
(...)
III – extorsão qualicada pela morte (art. 158, § 2o).
2.3. Os tipos de ameaça na extorsão
A ameaça pode ser justa ou injusta.
Para Rogério Sanches,3142 a análise da gravi-
dade é complexa. Há inuência de diversos fatores,
como fragilidade da vítima, momento (dia ou noite),
local (ermo, escuro, etc.) e até mesmo a aparência
do agente. Arma o autor que não obstante a gra-
ve ameaça deve ser dirigida a uma pessoa, não é
necessário que seja contra sua integridade física,
bastando que o mal prometido seja injusto e capaz
de causar efetivo temor.
3141 STJ. 5ª turma. Resp. 1.353.693-RS, Rel. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, julgado em 13/09/2016
3142 CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal – Parte
Especial (arts. 121 ao 361). Salvador: Juspodivm, 2015, 7ª
edição, p.267.
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