Da Falência. Da Recuperação Judicial e Extrajudicial. Da Liquidação Extrajudicial. Do Grupo Econômico. Da Responsabilidade do Sócio. Do Devedor Insolvente. Do Credor com Garantia Real. Da Sucessão. Do Empreiteiro e do Subempreiteiro. Da Sociedade de Fato e da Sociedade Irregular
Autor | Francisco Antonio de Oliveira |
Ocupação do Autor | Desembargador Federal do Trabalho aposentado do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região |
Páginas | 469-539 |
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O art. 83, I, da Lei n. 11.101, de 9.2.2005, fez modificações radicais no crédito trabalhista em caso de falência e teve sua eficácia liminarmente suspensa pela ADIn n. 3.424/DF.
O juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo (art. 76, Lei n. 11.101/2005). Todas as ações, inclusive as excetuadas no caput deste artigo, terão prosseguimento com o administrador judicial, que deverá ser intimado para representar a massa falida, sob pena de nulidade do processo (parágrafo único).
Com o decreto de falência, todas as ações deverão ser direcionadas ao juízo da falência desde que digam respeito aos bens, interesses e negócios do falido. Ficam excepcionadas as causas trabalhistas e fiscais e aquelas não reguladas pela Lei n. 11.101/2005 em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo. O síndico passa a denominar--se administrador judicial e deverá ser intimado, sempre, nas ações contra a massa, sob pena de nulidade do julgado.
Decretada a falência, o falido perde o direito de administrar a massa, embora não perca o direito de defender o seu património e até mesmo de recorrer (art. 103). O es-
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tado de falido nao proporciona nenhum benefício processual para a massa e a ausência do administrador judicial ou do seu representante (art. 104, IV), quando devidamente intimado, desagua na revelia e na confissão quanto à matéria de fato (arts. 884, CLT, 319, CPC, 344, NCPC). Na Justiça do Trabalho, há o benefício da Súmula n. 86, que desobriga a massa de efetuar depósito recursal e remete para final o pagamento de custas que seriam devidas por ocasião do ato de recorrer. As possíveis dificuldades de o administrador judicial inteirar-se dos documentos para produzir defesa nenhuma influência terão na instrução trabalhista, se e quando necessária, não a desobrigando da produção de prova dos créditos.
A nova Lei de Falências traz enfoque diverso da lei anterior sobre a classificação dos créditos. Dispõe:
Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:
I — os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho;
II — créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;
III — créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias;
IV — créditos com privilégio especial, a saber:
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os previstos no art. 964 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002;
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os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;
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aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia;
V — créditos com privilégio geral, a saber:
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os previstos no art. 965 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002;
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os previstos no parágrafo único do art. 67 desta Lei;
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os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;
VI — créditos quirografários, a saber:
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aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo;
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os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento;
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os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do caput deste artigo;
VII — as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias;
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VIII — créditos subordinados, a saber:
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os assim previstos em lei ou em contrato;
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os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatído.
§ 1º Para os fins do inciso II do caput deste artigo, será considerado como valor do bem objeto de garantia real a importância efetivamente arrecadada com sua venda, ou, no caso de alienação em bloco, o valor de avaliação do bem individualmente considerado.
§ 2° Não são oponíveis à massa os valores decorrentes de direito de sócio ao recebimento de sua parcela do capital social na liquidação da sociedade.
§ 3º As cláusulas penais dos contratos unilaterais não serão atendidas se as obrigações neles estipuladas se vencerem em virtude da falência.
§ 4º Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.
Art. 151. Os créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos 3 (três) meses anteriores à decretação da falência, até o limite de 5 (cinco) salários mínimos por trabalhador, serão pagos tão logo haja disponibilidade em caixa.
O artigo usa o termo disponibilidade que deve ser analisado levando em conta o privilégio do crédito trabalhista nos termos do art. 186 do Código Tributário Nacional, Lei Complementar que somente rende tributo à Constituição Federal, face ao princípio da hierarquia das normas, superior, portanto, à Lei de Falências. Deve, pois, ser pago em primeiro lugar como medida tutelar da dignidade do trabalhador tendo em conta o caráter alimentar do crédito. Cuida-se em realidade de adiantamento de crédito o qual será compensado por ocasião do pagamento do restante do crédito transformado em quirografário com valor devidamente atualizado.
A classificação dos créditos levada a efeito pelo art. 83 da nova Lei de Falências desprestigia o crédito trabalhista quando limita o benefício da preferência ao valor de cento e cinquenta salários mínimos (I) e considera quirografário o que sobejar àquele valor (VI, c). Prestigia o crédito com garantia real (II) e o crédito tributário (III), colocando-os em posição superior ao crédito trabalhista. Realiza-se, assim, o desejo dos governantes atuais e pretéritos de derrocada do crédito trabalhista, sem qualquer resistência dos sindicatos das categoriais e Centrais Sindicais que se dizem paladinos dos trabalhadores. Nada foi dito nem qualquer resistência foi esboçada por tais órgãos. A próxima investida, tudo indica, será a transformação do crédito trabalhista em simples crédito quirografário, com pequeno limite ou condição, de modo a satisfazer o novo art. 186, parágrafo único, II, CTN, v. g., que excepciona o crédito do menor aprendiz. Tudo isso, com a leviandade ou possível inspiração do governo, que se autointitula governo dos trabalhadores.
Todavia, a Lei de Falências, lei ordinária, afrontava o art. 186 do Código Tributário Nacional, lei complementar, superior na hierarquia. Foi preciso que fosse votada a Lei Complementar n. 118, de 9.2.2005, de modo a permitir a modificação. Dessa forma, o art. 186 ficou com a seguinte redação:
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Art. 186. O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho.
Parágrafo único. Na falência:
I — o crédito tributário não prefere aos créditos extraconcursais ou às importâncias passíveis de restituição, nos termos da lei f alimentar; nem aos créditos com garantia real, no limite do valor do bem gravado;
II — a lei poderá estabelecer limites e condições para a preferência dos créditos decorrentes da legislação do trabalho; e
III — a multa tributária prefere apenas aos créditos subordinados. A porta desmoralizadora do crédito trabalhista foi aberta.
Há que se registrar lapso cometido pelo legislador na Lei n. 11.101/2005 (LF), art. 83, I, e na Lei Complementar n. 118/2005 ao dar nova redação ao art. 186 da Lei n. 5.172/1966 (CTN), equivoca-se, todavia, quando registra a preferência do crédito acidentário. A responsabilidade pelo crédito proveniente de acidente do trabalho foi remetida para a Previdência Social, conforme Lei n. 6.367, de 19.10.1976, e Decreto n. 79.037, de 24.12.1976, que foram recepcionados pela Lei n. 8.213/1991, art. 18, I, h, e art. 86, respectivamente. Apenas os primeiros quinze dias do auxílio-doença são de responsabilidade do empregador. Em suma, a...
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