Da sentença inconstitucional transitada em julgado e sua desconstituição

AutorThiago Camargo Garcia
Ocupação do AutorProcurador do Estado de São Paulo. Ex-procurador do Estado de minas gerais. Especialista em direito constitucional pela PUC-SP
Páginas99-130
99
Da sentença inconstitucional transitada
em julgado e sua desconstituição
7.1 Signicado da expressão sentença passada em julgado
violadora da Constituição Federal e natureza jurídica
do ato inconstitucional
Sentença inconstitucional transitada em julgado119, nos
termos de nosso trabalho, signif‌ica uma sentença de mérito120
violadora de regra, ou princípio constitucional, que não pode
mais ser revista por meio de recurso.
Nesse prisma, dissertando sobre constitucionalidade e in-
constitucionalidade, Jorge Miranda ensina que tais conceitos
119 Conforme mencionado no capítulo 2, p. 24, o trânsito em julgado objeto
da monograf‌ia diz respeito à coisa julgada material. É óbvio que a formação
da coisa julgada formal precede e é indispensável para a formação da coisa
julgada material.
120 Lembramos que o termo sentença é utilizado em sentido lato para designar
também os acórdãos dos tribunais.
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 sentença transitada em julgado violadora da constituição federal de 1988
100
“(...) designam conceitos de relação: a relação que se estabelece
entre uma coisa – a Constituição – e outra coisa – um compor-
tamento – que lhe está ou não conforme, que com ela é ou não
compatível, que cabe ou não no seu sentido.”121
Entendemos, nesse contexto, que os atos do Poder Judiciário
– precisamente as sentenças e acórdãos122 - também podem ser
inconstitucionais, na medida em que, na interpretação e aplica-
ção do direito pelos magistrados, pode ocorrer transgressão da
Não nos olvidemos que os atos do Executivo e Legislativo
também são atos de interpretação e aplicação do direito, uma
vez que a Constituição concebeu estes poderes, e seus atos de-
vem ser formal e materialmente compatíveis com ela.
Ora, se as decisões judiciais estivessem imunes à análise da
constitucionalidade, é evidente que a força normativa da Cons-
tituição restaria esvaziada, pois, em última análise, caberia ao
Judiciário estabelecer o conteúdo da Carta Magna.
André Ramos Tavares, a esse propósito, consigna, verbi gra-
tia: “(...) ninguém nega que uma decisão judicial possa incidir
na inconstitucionalidade, por violar a Carta Magna de um país,
com o que estar-se-á em face de um comportamento do Poder
Judiciário incompatível com a Constituição.”123
121 Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade. Reimpressão. Coimbra:
Coimbra Editora, 1996, p. 11.
122 Aludimos a sentenças e acórdãos porque conf‌iguram a função típica do
Judiciário, sendo sabido e notório que ele também edita atos administrativos
e normativos.
123 Tratado de arguição de preceito fundamental. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 176.
da sentença inconstitucional transitada em julgado... 
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No recurso extraordinário o Supremo Tribunal Federal
julga, exatamente, a constitucionalidade de decisões judiciais
proferidas em única, ou última instância.124
Após o trânsito em julgado e dentro do prazo de dois anos
do referido trânsito, na hipótese de sentença incompatível com
a Lei Suprema, cabe ação rescisória com suporte no inciso V
do artigo 485 do Código de Processo Civil, ou seja, violação
de literal disposição de lei, porque o signo lei foi utilizado em
sentido amplo para designar lei de hierarquia constitucional e
infraconstitucional. Ora, seria ilógico admitir ação rescisória em
caso de ilegalidade e não ser cabível na hipótese de inconstitu-
cionalidade, pois a desconformidade formal ou material com a
Constituição consiste no mais grave tipo de ilegalidade.
Entrementes, o problema fulcral da monograf‌ia é a possi-
bilidade de desconstituição de sentenças inconstitucionais tran-
sitadas em julgado após se esvair o prazo da ação rescisória.
Antes de ingressarmos com vigor nessa seara, todavia, é
salutar tecer algumas considerações sobre a natureza jurídica da
sentença inconstitucional, vale dizer, se se trata de ato inexisten-
te, nulo, anulável, ou inef‌icaz.
(...)
II - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou
última instância, quando a decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Consti-
tuição.
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. (Incluída pela Emen-
da Constitucional nº 45, de 2004)
(...)

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