Democracia não tem recall, o Judiciário deveria ter

AutorArthur Daniel Calasans Kesikowski
CargoProfessor de Direito Civil da Facear
Páginas96-106
96 REVISTA BONIJURIS I ANO 31 I EDIÇÃO 658 I JUN/JUL 2019
DOUTRINA JURÍDIcA
Arthur Daniel Calasans Kesikowski PROFESSOR DE DIREITO CIVIL DA FACEAR
DEMOCRACIA NÃO TEM
RECALL
,
OJUDICIÁRIO DEVERIA TER
I
O JUSTO, O MORAL E O LÍCITO DEVERIAM TOCAR MAGISTRADOS
E MINISTROS. ENQUANTO OS DIREITOS FOREM NEGADOS,
DIFÍCIL SERÁ ACREDITAR NA IMPARCIALIDADE DOS TRIBUNAIS
Quando exercemos a docência ou mes-
mo quando somos profissionais com-
prometidos com o nosso ocio, temos
o dever e a responsabilidade de cons-
tantemente revisitar, reinterpretar e
relembrar os mais basilares conceitos que jus-
tificam a nossa existência como produto de
esforço humano.
Em se tratando de ciências humanas apli-
cadas, mais precisamente da ciência jurídica,
um conceito que nunca pode ser ofuscado é o
da justiça, sobretudo a justiça como medida
do possível no caso em concreto. Nas palavras
de Hans Kelsen (1988, p. 3):
A justiça é uma qualidade ou atributo que pode
ser afirmado de diferentes objetos. Em primeiro
lugar, de um indivíduo. Diz-se que um indivíduo,
especialmente um legislador ou um juiz, é justo
ou injusto. Neste sentido, a justiça é representada
como uma virtude dos indivíduos. Como todas as
virtudes, também a virtude da justiça é uma quali-
dade moral; e, nessa medida, a justiça pertence ao
domínio da moral. [...] Mas a qualidade ou a virtu-
de da justiça atribuída a um indivíduo exterioriza-
-se na sua conduta: na sua conduta em face dos
outros indivíduos, isto é, na sua conduta social.
Em uma tradução simplista, quase intuiti-
va, temos como um patamar justo aquilo que
subjetivamente consideramos correto, o bem.
Quando esse patamar individual se encontra
assegurado de fato, a justiça é garantida na
prática, com escopo de um processo de expe-
rienciar e viver algo socialmente.
Ou o ser humano é bom (do bem) e a so-
ciedade o corrompe ou é mau e renuncia tal
impulso através de sua racionalidade em prol
de sua existência, objetivando os benecios
decorrentes da cultura.
Mas, considerando objetivamente que de-
sejamos o bem próprio e individual, na maio-
ria das vezes podemos assumir que este é mais
seguro se estendido coletivamente. O justo é
justiça se for garantido a todos.
Tal lógica se demonstra quase que incon-
teste se levarmos em conta a impossibilida-
de de sobrevivência do ser humano de forma
isolada. Assim explana Bauman (2001, p. 42),
assumindo posicionamento sobre a natureza
humana:
Volta e meia leio nas resenhas de meus livros que
sou um seguidor de Rousseau: Bauman, dizem
alguns críticos, presume que os seres humanos
são intrinsecamente bons, e que ser mau é uma
condição anormal de origem não individual, mas
social. Porém, essa nunca foi minha posição. Não
Rev-Bonijuris_658.indb 96 24/05/2019 10:52:56

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