Democracia e Terrorismo

AutorRoberto Bin
Ocupação do AutorProfessor e Coordenador do Doutorado em Direito Constitucional da Universidade de Ferrara, Diretor do Instituto de Estudos Avançados IUSS-Ferrara 1391
Páginas323-338
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DeMOcRacIa e TeRRORISMO
Roberto Bin1
1. CRISES E EMERGÊNCIAS: CONSTANTES DA hISTORIA
CONSTITUCIONAL.
É armação recorrente que a luta contra o terrorismo determine
uma séria ameaça à tutela dos direitos constitucionais. – Não tenho
intenção a contraditá-la, mas apenas de procurar de entender em que
consiste a ameaça, de onde chega o perigo e quais são os antídotos.
Uma primeira observação me parece, porém, indispensável. Nem
o terrorismo, nem a sua dimensão internacional, nem a política de res-
trição dos direitos de liberdade, em nome da defesa da segurança do
estado são fenômenos novos, ao contrário. Também sem compartilhar
completamente a visão um pouco desmoralizante proposta da Gior-
gio Agamben2, a história constitucional nos demonstra com extrema
evidência como a “quebra” da tutela constitucional dos direitos e das
liberdades em nome da defesa e da segurança seja uma constante em
qualquer lugar e em qualquer época. Uma visão um pouco onírica
das virtudes do estado liberal tem velado de ideologias uma realidade
bem mais complexa.
Toda a nossa história constitucional ocidental, quer sejamos cons-
cientes ou não, é marcada, de fato, por esse problema. O conceito
1 Professor e Coordenador do Doutorado em Direito Constitucional da Universi-
dade de Ferrara, Diretor do Instituto de Estudos Avançados IUSS-Ferrara 1391.
Tradução Anita Mosca.
2 Stato di eccezione, Torino, 2003.
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de crise constitucional é imanente, constantemente atual, na história
constitucional da Europa, que é marcada justamente das etapas mais
signicativas de ameaças à ordem constituída e das reações do estado,
todas elas inspiradas nas exigências de proteger a segurança coletiva
ainda que interrompendo as garantias constitucionais: A crise do 1930,
os motos do 1948, a Comuna de Paris, os tumultos de m século, a
Grande Guerra e as sequelas da revolução bolchevique, a chegada do
fascismo... Todos momentos de crises, de ameaça ao sistema. Crise
tem signicado de ruptura, interrupção na tutela dos direitos constitu-
cionais, a recorrente suspensão deles a favor do prevalente interesse
da tutela da ordem pública. Sobre esse tema gostaria lembrar uma
passagem do grande jornalista e cronista dos eventos institucionais
franceses da metade do 1800, que foi Karl Marx: “Os respeitáveis an-
cestrais republicanos tinham feito ao seu símbolo, o tricolore, a volta
pela Europa. Seus seguidores [refere-se a Louis Bonaparte], também
zeram uma invenção que abriu o caminho por todo o continente,
para voltar à França com amor sempre renovado. Essa invenção é
chamada de ‘estado de sítio’, excelente invenção, aplicada periodi-
camente em cada crise que sucedeu durante a Revolução Francesa”.3
Não é uma visão patriótica dos eventos, dado que a mesma teo-
ria constitucional justicava essas rupturas. Poderia citar dois vozes.
Uma é aquela de um autor que o Carl Schmitt gostava tanto, Donoso
Cortés. “Quando a legalidade é bastante para salvar a sociedade, que
seja a legalidade; Quando não é suciente seja a ditadura .... A dita-
dura, em algumas circunstâncias, em circunstâncias como a atual, é
um governo legitimo, legal, útil como qualquer outro, é um governo
racional, que pode ser defeso em teoria como na pratica”.4 Donoso
Cortés era um pensador de alto nível, um lósofo que reetia com
dramática clareza sobre o delicado e instável equilíbrio que, num re-
gime constitucional liberal, cria-se entre a garantia e a suspensão dos
direitos, entre legalidade constitucional e sua supressão em nome da
segurança do estado. E outro grande intelectual, François Guizot, ob-
servava que “O que tem sido chamado sempre de lei de exceção é
uma lei temporária que derroga o direito permanente do país. A lei so-
3 Il 18 Brumaio di Luigi Bonaparte, Roma, 1974,
4 Em seu célebre Discorso sopra la dittatura.
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