Desdemocratização e não fruição de direitos fundamentais: a atuação do jurista contemporâneo em face do governo à distância das agências de rating

AutorMarcello Lavenère Machado Neto
CargoGraduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Pós-graduando em Direito Tributário pelo IBET
Páginas270-292
DESDEMOCRATIZAÇÃO E NÃO FRUIÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS: A
ATUAÇÃO DO JURISTA CONTEMPORÂNEO EM FACE DO GOVERNO À
DISTÂNCIA DAS AGÊNCIAS DE RATING
Marcello Lavenère Machado Neto1
Submetido(submitted): 15 de setembro de 2016
Aceito(accepted): 19 de outubro de 2016
RESUMO
Em 2008, o mundo se viu mergulhado em uma crise financeira global gerada, em grande
medida, pela atuação irresponsável das maiores agências de classificação de risco de crédito
do mundo. Alguns anos depois da eclosão da crise, essas agências estão ainda mais influentes
e economicamente consolidadas do que se encontravam antes de 2008. Governança à
distância, aparente despolitização e desdemocratização são alguns dos sintomas gerados por
tais agências que afetam diretamente ordens econômicas e jurídicas a nível transnacional. Este
artigo intentou imaginar formas de atuação do jurista contemporâneo que objetivem evitar que
o poder dessas agências venha a interferir negativamente na fruição de direitos fundamentais
e da liberdade do ser humano ao redor do globo.
PALAVRAS-CHAVE: Agência de Classificação de Risco de Crédito; governança à
distância; desdemocratização.
ABSTRACT
In 2008 the world was involved in a deep global financial crisis, which was, for the most part,
engendered by irresponsible actions taken by Credit Rating Agencies. A few years after the
outbreak of this crisis, these Agencies are even more influential and economically powerful
than they were prior to 2008. As a consequence of this, governance at distance, seeming
depolitization and dedemocratization are directly impacting economic and legal orders at a
transnational level. This paper has sought to imagine how a contemporary jurist could act so
as to keep this Agencie’s power from negatively affecting the enjoyment of fundamental
human rights and freedoms around the world.
KEYWORDS: credit rating agencies; governance at distance; desdemocratization.
INTRODUÇÃO
“Novo rebaixamento pode fazer Brasil perder até U$S 20 bi em investimento2. Essa
era a manchete de uma revista de grande circulação brasileira, em dezembro de 2015, após o
Brasil ter seu selo de bom pagador rebaixado pela agência de notação de risco (de rating)
norte-americana Fitch.
Curioso notar que notícias deste tipo, que expressam o enorme poder de influência das
agências rating sobre o investimento global, continuam a ser corriqueiras 8 anos após a
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
1 Graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Pós-graduando em Direito
Tributário pelo IBET.
2Disponível em: http://veja.abril.com.br/economia/novo-rebaixamento-pode-fazer-brasil-perder-ate-us-20-bi-em-
investimentos/. Acesso em: 05/08/2016.
economia mundial ter entrado em colapso pelo fato de tais agências terem possivelmente
fraudado3 o grau de créditos subprimes, durante a crise do mercado financeiro em 2008. Mais
que isso, dados recentes apontam que elas nunca estiveram tão fortes4.
Para se medir a importância do impacto de tais agências, vale mencionar, a título de
comparação, que o valor de investimento possivelmente perdido pelo Brasil acima
mencionado, por exemplo, foi maior que o PIB anual de 10 estados brasileiros no ano de
20135. Mesmo após comprovadas falhas de classificação de risco na crise econômica de 2008,
a ainda imensa influência destas agências na economia global faz com que acadêmicos das
mais diversas áreas tentem responder à seguinte pergunta: como elas conseguem legitimidade
para exercer tamanho poder?
O trabalho que se inicia intentará responder tal pergunta, mapeando os possíveis
efeitos do poder destas agências no cenário global, a fim de, posteriormente, contribuir para a
reflexão sobre possíveis formas de atuação de juristas que visem evitar que o poder de tais
agências venha a interferir na promoção de direitos fundamentais, da justiça e na liberdade do
ser humano.
Para isso, primeiramente, será necessário entender o pertencimento dessas agências a
uma dinâmica contemporânea do cenário global de “governança à distância”. Entender a
formação histórica dos construtos matemáticos que são os pilares dessa dinâmica é
fundamental para entender de onde vem a legitimidade que tais agências recebem de entes
privados e públicos pelo globo.
Em um segundo momento, será necessário mapear os principais efeitos que a
“governança” exercida por tais agências exercem sobre o globo, a quais consequências que tal
forma de governança pode levar e como elas podem afetar a fruição de direitos fundamentais
pelo mundo.
Ao final, diante de toda problematização apresentada, serão feitas algumas reflexões
acerca de possíveis formas de atuação dos juristas, a fim de evitar que o poder de tais agências
venham a comprometer uma devida fruição de direitos fundamentais, a promoção da justiça e
a liberdade do ser humano.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
3 Vários processos foram ajuizados pelo Departamento de Justiça estadunidense, alegando conduta fraudulenta
das agências de risco, mas até o momento todos eles acabaram em acordo, tendo as agências pagado multas
milionárias para fechar tais acordos.
4Disponível em: http://br.wsj.com/articles/SB10620507992549273295504581599534095941222. Acesso em:
05/08/2016.
5 São menores que o valor mencionado os PIBs de RR, AC, AP, TO, RO, PI, SE, AL, PB e RN. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/pibmunicipios/2010_2013/default_ods.shtm. Acesso em:
05/08/2016.

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