Sobre o devido processo legal e o desenvolvimento social e sobre a análise socioeconômica da reforma trabalhista: Regulação e captura da solidariedade social

AutorPaulo Ricardo Opuszka
Páginas452-456

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Ver Nota12

1. Introdução

Muitos aspectos poderiam ser analisados no contexto das condições históricas e políticas da reforma trabalhista. A opção poderia ser política, sociológica, econômica ou simplesmente jurídica. Por outro lado, a reflexão poderia ser teórica, ou mesmo teórico-crítica, abordando as contradições do sistema jurídico brasileiro e os elementos de outros sistemas, especialmente o modelo americano e, em que medida os mesmos podem ser utilizados na regulação do capital e trabalho no Brasil. Está será a nossa opção no presente artigo.

O objetivo da presente reflexão é afirmar que o devido processo legal, além de um dever-poder ao qual o poder Judiciário esta submetido por força constitucional3, é um direito humano e fundamental. Assim sendo, quando seu marco fundamental é afetado, o Estado de Direito é afetado, e aquilo que foi estabilizado ao longo da afirmação da jovem Democracia Brasileira começa a apresentar as fissuras de uma crise que parece mais profunda do que num primeiro momento se apresentou.

Cabe destacar que no Brasil, o devido processo legal não é simplesmente um direito fundamental, mas, um direito fundamental contextualizado a partir do diapasão do desenvolvimento social brasileiro, de forma que, o devido processo legal, sem o exercício legítimo das prerrogativas democráticas de participação popular e a garantia ao aces-so de bens e serviços de natureza econômica, denominado desenvolvimento social (que poderia ser chamado também de acesso à cidadania) não passa de um compromisso ineficaz4 especialmente nos países latinoamericanos5.

A afirmação última deste texto é de que a qualidade de democracia, nos países latinoamericanos, tem relação direta com o padrão de desenvolvimento social.

De imediato cumpre ressalvar que não se está fazendo análise acerca do custo do Estado, mas necessariamente de legitimidade e participação dos cidadãos nas decisões que alteram padrões de conquistas de direitos fundamentais, em especial os prestacionais.

Também cumpre ressalvar que, a diferença entre o salário mínimo brasileiro e o salário mínimo americano, especialmente no que tange ao custo em favor do Estado, pago pelo empresário e pelo trabalhador, está especialmente no sistema tributário brasileiro e no grau de desigualdade que ele gera, de forma que se torna complexa a comparação entre os padrões mínimos de desenvolvimento social dos dois modelos, primeiro indicativo de razão pela qual qualquer importação de sistema torna-se inapropriada.

Assim sendo, as afirmações deste artigo precisarão realizar uma breve análise da conjuntura brasileira atual em que, além dos direitos e garantias fundamentais processuais — leia-se devido processo legal — estarem sendo violados (em especial nas ações da força tarefa — operação conhecida internacionalmente como Operação Lava Jato), os direitos fundamentais sociais — fundos públicos voltados para custear a educação superior gratuita e de qualidade,

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direitos trabalhistas e direitos ligados à previdência social — estão sendo estruturalmente modificados e consequentemente diminuídos, sem a obrigatória participação popular, através dos processos constitucionalmente previstos, além de outros6.

Para tanto, a reflexão será dividida em 4 seções: 1) a principal consequência do Impeachment; 2) o sistema inquisitório e o neoinquisitório, garantismo e o devido processo legal brasileiro no garantismo brasileiro; 3) o desenvolvimentismo social do séc. XXI; 4) novo neoliberalismo no Governo Temer e a Reforma Trabalhista.

2. A principal consequência do Impeachment

Na atualidade, a reforma trabalhista é um dos principais temas no Direito do Trabalho e na reflexão sobre o trabalho no Brasil, em especial por modificar, para pior, o patamar de desenvolvimento social alcançado pelos trabalhadores7.

Ela não veio sozinha: está acompanhada pelo processo de desmonte das Universidades Públicas, de uma nova onda de privatização das empresas estatais, do projeto de Reforma da Previdência Social e, por fim, por um processo generalizado de ocupação do espaço e da coisa pública pelas grandes corporações8.

O Impeachment foi somente o primeiro ato da ação parlamentar, infelizmente facilitada pela ação judicial oriunda da ação da Força Tarefa da Policia Federal e do Ministério Público Federal, além da atuação da 13ª Vara Federal de Curitiba9.

Ainda, no desenvolvimento do alcance das investidas em face da Soberania Nacional, ocorrerão mudanças que afetarão o princípio da Ordem Econômica Brasileira (art. 170 da Constituição Federal) especialmente a partir da privatização do setor público.

Todavia, de imediato, não foi a privatização de nenhuma estatal ou concessão, Parceria Público Privada ou alguma ação neste sentido que ocorreu logo após o Impeachment. O que ocorreu foi à reforma trabalhista.

Dentre os argumentos daqueles que defendem a reforma trabalhista, três chamam especialmente a atenção: a inspiração fascista da Consolidação das Leis Trabalhistas de 1943; a saída da mão de obra qualificada do Brasil, em busca do mercado de trabalho do exterior (especialmente de formação tecnológica), nos países mais desenvolvidos; desoneração da folha de pagamento; por fim, o número “excessivo” de sindicatos no Brasil e sua ilegitimidade de representação dos trabalhadores.

Os dados gerais da reforma serão analisados por outros artigos da presente obra.

3. O sistema inquisitório e o neoinquisitorio; o garantismo e o devido processo legal brasileiro no garantismo brasileiro

A Lei anticorrupção trouxe uma inovação processual com a categoria colaboração premiada a partir da Lei n. 12.850/2013. O Direito Americano já conhecia a expressão popular delação premiada e o acordo de leniência — pactuado com o Ministério Público para diminuição de pena — uma espécie de transação penal.

Entretanto, no Brasil da Civil Law, isso não era possível.

Cumpre ressalvar que a referida Lei foi aprovada ainda durante o Governo Dilma, o que para a maioria dos críticos do modelo legislativo, era exatamente nesta entronização que se colocava o ovo da serpente.

Não é o objeto central da análise, mas vale dizer que os principais problemas afetos a garantias constitucionais do novo modelo estão nas abusividades das prisões e conduções coercitivas, na tortura psicológica a partir da influência da teoria dos jogos e do dilema do prisioneiro aplicado ao sistema brasileiro.

Outro ponto importante é o uso dos meios de comunicação...

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