A era digital
Author | Dario José Kist |
Profession | Mestre em Direitos Fundamentais |
Pages | 25-56 |
Prova Digital no Processo Penal
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1. Sociedade da informação e da comunicação
Já se tornou comum, para caracterizar a sociedade na época em
que vivemos, designá-la como sociedade da informação e da comunicação;
em perspectiva evolutiva, seria uma sociedade pós-industrial ou pós-
-moderna1.
SUSAN CRAWFORD2sustenta que devemos ao economista FRITZ
MACHLUP a referência inicial ao termo e ao conceito de Sociedade da
Informação, inserta em livro intitulado “The Production and Distribution
of Knowledge in the United States”, publicado em 1962; mas, que o
desenvolvimento do conceito foi trabalho de PETER DRUCKER, no livro
“The Age of Discontinuity”, publicado em 1966; segundo aquela autora, é
nesta obra que constam, pela primeira vez, referências a uma sociedade
pós-industrial, em que o poder da economia – que teria evoluído da agri-
cultura para a indústria e desta para os serviços – estaria, agora, centrado
na informação.
Se esta realidade já era detectável na década de 60 do século XX,
ela intensicou-se até o nal desse mesmo século, muito por conta do
surgimento e da popularização da Internet, que permitiu o desenvolvi-
mento de inúmeras tecnologias digitais dela dependentes. E, no que aqui
interessa, houve profundas alterações nos modos de as pessoas se comu-
nicarem entre si e de terem acesso a informações.
De fato, a sociedade da informação e da comunicação é um “mundo”
com intenso uxo de informações, que está em veloz e permanente
mudança e em que o conhecimento é exível, uido e sempre em expansão;
as noções existentes sobre território foram relativizadas, pois superadas
as barreiras que o espaço, assim como o tempo, impunham à comunicação
entre as pessoas, notadamente as ausentes.
Essa realidade, própria da sociedade da informação, é caracterizada
por MANUEL CASTELLS3 desse modo: a) a informação é a principal
1 Há uma variação terminológica na expressão “sociedade informacional e comunicacional”,
usada, por exemplo, por BENJAMIM SILVA RODRIGUES, in Direito Penal Informático-digi-
tal. Coimbra: Coimbra Editora, 2009, p. 29.
2 CRAWFORD, Susan. “The Origin and Development of a Concept: The Information
Society”. In Bull. Med. Libr. Assoc. Nº 71, October 1983, pp. 380 e 382.
3 CASTELLS, Manuel. A Era da Informação: economia, sociedade e cultura. Vol. 1. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2002.
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matéria-prima, havendo uma relação simbiótica entre a tecnologia e a
informação, que se auto-complementam; b) as novas tecnologias têm
alta capacidade de penetração e, em consequência, poder de inuenciar
a vida privada e social, a economia e a política; c) há predomínio da lógica de
redes, própria de relações complexas, mas que, graças às novas tecnolo-
gias, pode ser implementada em qualquer tipo de processo, facilitando a
interação entre as pessoas; d) há exibilidade, pois a tecnologia favorece
processos reversíveis, permite modicação por reorganização de compo-
nentes e tem alta capacidade de reconguração; e) há uma crescente
convergência e interação entre as tecnologias, principalmente a micro-
eletrônica, as telecomunicações, a optoeletrônica, os computadores e,
inclusive, a biologia, ou seja, há uma interligação entre as trajetórias de
desenvolvimento tecnológico de diversas áreas do saber.
Pode-se dizer, portanto, que das muitas características, a nota peculiar
desta sociedade situa-se na transcendental função que as tecnologias da
informação e da comunicação desempenham globalmente, tanto na vida
privada das pessoas como nas atividades sociais, culturais e econômicas.
Com efeito, essas tecnologias potencializaram em muito a aquisição, o
armazenamento, o processamento e a distribuição da informação por
meios eletrônicos, nomeadamente os que funcionam com as bases da
Internet, e essas tecnologias são utilizadas pelas pessoas em seus contextos
sociais, econômicos e políticos, criando uma nova comunidade local, que
é também, e ao mesmo tempo, global 4.
2. Sociedade do conhecimento?
As realidades acima descritas e que alteraram completamente os
modos de vida e de existência no globo terrestre, têm sido identicadas,
em perspectiva claramente otimista, como representando, no seu conjunto,
uma sociedade do conhecimento. A explicação é singela: aumentando o
número de informações e tornando-as acessíveis ao um maior e crescente
número de pessoas, ao menos em tendência, mais pessoas teriam acesso
ao conhecimento.
4 GOUVEIA, Luís Manuel Borges. Sociedade da Informação. Notas de Contribuição para uma
Denição Operacional. Disponível em <homepage.ufp.pt/lmbg/reserva/lbg_socinformacao04.pdf>
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O apuramento desta ideia no campo sociológico situa-se na diferen-
ciação entre ‘sociedade da informação’, para signicar os impactos gerados
pelo progresso tecnológico no campo das comunicações e que culminou
na globalização midiática, e ‘sociedade do conhecimento’, que seria o
resultado natural do desenvolvimento da sociedade de informação5.
Essa distinção mostra-se pertinente, pois não se pode confundir
informação com conhecimento: embora seja certo que as informações
constituem a base do conhecimento, a aquisição deste depende do desen-
cadeamento de uma série de operações intelectuais, que relacionam os
novos dados com as informações pré-existentes e já armazenadas pelo
indivíduo; ou seja, o conhecimento é adquirido quando as diversas infor-
mações se conectam e se interrelacionam, criando uma rede de novas
signicações e que são interiorizadas pelo indivíduo6.
Contudo, se a distinção é correta, é questionável a assertiva de que
a sociedade da informação conduz, necessariamente, a uma sociedade
do conhecimento; em realidade, essa ideia traduz uma grave distorção,
típica da atualidade, consistente na crença de muitas pessoas de que sabem/
conhecem a signicação dos acontecimentos, simplesmente porque
receberam alguma informação sobre eles. Nada mais equívoco: ter
informações sobre algo – pense-se, por exemplo, na política e na economia de
determinado país, no seu sistema jurídico, ou na constituição do corpo
humano – não é a mesma coisa que conhecê-lo integralmente e na sua
essência, nas suas características, nos seus efeitos, nas suas particularidades7.
5 PRADILLO, Juan Carlos Ortiz. Problemas Procesales de la Ciberdelincuencia. Madrid: Editorial
Colex, 2013, p. 15.
6 PELLICER, Esther Gispert. “La moda tecnológica en la educación: Los peligros de un
espejismo”. In Píxel Bit - Revista de Medios y Educación. Nº 9, Junho 1997, pp. 81-92, 88.
Esta professora da Universidade de Paris VIII apresenta a questão na perspectiva do uso
das novas tecnologias nas práticas educativas, asseverando que elas geraram confusão
entre informação e conhecimento: “Estas dos palabras, que se utilizan a menudo como
sinónimas, entrañan signicaciones muy distintas. Las informaciones constituyen la base del
conocimiento, pero la adquisición de éste implica además la puesta en marcha de una serie
de operaciones intelectuales, que ponen en relación los nuevos datos con las informaciones
almacenadas previamente por el individuo. El conocimiento se adquiere, pues, cuando las
diversas informaciones se interelacionan mutuamente, creando una red de signicaciones que
se interiorizan. En la actualidad, uno de los transtornos provocados por los medias es el hecho
que el Hombre moderno cree tener acceso a la signcación de los acontecimientos, simpIemente
porque ha recibido información sobre éstos”.
7 Nesse contexto, é certa a frase do antropólogo francês PHILLIPPE BRÉTON: “Les médias,
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