A dinâmica da locação

AutorLuiz Fernando de Queiroz
Páginas15-60

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1. Reforma acelera locação

- Se seu imóvel está encalhado há meses ou anos, peça para sua imobiliária verificar se o problema não está na má administração do condomínio.

Se você é proprietário de um daqueles conjuntos comer-ciais que estão vazios há meses, no aguardo de inquilinos que não aparecem, o problema provavelmente não está no tamanho ou localização do imóvel, mas na qualidade da conservação do prédio, especialmente no visual da portaria. Prédios com entradas ruins – mal iluminadas, feias – produzem um efeito esperado: repelem os melhores pretendentes à locação, para não dizer quase todos eles.

Para comprovar a assertiva acima, fizemos uma pesquisa informal em edifícios do centro de Curitiba. Embora sem caráter científico, o levantamento nos trouxe algumas conclusões.

Nos prédios antigos, mal conservados, geralmente o síndico vem se perpetuando no cargo. É reeleito ano após ano.

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Parece que o síndico envelhece com o prédio ou que o edifício envelhece com o síndico. Tanto faz.

  1. Nesses edifícios parados no tempo, havia um grande número de unidades vazias para locação. Num prédio de dezoito andares, por exemplo, oito pavimentos mostravam anúncios de sala para alugar ou vender. Em outras edificações semelhantes, o panorama era o mesmo: a existência de espaço vazio acima da média, muitos fechados por meses e até anos, com valores deteriorados de aluguel, sem perspectiva de ocupação.

  2. Nos edifícios mais bem administrados, com portaria reformada, a situação foi totalmente oposta. O número de salas e conjuntos disponíveis para locação ou venda era o mínimo. Ou mesmo nenhum.

  3. Um comparativo entre os vários edifícios pesquisados mostrou existir uma relação matemática entre o visual da portaria e o número de unidades vazias, ou seja, quanto mais deteriorado o vestíbulo do prédio, mais difícil encontrar locatários, e quanto melhor o hall, maior o contingente de pessoas interessadas em alugar.

  4. Portanto, caro proprietário e locador, se seu imóvel está encalhado há meses ou anos, peça para sua imobiliária verificar se o problema não está na má administração do condomínio. Mas lembre-se de que também há proprietários que envelhecem junto com seus imóveis, ou seja, deixam de investir na sua conservação, não aprovando as reformas necessárias, não comparecendo às assembleias condominiais, reelegendo o mesmo síndico por tempo além do recomendado e assim por diante.

Como já dissemos alhures, um edifício tem seu tempo: nasce adulto, sobrevive por certo prazo, por fim perece. O retorno que proporciona a seu senhorio depende da

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condição de saúde de seu físico: quanto mais bem cuidado, maior será o benefício que propiciará ao atual e futuros proprietários. É o que esperamos dos prédios de Curitiba e de todo o Brasil.

2. Contrato simples resolve

- A legislação inquilinária regulamenta minuciosamente a relação locatícia, deixando pouco espaço ao alvedrio das partes.

Lemos, com satisfação, artigo do advogado Antônio Dilson Pereira, de Curitiba, sob o título “Simplificando e esclarecendo”, em que o articulista combate a prolixidade dos contratos de locação residencial, com argumentos incisivos e convincentes (que vêm ao encontro do que sempre pensamos, aliás).

Pedimos vênia para transcrever o cerne de seu enunciado:

“Afirmo, sem o menor receio de errar, que um contrato de locação de imóvel, além do preâmbulo, onde se pode fazer constar a legislação regente da matéria, não comporta mais do que 12 cláusulas, a saber:
Primeira – identificação das partes no contrato, devidamente qualificadas;

Segunda – indicação do imóvel objeto do negócio; Terceira – natureza da locação, se residencial ou não; Quarta – valor mensal do aluguel e forma de pagamento, se via bancária, administradora de imóveis ou se diretamente com o locador;

Quinta – quais outros encargos correrão por conta do locatário (IPTU, condomínio etc.);

Sexta – forma e periodicidade do reajuste do valor do aluguel;

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Sétima – prazo da locação e a possibilidade ou não de renovação;

Oitava – proibição, se for o caso, de sublocação ou de cessão do contrato;

Nona – garantia do contrato (fiador ou fiadores) e se haverá renúncia do benefício de ordem;

Décima – fixação de multa para o caso de inadimplemento; Décima primeira – hipóteses de rescisão do contrato; Décima segunda – foro para dirimir as pendências decorrentes do contrato.”

Tal recomendação, da maior valia, nos traz à mente a memória de um experiente advogado de Joaçaba/SC (meu pai, Alexandre Muniz de Queiroz), que durante décadas alugou centenas de imóveis, com baixíssimo índice de inadimplência, utilizando-se de contrato de locação com apenas um único parágrafo, dizendo mais ou menos o seguinte:

“Pelo presente instrumento, FULANO... (qualificação e residência), aluga a BELTRANO... (qualificação)... o imóvel de sua propriedade, situado na rua..., apartamento... (ou sala...), para fins residenciais (ou comerciais), pelo prazo de
... meses, iniciando-se nesta data e vencendo-se em .../.../..., pelo aluguel mensal de $... (...), acrescido dos encargos de IPTU, seguro, luz e água comuns (condomínio), com reajuste anual segundo o índice legal permitido, proibida a sublocação e a cessão, ficando eleito o foro do local do imóvel e, no mais, aplicando-se a legislação pertinente à espécie.”

Dispensava-se a figura do fiador.

Como mostra o causídico citado, a legislação inquilinária regulamenta minuciosamente a relação locatícia, deixando pouco espaço ao alvedrio das partes. Tanto isso é verdade que, a rigor, a rigor mesmo, pouca vantagem leva o locador que se vale de um instrumento draconiano de

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contrato sobre outro que celebra uma locação verbal, sem registro por escrito.

Na época em que vivemos, pouca consideração se dá à vontade dos celebrantes. Ninguém mais é servo do que contrata. Qualquer cláusula pode ser e é questionada no foro judicial, com boas probabilidades de sucesso. É ilusório acreditar que o papel garante o direito de quem contrata. Isto só acontece em filmes e em países onde impera o direito anglo-saxão.

3. Senhorio sem propriedade

- Nas relações locatícias, o que vale é o pacto efetivamente realizado entre as partes – inquilino e senhorio – e não, necessariamente, com quem detenha a propriedade sobre o bem.

“O contrato de locação gera uma relação jurídica entre locador e locatário, razão pela qual, em princípio, é dispensável a prova da propriedade do imóvel locado.”

Com esta frase, pinçada da ementa de recurso especial (953.150-SP), o Superior Tribunal de Justiça reafirma, por unanimidade, o princípio de que nas relações locatícias o que vale é o pacto efetivamente realizado entre as partes – inquilino e senhorio – e não, necessariamente, com quem detenha a propriedade sobre o bem. A prevalência do direito pessoal dispensa até mesmo a elaboração de instrumento escrito, valendo o que for acordado verbalmente sob o manto da lei.

No acórdão mencionado, o ministro relator, Arnaldo Esteves Lima, narra que o contrato de locação existente entre as partes fora rescindido por força de sentença proferida em ação de despejo por falta de pagamento, seguida de execução de título extrajudicial contra os fiadores objetivando o recebimento dos créditos locatícios. Nos embargos

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apresentados, os recorrentes aduziram “a ilegitimidade ativa ad causam do recorrido, uma vez que não teria ele comprovado ser proprietário do imóvel locado”, e outras alegações, para tentar desconstituir o débito.

A argumentação não foi convincente porque, no dizer no relator, “o contrato de locação gera uma relação jurídica entre locador e locatário, razão pela qual, em princípio, é dispensável a prova da propriedade do imóvel”, sendo que, “nos termos do art. 60 da Lei 8.245/91, a comprovação da propriedade somente é exigida nas ações de despejo quando fundadas no pedido de retomada do imóvel” para a realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público.

No caso, o recorrido demonstrou sua condição de locador através de cópia do contrato de locação firmado com os recorrentes, que assinaram na condição de fiadores.

A propósito da importância (não da necessidade) da existência de contrato escrito, em voto-vista, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do STJ, que julgou o recurso, destaca que “o contrato de locação [escrito], quando prorrogado, constitui título executivo extrajudicial”, estando em “sintonia com a solução que tem sido dada pelos tribunais do país a questões dessa espécie”. Constata, ainda, que “a demonstração do quantum debeatur [valor devido pelos fiadores], a cargo do exequente do título, somente pode ser elidida com a apresentação de elementos convincentes, não bastando simples alegações de verificação do acerto (ou desacerto) desse cálculo”.

A decisão do STJ tem repercussão prática na vida coti-diana de milhares de locadores de imóveis no Brasil, tendo em vista que alugam imóveis próprios sem figurarem na qualidade de proprietários junto ao registro imobiliário, forma de prova de domínio aceita pelo ordenamento jurídico do país.

Não são apenas milhares, mas dezenas de milhares de relações locatícias que apresentam essas características, sem

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que de tal situação advenham maiores dificuldades para os verdadeiros donos dos imóveis. As exigências...

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