Internacionalização do direito e bens públicos mundiais

AutorJânia Maria Lopes Saldanha - José Luis Bolzan de Morais - Gustavo Oliveira Vieira
CargoDoutora em Direito pela UNISINOS; Professora do Programa de Pós-Graduação da UNISINOS, São Leopoldo, RS, Brasil, e do Curso de Direito da UFSM, Santa Maria, RS, Brasil - Doutor em Direito do Estado (UFSC/Université de Montpellier I). Professor do PPGD/Unisinos, São Leopoldo, RS, Brasil - Doutorando em Direito pelo PPG em Direito da UNISINOS. ...
Páginas454-473
Jânia Maria Lopes Saldanha, José Luis Bolzan de Morais e Gustavo Oliveira Vieira - Internacionalização do ...
454
ISSN Eletrônico 2175-0491
INTERNACIONALIZAÇÃO DO DIREITO
E BENS PÚBLICOS MUNDIAIS1
INTERNATIONALIZATION OF THE LAW AND WORLD PUBLIC GOODS
INTERNACIONALIZACIÓN DEL DERECHO Y BIENES PÚBLICOS MUNDIALES
Jânia Maria Lopes Saldanha2
José Luis Bolzan de Morais3
Gustavo Oliveira Vieira4
“Chacun en à sa part, et tous l’ont tout entier!
Victor Hugo. Les feuilles d’automne, 1831
RESUMO
O artigo trata de uma comunidade mundial de valores, a qual partiria de “bens públicos mundiais” e que
teria como base os direitos humanos. Aborda também a pluralidade de ordens e sistemas jurídicos e suas
interações. A matriz teórica do artigo é Mireille Delmas-Marty. Os autores utilizam-se, ainda, no artigo,
de obra patrocinada pelo PNUD.
PALAVRAS-CHAVE: Comunidade mundial de valores. Bens públicos mundiais. Internacionalização do
Direito.
ABSTRACT
The article deals with a world community of values, which is based on “world public goods” and on human
rights. It also addresses the plurality of orders and legal systems, and the interaction between them.
The theoretical background of the article is based on Mireille Delmas-Marty. The authors also use, in the
article, work sponsored by the UNDP.
KEYWORDS: World community of values. World public goods. Internationalization of Law.
RESUMEN
Este artículo trata de una comunidad mundial de valores, la cual partiría de “bienes públicos mundiales”
y que tendría como base los Derechos Humanos. Aborda también la pluralidad de órdenes y sistemas
jurídicos y sus interacciones. La matriz teórica del artículo es Mireille Delmas-Marty. Los autores utilizan
además en el artículo la obra patrocinada por el PNUD.
PALABRAS CLAVE: Comunidad mundial de valores. Bienesblicos mundiales. Internacionalización del Derecho.
1 Este texto deriva das pesquisas conjuntas realizadas em dois grupos de pesquisa: Teoria Crítica do
Processo e Internacionalização do Direito e Estado e Constituição.
2 Doutora em Direito pela UNISINOS; Professora do Programa de Pós-Graduação da UNISINOS – São
Leopoldo, RS, Brasil – e do Curso de Direito da UFSM – Santa Maria, RS, Brasil.
3 Doutor em Direito do Estado (UFSC/Université de Montpellier I). Professor do PPGD/Unisinos – São
Leopoldo, RS, Brasil.
4 Doutorando em Direito pelo PPG em Direito da UNISINOS. Professor de Direito Internacional do Curso
de Relações Internacional da UFPEL – Pelotas, RS, Brasil.
455
Revista NEJ - Eletrônica, Vol. 18 - n. 3 - p. 454-473 / set-dez 2013
Disponível em: www.univali.br/periodicos
INTRODUÇÃO
A morte de “Bin Laden”, respeitada sua tragicidade e não esquecida sua antijuridicidade nos pós
11 de setembro, é a grande metáfora dos tempos contemporâneos, uma vez representar o paradoxo
do medo que domina as relações globais da atualidade. Medo do outro – visto invariavelmente
como inimigo e suspeito – e medo das catástrofes – indomináveis e, amiúde, ainda imprevisíveis.
As políticas estatais e internacionais impostas em nome da segurança – individual e coletiva – dos
direitos humanos, também respondem grandemente pela violação desses mesmos direitos.
Fixar a visão nessa perspectiva é, entretanto, olhar apenas para a parte sem ver o todo de
um fenômeno absolutamente complexo. Assim, se o Século XX legou a conquista da previsão de
direitos humanos em textos nacionais e internacionais, resta que sua proteção muito longe está
de ser algo cumprida. Ao contrário, as violações reiteradas evidenciam o nível de barbárie que a
humanidade produz e ainda, infelizmente, experimenta. É então preciso civilizar os humanos e
buscar reduzir a tensão implacável entre segurança e liberdade, entre desenvolvimento econômico
e respeito à dignidade humana. No conjunto, a pergunta a ser lançada é se tal tensão instiga ou
freia o surgimento de uma comunidade mundial de valores, desenhada por um destino comum, cuja
base seja a dignidade humana. E cabe perguntar, ainda: quais as circunstâncias que se apresentam
contemporaneamente e quais as condições para a realização de tal projeto?
Como então falar de uma comunidade mundial de valores ante a intolerância e a violência do
tempo presente? E de que maneira compor tal comunidade frente ao amplo mosaico de tradições
            
nacional e o internacional se a pretensão for encontrar a resposta aos questionamentos formulados.
Entretanto, talvez muito menos importante seja superar essa aparente tensão e mais seja encontrar
nos processos transformadores da realidade possíveis respostas para as perguntas. Ultrapassar a
concepção de comunidade internacional associada aos interesses hegemônicos da cultura ocidental
para dar lugar à outra, a de uma comunidade humana mundial, é uma necessidade para romper
com o medo do “outro” e reconhecer nas interdependências planetárias um aceno para a construção
de uma comunidade de destino, embora todos os riscos planetários.
No presente texto, o que se pretende é desenhar algumas ideias acerca da possibilidade de
construir-se uma comunidade mundial de valores tomando-se como ponto de partida os bens públicos
mundiais, na condição de um novo paradigma de convivência humana e em cuja base estão os
direitos humanos, analisados desde a perspectiva cosmopolita (Parte 1).
Muitos atores participam desse cenário plural que é a contemporaneidade, sejam nacionais,
regionais, transnacionais e internacionais, públicos, privados e semipúblicos. Um deles pode ser
considerado protagonista porquanto invariavelmente chamado a reescrever as grandes questões
da humanidade deste Século XXI: a jurisdição, estatal ou não e que atua limitada por regras
processuais. A fecundidade de sua atuação pode ser vista pelo aumento, sempre crescente, dos
chamados que lhe são lançados, fundados na crença de serem os juízes um dos principais atores
desse “mundo comum”.
Nesse quadro, o seu próprio conceito muda em face da atuação cada vez mais alargada
a formar a denominada internacion alização dos juízes. E ao mesmo tempo, o que se vê é o
            

esse período de transi ção por que passa a humanid ade, sobre a capacidade da Just iça e a
efetividade de suas decisões para concretizar os direitos humanos com vistas à emergência de
uma comun idade mun dial de valores, tomando-os como “elos” en tre a pluralidade de or dens e
sistemas jurídicos em interação constante (Parte 2).
Para tanto, a matriz teórica base utilizada será a obra de Mireille Delmas-Marty, autora que tem
empreendido profícuos estudos sobre o processo de internacionalização do direito e a possibilidade
de construção de uma comunidade mundial de valores, em cujo contexto os bens públicos são um
vetor importante de análise. Para dar conta da noção de bens públicos mundiais, os autores utilizam-
se da obra organizada por IngeKaul, Isabelle Grunberg e Marc Stern, fruto de uma publicação mais
ampla patrocinada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT