O direito fundamental ao rendimento social de inserção (re)interpretado pelos orçamentos do Estado Português
Autor | Irene Portela |
Páginas | 98-113 |
O direito fundamental ao rendimento social
de inserção (re)interpretado pelos orçamentos
do Estado português
The fundamental right to social income of insertion (re)
interpreted through Portuguese state budgets
Irene Portela*
Instituto Politécnico do Cavado e do Ave, IPCA, Portugal
1. A materialização dos direitos sociais e a crise econômica
As políticas sociais são em Portugal o que o Orçamento do Estado permi-
te que sejam perante a conjuntura do sistema econômico/financeiro por-
tuguês em crise. O aumento da dívida pública e do déficit público e a
necessidade de cumprir as metas impostas pelo memorando da Troika,
refletem-se no Orçamento do Estado. Os cortes aos benefícios sociais, aos
subsídios e pensões e por outro lado, o aumento das taxas e impostos são
as principais alterações registadas nos Orçamento do Estado destes últimos
quatro anos. Neste enquadramento pode fazer-se a leitura do estrangula-
mento dos direitos sociais fundamentais, mormente, à falta de garantia de
concretização destes direitos e, em consequência, à inexistência dos direi-
tos que sustentam os direitos fundamentais, como o direito à segurança
social e o direito à dignidade humana.
Em particular quando a Constituição determina que o regime destes
direitos sociais deve ser objeto de lei ordinária e garantido pelo Estado,
mas é a própria regulamentação legal que restringe o âmbito de aplicabili-
* Irene Portela é fundadora, diretora e investigadora do Centro de Investigação Jurídica Aplicada. É
professora coordenadora e Diretora do Departamento de Direito do IPCA, Instituto Politécnico do Cavado
e do Ave e dedica os últimos quinze ao estudo e à docência do Direito Público e dos Direito Humanos. Tem
vários artigos científicos publicados em inglês e português. Tem ainda duas obras em francês sua língua
materna, sobre ética e democracia. No presente exerce as funções de Provedora dos Estudantes do IPCA.
Direito, Estado e Sociedade n.52 p. 98 a 113 jan/jun 2018
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Direito, Estado e Sociedade n. 52 jan/jun 2018
dade das garantias constitucionais, ofendendo de forma direta os direitos
dos cidadãos previstos na lei, criando questões de retrocesso social graves,
mas que o Estado implementa, legitimado pela crise. O caso que nos pren-
de tem a ver com as vicissitudes e dificuldades do mecanismo do Rendi-
mento Social de Inserção (RSI)1 criado pelo Estado em 19962 no sentido
de dar cumprimento ao seu dever de, nos termos do texto constitucional,
de assegurar a todos os Portugueses o seu direito à segurança social. Da
análise legal da criação do subsidio não contributivo da segurança social,
que inicialmente se denominou Rendimento Mínimo Garantido e poste-
riormente se passou a denominar Rendimento Social de Inserção, dos pro-
blemas que na prática a sua aplicação levantou junto dos beneficiários/ou
melhor dos “não beneficiários”, e da dificuldade de análise dos critérios na
atribuição dos mesmos ou do mesmo, e finalmente da nova forma como o
Estado passou a entender “o beneficiário dos subsídios”, resultam proble-
mas jurídicos graves. E, portanto, nem envolvidos dezoito anos sobre esta
questão se encontraram soluções. A conjuntura de crise vivida nos nossos
dias dá pleno reforço ao circunstancialismo da estenose social e aos registos
cada vez mais elevados dos números da pobreza. A questão é que não se
registra a indiferença.
2. Do rendimento mínimo garantido
Nos termos do artigo 63º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa
(CRP),3 todos os portugueses têm o direito à Segurança Social, pelo que
o Estado deve legislar no sentido de assegurar um rendimento mínimo
garantido ou um rendimento social de inserção que represente a concreti-
zação do direito de todos os portugueses à segurança social. Daqui deriva
para o Estado Português a obrigação de organizar um sistema de segurança
social em ordem a proteger “os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viu-
vez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações
de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o
trabalho”. Perante o desafio colocado pela União Europeia a Portugal na
1 RSI (Rendimento Social de Inserção).
2 RMG (Rendimento Mínimo Garantido).
3 CRP (Constituição da República Portuguesa).
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