Direito, lógica, argumentação e retórica em Aristóteles e Wittgenstein: a solução da aporia hermenêutico-decisória no discurso como prakt-r do mythos e no uso da linguagem como rhetor do ergon

AutorDaniel Oitaven Pamponet Miguel
Páginas107-131
DIREITO, LÓGICA, ARGUMENTAÇÃO
E RETÓRICA EM ARISTÓTELES
E WITTGENSTEIN:
a solução da aporia
hermenêutico-decisória no discurso
como Prakt-r do Mythos e no uso da
linguagem como Rhetor do Ergon
Daniel Oitaven Pamponet Miguel
O presente trabalho objetiva estudar a influência dos pensamentos de
Aristóteles e Wittgenstein na filosofia do Direito e na hermenêutica
jurídica, em busca de um modelo interpretativo inspirado nos refe-
ridos filósofos e idôneo a garantir a união dos ideais de justiça, obje-
tividade e equidade democrática. Inicialmente, expõe-se a concepção
de linguagem aristotélica, bem como o projeto do filósofo de expres-
sar o pensamento em uma estrutura linguística formal, desiderato
que culminou na decisiva influência do raciocínio demonstrativo na
jusfilosofia. Em seguida, aborda-se a relação entre lógica e lingua-
gem na teoria da figuração de Wittgenstein como último exemplo da
tradição linguística platônico-aristotélica, bem como a influência do
Tractatus na Teoria Pura do Direito. Após, retornamos a Wittgenstein,
agora com sua filosofia da linguagem ordinária e sua utilização como
matriz teórica por Hart, que acaba incorrendo em problema her-
menêutico semelhante ao do momento ametódico kelseniano. Mais
à frente, como reação à insuficiência hermenêutica do discricioná-
rio modelo normativista, apresentamos o resgate dos entimemas no
Direito por Viehweg e Perelman, inspirados na argumentação retó-
rica aristotélica. Chegamos a momento decisivo do escrito quando
abordamos a possibilidade de uma relação entre a retórica aristotéli-
ca e as Investigações Filosóficas do segundo Wittgenstein e apontamos,
com Kvond, a reunificação das atividades discursiva, cognoscitiva e
prática pela filosofia da linguagem ordinária. Subsiste, no entanto, a
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insatisfação com os modelos jusfilosóficos originados com base em
Aristóteles e nas duas filosofias de Wittgenstein, visto que o tipo de
consenso proposto pela tópica e pela retórica não afasta a discricio-
nariedade do julgador, estimulando, ao contrário, a colonização do
mundo da vida (Habermas). Como superação dessa aporia, concluí-
mos com a tese jusfilosófica de Aulis Aarnio, que reúne como matri-
zes teóricas os pensamentos de Perelman, Wittgenstein e Habermas,
a fim de solucionar a insuficiência jurídico-hermenêutico-decisória
dos modelos anteriores baseados em Aristóteles e Wittgenstein me-
diante uma dupla exigência de racionalidade formal e material, sem
abandonar o pensamento filosófico de ambos os autores.
1 Quadro geral da influência dos pensamentos de Aristóteles e
Wittgenstein na filosofia do Direito e na hermenêutica jurídica
Aristóteles e Wittgenstein foram autores que, cada qual à sua maneira,
revolucionaram o papel da linguagem como expressividade do pensamento
lógico. De um lado, Aristóteles, em sua busca por uma regularidade do pen-
samento, desenvolveu estudos lógicos capazes de organizá-los com base em
estruturas formais. O filósofo considerou que a cada tipo de argumentação
correspondia um tipo diferente de relações expressas em linguagem, cha-
madas de silogismo, dentre os quais o apodíctico (científico), de influência
decisiva no pensamento racionalista e no que entendemos contemporanea-
mente por lógica formal (analítica, na terminologia aristotélica). De outro
lado, Wittgenstein (1994), na primeira fase de seu pensamento, considera o
mundo como algo formado por objetos que possuem apenas propriedades
formais, de forma a encarar a lógica como elemento a priori que determina as
condições de significabilidade da linguagem, reflexo predicativo do mundo.
Essa concepção wittgensteiniana é o principal expoente da corrente filosófi-
ca de pensamento conhecida como Neopositivismo Lógico, albergada pelos
membros do chamado Círculo de Viena.
A teoria da afiguração como correspondência estrutural entre frase e
estado de coisas de Wittgenstein é justamente a última forma do tradicional
reconhecimento Ocidental de uma isomorfia entre realidade e linguagem,
ou seja, a ideia de que a palavra pode designar todos os tipos de objetos
que tenham uma essência comum (conceito). Essa concepção de linguagem
originou-se com Platão e foi disseminada na tradição a partir dos desenvolvi-
mentos realizados por Aristóteles, que elabora uma teoria da significação tida
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