Direito processual e pluralismo. grupos desfavorecidos de pessoas e uma abordagem ao processo judicial derivado do esbulho possessório e do deslocamento forçado. como resolver disputas privadas (que não envolvem o estado) sobre a terra que envolvem membros de grupos em desvantagem, a exemplo dos indígenas, de uma forma justa e garantindo o devido processo legal? relatório geral

AutorAlan Uzelac
CargoProfessor da Universidade de Zagreb, Croácia, e diretor do Departamento de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da mesma Universidade. Doutor em Direito e Ciências Sociais pela Universidade de Zagreb
Páginas2-52
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP.
Rio de Janeiro. Ano 11. Volume 18. Número 2. Maio a Agosto de 2017
Periódico Quadrimestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. ISSN 1982-7636. pp. 02-52
www.redp.uerj.br
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DIREITO PROCESSUAL E PLURALISMO. GRUPOS DESFAVORECIDOS DE
PESSOAS E UMA ABORDAGEM AO PROCESSO JUDICIAL DERIVADO DO
ESBULHO POSSESSÓRIO E DO DESLOCAMENTO FORÇADO. COMO
RESOLVER DISPUTAS PRIVADAS (QUE NÃO ENVOLVEM O ESTADO)
SOBRE A TERRA QUE ENVOLVEM MEMBROS DE GRUPOS EM
DESVANTAGEM, A EXEMPLO DOS INDÍGENAS, DE UMA FORMA JUSTA E
GARANTINDO O DEVIDO PROCESSO LEGAL? RELATÓRIO GERAL
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PROCEDURAL LAW AND PLURALISM. DISADVANTAGED GROUPS OF PEOPLE
AND AN APPROACH TO LITIGATION STEMMING FROM LAND
DISPOSSESSION AND FORCED DISPLACEMENT. HOW TO SETTLE PRIVATE
(NON-STATE) LAND DISPUTES INVOLVING MEMBERS OF INDIGENOUS AND
OTHER DISADVANTAGED GROUPS IN A JUST WAY WHILE GUARANTEEING
DUE PROCESS OF LAW? GENERAL REPORT
Alan Uzelac
Professor da Universidade de Zagreb, Croácia, e diretor do
Departamento de Direito Processual Civil da Faculdade de
Direito da mesma Universidade. Doutor em Direito e Ciências
Sociais pela Universidade de Zagreb. Investigador convidado
de numerosas universidades a nível mundial. Membro ativo da
Associação Internacional de Direito Processual e da
Associação Alemã para o Direito Processual Internacional.
auzelac@gmail.com
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Artigo recebido em 26/04/2017, sob dispensa de revisão.
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Publicado originalmente como: UZELAC, Alan. Procedural law and pluralism. Disadvantaged groups of
people and an approach to litigation stemming from land dispossession and forced displacement. How to settle
private (non-state) lan d disputes involving members of indigenous and other disadvanta ged groups in a just
way while guaranteeing due process of law? General Report. Internacional Association of Civil Pro cedure
(IAPL). Instituto Colombiano de Derecho Procesal. Universidad Externado de Colombia. Colloquium
“Procedural Law and Reconciliation” / "Reconciliación y Derecho P rocesal". Bogotá, Colombia: 5 a 7 de
outubro de 2016. BEJARANO, Ramiro Guz mán; CRUZ, Pablo Moreno; MEJÍA, Marcela Rodríguez.
(Editores). Traduzido por Pedro Gomes de Queiroz. Doutorando e mestre em Direito Processual pela UERJ.
Especialista em Direito processual Civil pela PUC-Rio. Bacharel em Direito pela PUC-Rio. Advogado.
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RESUMO: O autor defende o estabelecimento, pela lei, de órgãos jurisdicionais e de
procedimentos especiais para o processo e julgamento de demandas judiciais derivadas do
esbulho possessório e do deslocamento forçado sofrido por povos indígenas e por outros
grupos desfavorecidos, considerando as especificidades legais, culturais e linguísticas desses
casos, como forma de garantir o devido processo legal e uma decisão justa.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Processual, pluralismo, esbulho possessório, deslocamento
forçado, indígenas, grupos desfavorecidos, estruturas especiais das cortes, procedimentos
especiais.
ABSTRACT: The author advocates the establishment, by the law, of special courts and
procedures for the prosecution and adjudication of legal claims arising from land
dispossession and forced displacement suffered by indigenous peoples and other
disadvantaged groups, considering the legal, cultural and linguistic specificities of these
cases, as a way to guarantee the due process of law and a fair decision.
KEYWORDS: Procedural Law, pluralism, land dispossession, forced displacement,
indigenous peoples, disadvantaged groups, special court structures, special proceedings.
SUMÁRIO: I. Introdução; II. Escopo e metodologia da pesquisa; Grupos desfavorecidos e
indígenas incluídos nesse relatório e os antecedentes históricos e legais do esbulho
possessório e do deslocamento forçado praticados contra eles; a. Observações gerais; b.
Austrália; c. Noruega; d. África do Sul; e. Brasil; f. Argentina; g. Peru; h. Rússia; i. Itália; j.
Grupos desfavorecidos e indígenas em outras jurisdições não cobertas por este relatório; IV.
Tentativas de reverter ou de mitigar os efeitos dos esbulhos possessórios e dos
deslocamentos forçados: legislação e políticas que reconhecem a injustiça e se destinam a
saná-la; a. Tipologia geral de situações relacionadas ao esbulho possessório e ao
deslocamento forçado; Políticas direcionadas ao esbulho possessório nas jurisdições
analisadas. V. O processo judicial como uma ferramenta para corrigir injustiças do passado
em relação ao esbulho possessório e ao deslocamento forçado; a. Cortes civis e suas decisões
como catalisadores de mudança; b. Estruturas de cortes e procedimentos especiais; c. Direito
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internacional e tribunais internacionais e seu impacto nos processos judiciais relacionados
ao direito à terra dos povos indígenas e de outros grupos desfavorecidos; d. Processos civis
regulares sobre esbulho possessório e expulsão de grupos desfavorecidos; VI. Conclusões:
o papel do processo judicial em resolver disputas complexas sobre a terra, e como aumentar
a efetividade e a acessibilidade aos processos judiciais; Anexo 1: Questionário para os
relatores nacionais; Anexo 2: Literatura e fontes.
I. Introdução
Os conflitos e as injustiças do passado formaram as controvérsias presentes de muitos
países. As nações-Estado que experimentaram um passado colonial, e as sociedades pós-
guerra nas quais um grande grupo de pessoas experimentou um período traumático de
privação coletiva, esbulho possessório, expulsões e deslocamento, ainda enfrentam um
difícil desafio - o desfio da restauração coletiva e individual da paz e da justiça. O desafio
maior é alcançar estabilidade através de um processo de reconciliação, mas apesar de poder
haver um consenso político sobre o objetivo geral, a verdadeira questão reside na seleção de
ferramentas apropriadas e de métodos para alcançá-lo.
Pode o Direito Processual contribuir para os objetivos de conciliação? O processo
legal, a exemplo do processo judicial, que tem sido tradicionalmente usado como método
padrão e subsidiário para resolver as disputas individuais, é capaz de enfrentar, de forma
bem sucedida, problemas difíceis decorrentes de uma história sistemática e persistente de
discriminação e de opressão que agora precisa ser remediada e neutralizada? Os membros
dos grupos desfavorecidos, como os povos indígenas cujos direitos básicos à posse de suas
terras nativas e casas foram sistematicamente negados, podem alcançar proteção legal
efetiva através dos procedimentos convencionais das cortes? Deveriam os meios
convencionais de litigância ser suplementados por estruturas institucionais especiais,
procedimentos especiais ou por regras especiais adaptados aos requisitos especiais dos
litígios decorrentes da deposição de terras e do deslocamento forçado de grandes grupos de
pessoas? Essas difíceis questões são a razão e o tema essencial deste relatório geral.
A tarefa atribuída aos relatores nacionais procurou abordar um território não
mapeado do processo civil comparado. Enquanto o processo coletivo e os procedimentos

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