Direito ao Sigilo da Correspondência e das Comunicações Telegráficas, de Dados e das Comunicações Telefônicas. A Questão do Correio Eletrônico

AutorArion Sayão Romita
Ocupação do AutorAcademia Nacional do Direito do Trabalho
Páginas342-349

Page 342

A Constituição da República, no art. 5º, inciso XII, declara que "é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal".

O Código Penal (art. 151) tipifica o delito de violação do sigilo postal, telegráfico ou telefônico. A Lei n. 4.117, de 1962 (Código Nacional de Telecomunicações), nos arts. 56 e 58, prevê o crime de violação de telecomunicações. A Lei n. 6.538, de 1978, que dispõe sobre os serviços postais, prevê hipóteses às quais não se aplica o sigilo postal e, no art. 4º, prevê os crimes de violação de correspondência. A Lei n. 9.296, de 1996, regula a interceptação telefônica, para a produção de prova no processo penal.

Sem dúvida, os preceitos constitucionais e legais acima referidos encontram oportunidades múltiplas de aplicação no âmbito das relações de trabalho subordinado. O crime de violação da correspondência e das comunicações pode ser cometido tanto pelo empregador contra o empregado como por este contra o primeiro.

Interessa-nos aqui, particularmente, a proteção do sigilo da correspondência e das comunicações do empregado, em hora e local de expediente, vale dizer, no período em que o trabalhador se situa em regime de subordinação jurídica ao empregador. É óbvio que os mesmos bens jurídicos, no ambiente privado do trabalhador, no recesso de seu lar, em suas relações particulares (estranhas ao perímetro da relação de trabalho) escapam ao objeto do estudo. Aqui, cabe discutir, apenas, os aspectos pertinentes ao sigilo da correspondência e das comunicações relacionados com o cumprimento das obrigações contratuais, no arco das ações abrangidas pela execução do contrato de trabalho.

A própria previsão, por parte do preceito constitucional em foco (art. 5º, inciso XII), do direito aqui considerado - sigilo da correspondência e

Page 343

das comunicações - demonstra que estamos diante de tema distinto do complexo jurídico geral informado pela proteção à intimidade (art. 5º, inciso X), embora, em termos amplos, possa considerar-se a proteção ao sigilo da correspondência e das comunicações como desdobramento ou projeção do direito mais amplo que protege a intimidade da pessoa. A intimidade, porém, apresenta características que a distinguem dos aspectos particulares do sigilo da correspondência e das comunicações: enquanto a primeira diz respeito ao íntimo da pessoa com a extensão ao lar, o segundo alude a fatos específicos, cuja divulgação ou cujo conhecimento por estranhos o interessado deseja evitar.

A violação do direito ao segredo caracteriza-se tanto pela intromissão quanto pela divulgação ou uso indevido de assunto da vida privada de alguém, por parte de uma pessoa, que pode agir em proveito próprio ou alheio. O direito ao segredo representa limitação à liberdade alheia, pois ninguém tem o direito de devassar o âmago secreto da pessoa, sabe-se lá com que interesse. O direito ao segredo constitui modalidade do direito geral de resguardo, protegendo aspectos da vida da pessoa que quer evitar o acesso de outrem a seus assuntos particulares. Ora, o acesso a tais assuntos pode ser proporcionado pela violação da correspondência e das comunicações, daí a necessidade de sancionar juridicamente a ofensa ao direito fundamental de sigilo. O ordenamento jurídico cerca de garantias o segredo que interessa à pessoa (física ou jurídica, pública ou privada), com o objetivo de impedir que outrem o atinja, quer para obter indesejado conhecimento quer para divulgá-lo à revelia do interessado.

Vários são os campos cobertos pela garantia de inviolabilidade do sigilo: epistolar, bancário, telefônico, profissional, de Estado, militar, telemático, de justiça, etc.

A violação do segredo em geral - não especificamente da correspondência e das comunicações - assume particular relevo no âmbito da relação de trabalho subordinado, quando cometida pelo empregado, a ponto de constituir falta grave, que autoriza o empregador a resolver o contrato de trabalho, sem ônus. Nos termos do art. 482, alínea g, da CLT, constitui justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador a violação de segredo da empresa. Violação de segredo da empresa é, nas palavras de José Augusto Rodrigues Pinto e Rodolfo Pamplona Filho, "a divulgação de um ato, fato ou coisa que, sendo referente à produção ou ao negócio, e do conhecimento de poucos, não deve, pela vontade de seus detentores, ser tornada pública, sem grave risco de prejuízo para o empregador"1.

Page 344

O fundamento desta justa causa repousa no dever de fidelidade, que o empregado assume ao celebrar o contrato de trabalho. E, no dizer de Antonio Lamarca, "a proibição de revelação ou divulgação de segredo se instala na boa-fé"2. Esta é uma noção geral que impregna todo o instituto do contrato (abrange, portanto, o contrato de trabalho), valendo lembrar que, nos termos do art. 422 do Código Civil, de 2002, "os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé". Convém ainda uma vez recordar que dois são os princípios que regem a execução do contato de trabalho: o da confiança recíproca e o da execução de boa-fé. Ora, o empregado que viola segredo da empresa desmerece a confiança que nele deposita o empregador e, além disso, despreza a boa-fé contratual. Há quem afirme que o dever de segredo, que corre ao empregado na execução do contrato de trabalho, deriva dos deveres de cooperação e colaboração3.

De dois tipos podem ser os segredos da empresa, consoante a observação de Wagner D. Giglio: "segredos de fábrica ou de produção e segredos do negócio: aqueles se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT