Direitos humanos, uma visão antropológica

AutorCarlos Aurélio Mota de Souza
Páginas205-226
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DIREITOS HUMANOS, UMA
VISÃO ANTROPOLÓGICA
5.1 INTRODUÇÃO
Em certa Faculdade de Medicina, um professor propôs a seus alunos
um caso a resolver. Pedia-lhes que indicassem o conselho a dar a uma
senhora grávida do quinto f‌ilho, nas seguintes circunstâncias.
O marido sofria de síf‌ilis, ela de tuberculose; seu primeiro f‌i-
lho nascera cego, o segundo morrera, o terceiro nascera surdo e o
quarto era tuberculoso. Ela estava pensando seriamente em não ter
o quinto f‌ilho. Que caminho deveria ela tomar? Com base nos da-
dos apresentados, a maioria dos alunos opinou que o aborto seria
a melhor alternativa.
O professor então respondeu aos estudantes: Se vocês disseram
sim à ideia do aborto, acabaram de matar o grande compositor Ludwig von
Beethoven, que viveu cinquenta e sete anos (1770-1827). Quando tinha
aproximadamente trinta anos, começou a f‌icar surdo e morreu sem poder
ouvir suas obras mais amadurecidas, que são de alto valor musical (Nona
Sinfonia, Missa Solene, os últimos Quartetos para cordas).
De fato, Beethoven foi considerado um menino-prodígio, e já
aos catorze anos era organista assistente da Capela do Eleitor de
Bonn, na Alemanha. Então, a pergunta espontânea que se coloca
para todos é também esta: onde estaríamos se nossos pais tivessem
pensado em nos abortar? Os direitos do homem começam aí, nos
primórdios da vida.
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206 » direitos humanos, urgente!
Este relato nos mostra que a questão dos direitos humanos
envolve seriamente o problema da vida, e que não se podem fa-
zer experiências em relação à vida humana, porque todas as
pessoas, mesmo antes de nascer com vida, têm, por natureza, a sua
dignidade e grandeza pré-ordenadas ontologicamente. Mas que
natureza é esta, que nos distingue dos outros animais e nos confere
uma dignidade única e especial?
O homem apresenta três inclinações básicas. Como substân-
cia corporal, ele é constituído de matéria orgânica, não vegetal
ou mineral, mas de natureza animal, com a diferença específ‌ica
de sermos racionais. Como todo ser animal, sua primeira grande
inclinação é conservar a própria existência, sua vida. Não há pessoa,
mentalmente sadia, que pense em suprimir a própria vida. O sui-
cídio será sempre um desespero, uma fraqueza psíquica, contrário
à própria natureza.
A primeira tendência natural do homem é, pois, manter-se
como um ser completo, atendendo ao princípio da unidade corporal
e psíquica. Essa integridade pressupõe a continuidade da vida. A
mutilação do próprio ser, não só do corpo, mas também do psíqui-
co, cortaria sua relação com o futuro, com a história de si próprio
e da humanidade.
Portanto, será bom para o homem procurar comida, casa, ves-
tuário; e será mau o homicídio, a tortura, o aborto, a eutanásia, a
pena de morte, o duelo, o suicídio, a greve de fome, experiências
com embriões, mutilações, esterilizações etc.
A segunda tendência do homem é a inclinação natural de vi-
ver em sociedade, uma vocação social. Todos os animais vivem em
coletividade e o homem não foge à regra, daí ser, para Aristóteles,
“um animal social”.
Dentro disso, será bom para o homem manter esta sociabilidade,
formar família151 e educar os f‌ilhos, porque esta é a primeira forma
de sociedade. Esta socialidade gera laços fortes e isso é conatural ao
151 Sobre o assunto, ver capítulo ˜Educação do homem pela família”.

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