Direitos sociais

AutorEduardo dos Santos
Páginas375-391
CAPÍTULO XI
DIREITOS SOCIAIS
1. CONCEITO
Os direitos sociais são direitos fundamentais de segunda geração que buscam pro-
mover a pessoa humana e suas condições de vida digna, englobando desde uma proteção
das liberdades sociais e dos próprios direitos sociais em face de quaisquer supressões das
condições de vida digna do ser humano (status negativo) até e, sobretudo, a promoção dessas
condições de vida digna e do pleno desenvolvimento da personalidade de cada homem, de
acordo com sua própria autonomia de vontade (status positivo).
2. NOTAS HISTÓRICAS
O reconhecimento dos direitos sociais está ligado ao constitucionalismo social. Vale
lembrar que o constitucionalismo social, surge especialmente a partir das mudanças políticas
provocadas pela Primeira Guerra Mundial, pela crise econômica do início do séc. XX, pelo
agravamento das desigualdades sociais e pela reif‌icação da pessoa humana no ambiente
laboral, transformada em verdadeiro objeto das empresas ao longo de todo o séc. XIX, su-
portando altas cargas de trabalho, sem qualquer direito ou cuidado do Estado.1
Nesse cenário, surgem as primeiras Constituições a reconhecerem os direitos sociais da
pessoa humana – Constituição do México, de 1917, e Constituição da Alemanha, de 1919 –,
fundadas na emergência do Estado Social de Direito, caracterizado não apenas por respeitar
as liberdades individuais (Estado Liberal), mas, também, pela consagração de direitos sociais,
econômicos e cultuais de natureza individual e coletiva, a exigirem, do próprio Estado, pres-
tações de cunho material e ações que busquem equalizar as oportunidades entre as pessoas,
possibilitando a todos o acesso às condições materiais mínimas para se ter uma vida digna.2
A Constituição Mexicana, de 1917, foi a primeira a positivar os direitos trabalhista
no rol de direitos fundamentais da pessoa humana, consagrando a limitação da jornada de
trabalho, salário mínimo, idade mínima de admissão laboral, previdência social, proteção
à maternidade a ao salário etc. Já a Constituição de Weimar, de 1919, Constituição da Pri-
meira República Alemã, consagrou entre os direitos sociais, além dos direitos fundamentais do
trabalhador, direitos econômicos e sociais como educação e seguridade social, sedimentando a
complementariedade entre os direitos fundamentais de liberdade (de primeira geração) e
os direitos fundamentais de igualdade (de segunda geração).
No Brasil, a Constituição brasileira de 1934, com forte inspiração na Constituição de
Weimar, foi a primeira a reconhecer os direitos sociais, fazendo referência expressa, dentre
outros, aos direitos à saúde, à educação, à cultura e, especialmente, consagrando um extenso
rol de direitos do trabalhador.
Já a Constituição brasileira de 1988 consagrou um verdadeiro (sub)sistema de direitos
fundamentais sociais, estabelecendo entre seus objetivos fundamentais quatro mandamen-
tos de natureza social (art. 3º, I a IV), reconhecendo em seu art. 6º diversos direitos sociais
1. QUEIROZ, Cristina. Direitos Fundamentais Sociais. Coimbra: Coimbra, 2006.
2. HÄBERLE, Peter. Direitos Fundamentais no Estado Prestacional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2019.
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básicos, em seus arts. 7º a 11 diversos direitos dos trabalhadores e regulamentando boa parte
dos direitos sociais em seu Título VIII – Da Ordem Social.
3. CARACTERÍSTICAS
Para além das características apresentadas na Teoria Geral dos Direitos Fundamentais,
os direitos fundamentais sociais ainda possuem as seguintes:
i) gradatividade (ou gradualidade): por uma questão prática, levando em consideração
a realidade, os direitos sociais não podem ser implementados de forma instantânea
(não se constroem escolas ou hospitais do dia para noite, por exemplo), logo, sua
implementação é gradativa, buscando sempre ampliar e melhorar sua realização.
ii) dependência f‌inanceira do orçamento público: também levando em conta a realidade,
os direitos sociais para serem implementados exigem previsão orçamentária, vez
que eles possuem um custo,3 não sendo possível realizá-los sem verba (a construção
de um hospital ou de uma escola custa dinheiro, por exemplo).
iii) tendencial liberdade de def‌inição pelo legislador das políticas públicas a serem
adotadas: tanto os legisladores, como o chefe do poder executivo, possuem uma
margem de liberdade de escolha das políticas públicas que pretendem adotar na rea-
lização dos direitos sociais, contudo, essa margem de liberdade encontra limites nas
normas constitucionais programáticas (normas que estabelecem deveres mínimos
para os governantes em relação aos direitos sociais) e na razoabilidade das medidas
adotadas.
iv) insuscetibilidade de controle jurisdicional dos programas políticos-legislativos: em
regra, os programas políticos-legislativos não podem ser controlados pelo poder
judiciário, pois são os nossos representantes políticos que gozam da legitimidade
democrática para fazerem as escolhas de onde alocar os recursos f‌inanceiros do Es-
tado, contudo, se essas escolhas contrariarem as normas constitucionais ou ferirem
o princípio da razoabilidade, elas poderão ser invalidadas pelo judiciário, como,
por exemplo, se for feita destinação de verba para saúde ou educação abaixo dos
mínimos previstos na Constituição.
v) são normas constitucionais programáticas: são normas que impõe programas ao
Estado e à sociedade voltados ao bem-estar social, que impõe verdadeiras políticas
públicas constitucionais, objetivos fundamentais a serem atingidos. Em face da
força normativa e da supremacia da Constituição, essas normas devem ser imple-
mentadas, sendo elevadas a um nível satisfatório de concretização, vez que “elas não
representam meras recomendações (conselhos) ou preceitos morais com ef‌icácia
ético-política meramente diretiva, mas constituem Direito diretamente aplicável”.4
vi) são direitos subjetivos prima facie: a doutrina majoritária, partindo das lições de
Robert Alexy,5 af‌irma que, em razão do fato dos direitos fundamentais sociais estru-
turarem-se normativamente como princípios jurídicos, eles são direitos subjetivos
prima facie, vez que seus mandamentos são cambiantes de acordo com a realidade
fático-jurídica que se lhes apresente, devendo ser aplicados no maior grau possível
3. HOLMES, Stephen; SUNSTEIN, Cass R. O custo dos direitos. São Paulo: Martins Fontes, 2019.
4. KRELL, Andréas. Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha. Porto Alegre: SAFE, 2002. p. 20.
5. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 103-106.
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