A ditadura uruguaia e o direito à memória e à verdade

AutorAdriana Silva Maillart/Fábio Antunes Possato
Ocupação do AutorDoutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina/Especialista em Direito Processual Penal pela Escola Paulista da Magistratura e mestre da linha de pesquisa 'Justiça e [o paradigma da] eficiência' do programa de Mestrado em Direito da Universidade Nove de Julho (UNINOVE)
Páginas47-67
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A DITADURA URUGUAIA E O
DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE1
adRiana SilVa maillaRt2
fábio antuneS PoSSato3
Resumo
O presente estudo tem como objetivo analisar as particularidades
da ditadura uruguaia, analisando seu contexto histórico, as marcas
deste período na ideia de direito à memória e à verdade, mas sobre-
tudo, o direito de viver esta memória e verdade. O texto, utilizan-
do-se de uma pesquisa bibliográca e documental, perpassa pelas
complexidades de sua lei de anistia e o papel das duas Comissões de
Investigação e Paz, concluindo que o Uruguai atualmente passa por
um novo momento histórico em que os perseguidos e prisioneiros
políticos da época ditatorial, assumem o poder, o que proporciona
1 O presente artigo é fruto dos trabalhos desenvolvidos pelo Grupo de Pesquisa em Me-
mória, Verdade e Justiça de Transição: análise das Lutas Políticas no Brasil de 1964 a 1985,
registrado no CNPQ, é formado por professores e estudantes da área jurídica e outras ans
da UNINOVE, PUC/SP e USP e Coordenado pelo Prof. Dr. Vladmir Oliveira da Silveira e
pela Professora Dra. Samantha Ribeiro Meyer-Pug.
2 Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Coordenado-
ra do Curso de Direito, professora e pesquisadora do Programa de Mestrado em Direito da
Universidade Nove de Julho (UNINOVE). E-mail: adrissilva@gmail.com
3 Especialista em Direito Processual Penal pela Escola Paulista da Magistratura e mestre da
linha de pesquisa “Justiça e [o paradigma da] eciência” do programa de Mestrado em Direito
da Universidade Nove de Julho (UNINOVE). E-mail: fabiopossato@policiamilitar.sp.gov.br
Experiências de justiça de transição: aspectos relevantes
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ao povo uruguaio um maior direito de viver a memória e a justiça,
mesmo que ainda ocorram situações veladas, em que se prefere anis-
tiar do que recomeçar um conito.
Palavras-chave: Ditadura Uruguaia; direito à verdade; justiça de
transição.
1 Contexto histórico da ditadura
uruguaia e seus antecedentes
A ditadura cívico-militar uruguaia teve início com o Golpe de Es-
tado ocorrido em 27 de junho de 1973 e foi diferenciada do restante da
América Latina, pois foi imposta pelo próprio presidente civil. A ditadura
perdurou até 28 de fevereiro de 1985 e este período de quase 12 anos foi
marcado pela proibição da atuação de partidos políticos, por considerar ile-
gais os sindicatos e meios de imprensa e por perseguição, aprisionamento e
assassinato de opositores ao regime opressivo4.
Entretanto, suas causas advêm da década de 1950, mais precisamen-
te do ano de 1954, quando uma crise econômica afetou também as ins-
tituições políticas do país que até então era conhecido como a Suíça da
América. Esta crise desencadeou assim, na década de 1960, um processo
4 Horacio Centanino (La dictadura (1973-1985). Reexiones y relatos. Montevideo: Lulu
Author, 2011, p. 23-24) explica que: “los ciudadanos fueran clasicados de acuerdo a sus
antecedentes políticos en categorías A, B y C. Los acreedores a la A eran los individuos que
habían pasado sin mácula la indagación gubernamental de su pasado. Los que tenían una
B estaban en una especie de limbo; habían tal vez rmado en el pasado una proclama de
apoyo a la revolución cubana o de adhesión a cualquier otra cosa considerada inconveniente
y el hecho había bastado para que en sus prontuarios constara una nota de advertencia.
Los de la categoría C estaban condenados al ostracismo en su propio país. Eran enemigos
irredimibles y objetos por tanto de vigilancia y seguimientos permanentes, tanto ellos
como sus familiares y allegados; no podían desempeñar cargos públicos, obviamente, pero
tampoco le resultaba fácil realizar tarea alguna. Muchos de ellos terminaron procesados
u optaron por emigrar, si es que lograran obtener un pasaporte. El jefe de la Dirección
Nacional de Información e Inteligencia Policial del Uruguay (DNII), Víctor Castiglioni,
envió en 1981 un documento al Ministerio del Interior en que informa haber interrogado
e inventariado a más de trescientas mil personas para controlar antecedentes y controlar la
liación político-ideológica de los funcionarios públicos, lo cual delata la nísima retícula
represiva del régimen.

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