Do concurso de pessoas

AutorFrancisco Dirceu Barros - Antônio Fernando Cintra
Ocupação do AutorMestre em Direito, Promotor de Justiça Criminal e Eleitoral, Doutrinador e especialista em Direito Penal e Processo Penal - Advogado criminalista há vinte e nove anos. Procurador do Estado, pós-graduado em Direito Público, escritor com sete o livros lançados
Páginas130-149

Page 130

Art. 29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

· Vide arts. 106, I e 117, § 1º, CP.

· Vide arts. 77, I, 189, 270 e 580, CPP.

· Vide art. 75, Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor).

· Vide art. 19, Lei 9.263/1996 (Planejamento Familiar).

§ 1º Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço.

· Vide art. 19, Lei 9.263/1996 (Planejamento Familiar).

§ 2º Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até a metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.

· Vide art. 19, Lei 9.263/1996 (Planejamento Familiar).

1. Explicação didática e exemplos didáticos

1.1. Noções didáticas

Quando várias pessoas concorrem para a realização da infração penal, fala-se em codelinquência, concurso de agentes, coautoria, participação, coparticipação ou concurso de delinquência. O Código Penal emprega a expressão "concurso de pessoas" (art. 29).

O concurso de pessoas, segundo Mirabete e Noronha, é "a ciente e voluntária participação de duas ou mais pessoas na mesma infração penal".

1.2. Tipos de concursos

  1. Concurso eventual ou monossubjetivo. Quando o delito pode ser praticado por uma só pessoa e é praticado por várias, fala-se em concurso eventual, porque, eventualmente, o crime é praticado por mais de uma pessoa.

    Exemplo didático:

    O homicídio pode ser praticado por uma só pessoa, e eventualmente pode ser praticado por várias.

    Page 131

    É justamente neste caso de concurso eventual que é aplicado o princípio segundo o qual quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas deste na medida de sua culpabilidade.

  2. Concurso necessário ou plurissubjetivo. Existem alguns casos em que o crime não pode ser cometido por uma só pessoa, ou seja, a pluralidade de pessoas é indispensável para a prática da infração penal. Esse caso, então, é conhecido como concurso necessário.

    Exemplo didático:

    Crime de associação criminosa (art. 288 do CP, com redação estabelecida pela lei 12.850, de 02.08.2013) e o crime de rixa (art. 137).

    1.3. Teorias do concurso de agentes

    Existem três teorias:

  3. Teoria unitária (monista ou monística). Todo aquele que concorre para a produção do crime paga pelo mesmo delito.

    Exemplo didático:

    "A" e "B" querem matar "C". Na hora da execução, "A" segura "C" e "B" dá as facadas. Pela teoria monista, todos respondem por homicídio.

  4. Teoria dualística (dualista). Segundo esta teoria, há um crime entre os autores e outro crime entre os partícipes.

    c) Teoria pluralista. Por esta teoria, não ocorre apenas pluralidade de pessoas, mas também de crimes. Ou seja: há um concurso de ações distintas e, em consequência, uma pluralidade de delitos, praticando cada uma das pessoas um crime próprio (autônomo), um elemento psicológico próprio, um resultado próprio.

    Teoria adotada pelo Código Penal: teoria monista

    1.4. Exemplos didáticos de casos em que a legislação penal não adotou a teoria monista

    1. ) "A" solicita fazer um aborto em "B"; "B" consente e o aborto é consumado.

      Solução jurídica: "A" pagará pelo tipo do art. 126 do Código Penal, que define a conduta de "provocar aborto com o consentimento da gestante". E "B", pelo tipo penal do art. 124 do Código Penal, que, em sua 2ª parte, descreve o fato de o agente consentir que outrem lhe provoque aborto.

    2. ) "A", que é casado com "B", contrai novo casamento com "C", que é solteira e sabe que "A" é casado.

      Solução jurídica: "A" responde pelo delito de bigamia (art. 235, caput, do Código Penal). "C", a mulher solteira, que contraiu matrimônio com o agente casado, conhecendo a circunstância impeditiva, em face da teoria monista, deveria ser o partícipe do delito cometido por "A" (art. 235, caput), mas a sua conduta amolda-se à descrição legal do art. 235, § 1º.

    3. ) "A" ofereceu vantagem indevida a "B", funcionário público, para determiná-lo a praticar ato de ofício. "B" recebeu, mesmo fora de sua função, a vantagem indevida.

      Solução jurídica: "A" responde pelo delito de corrupção ativa, art. 333 do Código Penal, e "B" por corrupção passiva, art. 317 do mesmo estatuto repressivo.

    4. ) "A" ofereceu dinheiro a "B", testemunha de determinado processo, com a finalidade de a mesma fazer afirmação falsa em seu depoimento. "B" fez a afirmação falsa no processo judicial. Qual a solução jurídica?

      Solução jurídica: "A" responderá pelo delito do art. 343 do Código Penal, e "B" pelo crime do art. 342 do mesmo Código.

    5. ) "A", com a finalidade de facilitar a fuga de "B" de um presídio, deixou seu carro em local previamente acertado. "B" evadiu-se, usando de violência contra os carcereiros. Demonstrou-se posteriormente que a fuga só obteve sucesso devido à contribuição de "A".

      Solução jurídica: "A" responderá pelo delito do art. 351 do Código Penal, e "B", pelo crime do art. 352 do mesmo Código.

      Observe-se que, em todos os exemplos supramencionados, o Código Penal adotou a teoria pluralística, existindo um crime para o autor e outro para o partícipe, ambos descritos como delitos autônomos.

      1.5. Requisitos do concurso de agentes

  5. Pluralidade de condutas. Sem a qual não se pode pensar em concurso.

  6. Relevância causal das condutas. Sem que haja essa relevância causal, não se pode cogitar de que todos tenham contribuído para o crime.

    Page 132

  7. Liame subjetivo. Significa que o partícipe deve ter consciência de estar colaborando para o resultado criminoso visado pelo outro. Segundo a melhor doutrina, é desnecessário o prévio ajuste entre as partes, bastando a unidade de desígnios, ou seja, que uma vontade adira à outra.

    Exemplo didático:

    Por desavenças anteriores, uma pessoa deixa a casa da vítima aberta e o ladrão aproveita-se desse fato para praticar um furto. O autor da subtração não sabe que foi ajudado, mas quem ajudou é partícipe do furto. A ausência do liame subjetivo leva à autoria colateral.

    Com o estudo deste requisito, você entendeu por que não pode existir participação dolosa em crime culposo, nem participação culposa em crime doloso. O liame subjetivo deve ser homogêneo.

    d) Identidade de crime para todos os envolvidos. Havendo o liame subjetivo homogênio, todos os envolvidos devem responder pelo mesmo crime (fora as exceções já estudadas).

    Exemplo didático:

    Se duas pessoas entram em uma casa para roubar os moradores e uma delas consegue fugir, levando alguns objetos, enquanto a outra é presa, ainda dentro da residência, ambas responderão por roubo consumado.

    1.6. Da autoria

    Na doutrina prevalece o entendimento de que autor é aquele que realiza o tipo penal, ou seja, que pratica atos que se enquadram no modelo legal de crime. Sua ação ou omissão é decisiva para a ocorrência do resultado delituoso praticado em concurso. Este é um conceito que decorre da teoria restritiva de autor, que é aceitável com a flexibilização necessária, para aí ser incluída a figura do autor mediato. Assim, é autor quem pratica a ação de matar, de subtrair, de corromper etc.

    Conforme Fragoso e Bruno, é autor não apenas quem desfere um golpe na vítima, como também aquele que a segura para que o outro possa golpeá-la. Quem arromba a porta de uma residência, juntamente com quem ali penetra, para furtar objetos alheios, são autores do mesmo furto. Come-tem o mesmo roubo tanto aquele que exerce atos de violência quanto aquele que subtrai os objetos pertencentes à vítima, desde que a ação delituosa tenha sido praticada em conjunto.

    O autor pode ser:

    1. Intelectual, moral ou psíquico. É quem idealiza ou planeja o ato delituoso que será executado por outra pessoa.

    2. Executor. É quem realiza o crime de sua própria iniciativa ou de outrem.

    3. Mediato. É aquele que se aproveita de outrem para realização do delito; o autor mediato usa alguém (a quem não se pode atribuir culpa) para realizar, total ou parcialmente, o crime desejado.

    Teorias:

  8. Teoria objetivo-formal. Autor executa o núcleo do tipo; partícipe colabora de forma secundária com a execução do delito.

  9. Teoria objetivo-material. Autor é causa; partícipe é condição de delito.

  10. Teoria final-objetiva. Autor possui domínio final do fato; partícipe, não.

    1.7. Elementos subjetivos de autoria

    Embora, como regra, os tipos penais possam ser realizados por qualquer pessoa, alguns deles limitam-se a determinado número de sujeitos que podem realizá-los. São componentes subjetivos que valorizam a posição do autor da infração, aumentando ou diminuindo a lesão do dever infringido, como ocorre, por exemplo, nos crimes de peculato (312), corrupção passiva (317) ou prevaricação (319), entre outros, em que a condição de funcionário público é elemento subjetivo de autoria, integrante do desvalor da ação. Aliás, são esses elementos subjetivos de autoria que fundamentam a distinção em crimes comuns, crimes especiais ou próprios e crimes de mão própria. (Vide WELZEL, Hans. Derecho Penal: Parte General, p. 113).

    1.8. Punibilidade do concurso de pessoas

    Dotti e Mirabete entendem que a redução pre-vista no art. 29, § 1º, do CP é faculdade, pois o juiz poderá constatar uma intensidade de vontade do partícipe igual à dos demais intervenientes. E essa equivalência na determinação poderia - segundo eles - autorizar a equiparação no plano da culpa-bilidade.

    Page 133

    1.9. O momento da participação

    A participação pode ocorrer em qualquer das fases do iter criminis: cogitação, preparação, execução e consumação. Considerada isoladamente, a conduta do executor, pode acontecer, inclusive, antes da cogitação. Caso da determinação ou induzimento.

    1.10. A pessoa jurídica e a possibilidade do cometimento de crimes

    Excepcionalmente, as pessoas jurídicas poderão cometer crimes, uma vez que a Constituição Federal estabelece que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar o dano (...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT