Do crime

AutorFrancisco Dirceu Barros - Antônio Fernando Cintra
Ocupação do AutorMestre em Direito, Promotor de Justiça Criminal e Eleitoral, Doutrinador e especialista em Direito Penal e Processo Penal - Advogado criminalista há vinte e nove anos. Procurador do Estado, pós-graduado em Direito Público, escritor com sete o livros lançados
Páginas61-119

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Relação de causalidade

Art. 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

· Vide arts. 19 e, 69 a 71, CP.

Superveniência de causa independente

§ 1º A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou. Relevância da omissão

§ 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

  1. tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;

  2. de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;

  3. com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

    1. Explicação didática

    São várias as teorias que tentam explicar como o resultado deve ser atribuído a alguém, no livro Direito Penal - Parte Geral, promovemos uma longa discussão provando que não é necessário seguir o modismo e adotar mais uma teoria do direito alienígena. O art. 13 caput do Código Penal preconiza: "O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Adotou nitidamente a teoria equivalência dos antecedentes causais, ou conditio sine qua non. Quando o Código Penal, no § 1º do art. 13, diz que "A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou", adotou claramente a teoria da "causalidade adequada".

    Na teoria da causalidade adequada, considera-se a conduta adequada quando é idônea para gerar o evento; assim, para que se possa considerar um evento como causado por um homem, mister que este, além de realizar um antecedente indispensável, desenvolva uma atividade adequada à concretização do evento.

    Portanto, o nosso Código Penal foi bem claro ao excluir expressamente a teoria da imputação objetiva, não podendo esta ser adotada no Brasil, a não ser que seja revogado o artigo 13 do Código Penal.

    2. Exposição doutrinária e exemplos didáticos

    2.1. Teoria da equivalência dos antecedentes causais ou conditio sine qua non

    Segundo a teoria da equivalência das condições ou da conditio sine qua non, criada por Glaser e sistematizada por Von Buri, causa é a condição sem a qual o resultado não teria ocorrido (artigo 13 do CP). Todo efeito ou resultado é produto de uma série de condições equivalentes, do ponto de vista causal. Tudo o que concorre para o resultado é causa dele, sendo decisivo "que sem essa condição o resultado não pudesse ocorrer como ocorreu".

    2.2. Como fazer a identificação do que deu causa ao resultado

    Segundo o professor sueco Thyrén, autor do chamado processo hipotético de eliminação, para

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    considerarmos determinado fato como causa do resultado é preciso que façamos um exercício mental da seguinte maneira:

    1) temos de pensar no fato que entendemos como influenciador do resultado;

    2) devemos suprimir mentalmente esse fato da cadeia causal;

    3) se, como consequência dessa supressão mental, o resultado vier a se modificar, é sinal de que o fato suprimido mentalmente deve ser considerado como causa desse resultado.

    Exemplo didático:

    Vejamos o exemplo de Damásio:

    Suponhamos que A tenha causado a morte de B. A conduta típica do homicídio possui uma série de fatos, alguns antecedentes, dentre os quais poderíamos sugerir os seguintes:

    1. ) produção do revólver pela indústria; 2º) aquisição da arma pelo comerciante; 3º) compra do revólver pelo agente; 4ª) refeição tomada pelo homicida; 5ª) emboscada; 6º) disparos dos projéteis na vítima; 7º) resultado morte. Dentro dessa cadeia, excluindo-se os fatos sob os números l" a 3º, 5ª e 6º, o resultado não teria ocorrido. Logo, dele são considerados causa. Excluindo-se o fato sob o número 4 (refeição), ainda assim o evento teria acontecido. Portanto, a refeição tomada pelo sujeito não é considerada como sendo causa do resultado."

    Se suprimirmos mentalmente a fabricação da arma, o resultado ainda assim teria ocorrido, isto é, a vítima teria falecido em virtude dos disparos por ela recebidos? Temos de responder negativamente a esta indagação. Neste caso, havendo modificação no resultado, é sinal de que aquela conduta, suprimida mentalmente, dele foi considerada causadora. Agora, façamos uma eliminação mental da refeição ingerida pelo agente. Se a retirarmos da cadeia causal, o resultado ainda assim teria ocorrido? A resposta só pode ser positiva.

    Em nada modifica o resultado o fato de ter o agente se alimentado anteriormente. Portanto, como não houve modificação alguma no resultado depois de termos suprimido mentalmente aquele fato, não podemos considerá-lo como causa. Esse, enfim, o processo hipotético de eliminação criado por Thyrén.

    2.3. Os antecedentes causais

    Os antecedentes causais ou condições podem ser: absolutamente independente e relativamente independente, e ambos se dividem em preexistentes, concomitantes e supervenientes.

  4. Absolutamente independente: é aquela causa que teria acontecido, mesmo se não tivesse havido qualquer conduta por parte do agente.

    Exemplo didático:

    Noronha exemplifica: "se A e B, com armas de calibres diferentes, atiram contra C (afastada a hipótese de coautoria) e ficar provado que o projétil de B é que, atingindo o coração da vítima, a matou, ao passo que o de A alcançou levemente em um braço, somente aquele responde por homicídio".

    Aplicando o processo hipotético de eliminação do professor Thyrén, pergunta-se: Se eliminarmos mentalmente a conduta de A, ainda assim o resultado morte teria ocorrido?

    Resposta: sim, porque o projétil que acertou no coração da vítima foi disparado pela arma de B, causando a morte do sujeito passivo, portanto, as causas, tiro no coração e lesão no braço, são absolutamente independentes, porque a morte teria ocorrido, mesmo se não tivesse havido qualquer conduta por parte de A.

    Solução jurídica: B responde por homicídio doloso consumado. A responderá tão somente pela tentativa de homicídio.

  5. Relativamente independente: consoante lição do Prof. Rogério Greco, diz-se relativamente independente a causa que somente tem a possibilidade de produzir o resultado se for conjugada com a conduta do agente. Existe uma relação de dependência entre a conduta do agente e a causa que também influencia na produção do resultado. A ausência de qualquer uma delas (causa relativamente independente + conduta do agente) faz com que o resultado seja modificado.

    Exemplo didático:

    No exemplo fornecido por Bitencourt e Monhõz Conde:

    Se dois indivíduos, um ignorando a conduta do outro, com a intenção de matar, ministram, separadamente, quantidade de veneno insuficiente para produzir a morte da mesma vítima, mas em razão do efeito produzido pela soma das doses ministradas esta vem a morrer, qual seria a solução recomendada pela teoria de equivalência das condições, consagrada pelo Direito brasileiro? Responderiam ambos por tentativa, desprezando-se o resultado morte? Ou responderiam, cada um isoladamente, pelo homicídio

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    doloso? [...] A nosso juízo, configuram-se causas (concausas) relativamente independentes, e ambos devem responder pelo homicídio doloso consumado. Trata-se de uma modalidade de autoria colateral, onde não há vínculo subjetivo entre os autores, por isso não há coautoria.

    Percebe-se que a quantidade de veneno isoladamente era insuficiente para matar a vítima; portanto, as causas são relativamente independentes, ou seja, suprimida uma das causas, o resultado não teria ocorrido.

    2.4. A divisão das causas

    As causas relativa e absolutamente independente podem ser preexistentes, concomitantes e super-venientes, conforme veremos a seguir.

    a) Causa preexistente

    Conceito didático: é preexistente quando a causa da morte existia antes do evento praticado pelo agente.

    Divisão: A causa preexistente se divide em:

    a.1) Causa preexistente absolutamente independente

    Exemplo didático:

    Tício está perturbando Mévia para namorá-la e esta, com raiva, resolve matá-lo. Antes do evento, Tício toma veneno e, quando chega perto de Mévia, a mesma atira. O laudo médico atesta que Tício morreu envenenado e não pelos tiros, ou seja, a morte ocorreu por uma causa preexistente.

    Consequência jurídica: Mévia não responde pelo resultado final, mas pelos atos praticados anteriormente, no caso, tentativa de homicídio.

    a.2) Causa preexistente relativamente independente Exemplo didático:

    "Tício" golpeia "Mévio", hemofílico, que vem a falecer em consequência dos ferimentos, estando a par da contribuição de sua condição particular fisiológica.

    Consequência jurídica: Tício responde pelo resultado, no caso, homicídio.

    Mas, algo muito importante é destacado pelo Prof. Rogério Greco:

    Contudo, se o agente desconhecia a hemofilia da vítima, não poderá ser responsabilizado pelo resultado morte, uma vez que estaria sendo responsabilizado objetivamente. Se queria ferir a vítima, agredindo-a com um soco na região do tórax e esta, em razão de sua particular condição de hemofílica, vem a falecer devido à eclosão de um processo interno de hemorragia, o agente só poderá ser responsabilizado pelo delito de lesões corporais simples.

    b) Causa concomitante

    Conceito didático: fatos externos causam a morte, que acontece no mesmo momento da pseudocausa da morte.

    Divisão: A causa concomitante se divide em:

    b.1) Causa concomitante absolutamente independente

    Exemplo didático:

    "Tício" fere "Mévio", no mesmo momento em que este vem a falecer, exclusivamente, por força de um colapso cardíaco.

    Consequência jurídica: Tício não responde pelo resultado, mas pelos atos praticados anteriormente, no caso, tentativa de homicídio ou lesão corporal; depende do animus (necandi ou lesionandi).

    b.2) Causa concomitante relativamente independente Exemplo didático:

    "Tício"...

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