Doença - Indenização - Irrenunciabilidade - Nexo causal

AutorJuiz guilherme guimarães Feliciano
Páginas56-61

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1ª Vara Federal do Trabalho de Taubaté TERMO DE AUDIÊNCIA Processo n. 57.300-41-2006

Aos sete dias (sexta-feira) do mês de maio do ano de dois mil e dez, às 17h50, na sala de audiências desta Vara, por ordem do Meritíssimo Juiz do Trabalho, Doutor GUILHERME GUIMARÃES FELICIANO, foram apregoadas as partes João Carlos da Silveira, reclamante, e Volkswagen do Brasil Indústria de Veículos Automotores Ltda, reclamada.

Ausentes as partes.

Submetido o processo a julgamento, profiro a seguinte

SENTENÇA

1. RELATÓRIO

João Carlos da Silveira, qualificado à fl. 02, propôs a presente ação indenizatória em face de Volkswagen do Brasil Indústria de Veículos Automotores Ltda, alegando, em síntese, que se ativou para a ré de 24.2.1995 a 23.12.2003, quando foi demitido sem justa causa, com último salário de R$ 9,10/hora (= R$ 2.022,81: 220 [fl. 85]), na função de prático/montador de produção.

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No decorrer do contrato, dentre outras funções, trabalhou na máquina de torque, "que era antiga e quando acionava o torque, perdia a força, dando um tranco, sendo esse tranco suportado e amortizado pelos braços do autor"; a partir de 1998, começou a sentir fortes dores nos membros superiores, chegando a ficar 15 dias afastado do trabalho e, por causa do trabalho penoso, foi acometido de tendinopatia com ruptura (tendão supra-espinhoso [fl. 26]). Pediu, por tudo isso, indenização por danos materiais e morais, dando à causa o valor de R$ 100.000,00. Juntou procuração e documentos.

Em primeira audiência (fl. 35), juntou-se a contestação de fls. 36-66. A ré arguiu, preliminarmente, a ocorrência das hipóteses pevistas no art. 267, incisos IV, V, VI/CPC, porque a demissão teria ocorrido por mútuo acordo, com pagamento de todos os títulos rescisórios e incentivo financeiro, sem qualquer ressalva. "De meritis", a reclamada requereu em seu favor a aplicação da teoria responsabilidade subjetiva, que a isentaria de qualquer culpa. Ademais, aduziu que o reclamante sempre laborou em ambientes adequados, no que diz respeito à segurança e à medicina do trabalho; os equipamentos e máquinas sempre foram leves e de fácil movimentação (última geração); o processo produtivo da empresa teria sido desenvolvido com base em apurados critérios técnico-científicos, inclusive no tocante à ergonomia; todas as normas regulamentadoras sempre foram corretamente observadas; durante todo contrato, o reclamante sempre recebeu EPI's e orientações para o uso adequado destes equipamentos; o reclamante fora considerado apto em seu exame médico demissional, donde se concluir que não lhe caberiam as pretendidas indenizações. Juntou procuração e documentos.

Designou-se perícia médica, louvando-se o vistor, com quesitos do Juízo à fl. 35.

Réplica às fls. 400-443. O reclamante ainda indicou assistente técnico e formulou quesitos às fls. 447-448. Honorários periciais prévios, indicação de assistentes técnicos e quesitos pela reclamada às fls. 454-458.

Parecer técnico do assistente da reclamada foi juntado às fls. 634-665.

Laudo pericial médico do perito louvado por este Juízo foi acostado às fls. 468-543, concluindo que "o RCTE é PORTADOR DE SÍNDROME DO IMPACTO EM OMBRO DIREITO E ESQUERDO SECUNDÁRIOS A SEU LABOR NAS DEPENDÊNCIAS DA RECDA; O RECTE. APRESENTA UMA INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE ESTIMADA EM 18,75%; HÁ REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA PARA A FUNÇÃO ANTERIORMENTE EXECUTADA; HÁ NEXO DE CAUSALIDADE COM O TRABALHO EXECUTADO

NAS DEPENDÊNCIAS DA RECDA" (FL. 480).

Seguiram-se as manifestações das partes sobre o laudo pericial (fls. 565 e 566-577). Respostas do perito às fls. 579-583.

Novas manifestações das partes às fls. 591-592 e do perito, às fls. 603-608.

Designou-se audiência de instrução (fl. 614), a pedido das partes.

Em audiência ouviu-se o depoimento pessoal das partes e uma testemunha, pela reclamada, encerrando-se a instrução processual. Razões finais remissivas por ambas as partes (fls. 619-620)

Infrutíferas as propostas conciliatórias (última tentativa à fl. 620).

É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO

Convém examinar, primeiramente, a tese da extinção do processo sem julgamento de mérito (fls. 37-43), baseada no fato da adesão espontânea da reclamante ao PDV. A adesão em si mesma não traz consigo qualquer eiva (erro, dolo, coação, fraude, simulação), como se verá de meritis. Nada obstante, não tem os efeitos pretendidos pela ré. Em todas as hipóteses de adesão a PDV, a modalidade de extinção do contrato de trabalho é o distrato, que se configura "quando são as duas partes que querem paralisar os efeitos do contrato"; nesse caso, "celebram outro contrato para dissolver o que os vincula. Pelo contrarius consensus aniquilam o vínculo, impedindo que continue a produzir efeitos. A esse contrato extintivo denomina-se distrato ou distrate. Trata-se de forma ou modo de dissolução, admissível no contrato de trabalho, que, entretanto, não é frequente Não se trata, todavia, de "transação" idônea a fulminar todos e quaisquer direitos decorrentes do contrato de trabalho, porque o próprio instituto da transação pressupõe que os interessados previnam ou terminem litígios (art. 1025 do Código Civil de 1916; art. 840 do Novo Código Civil): litígios, ou lides, são conflitos de interesses qualificados por uma pretensão

resistida (FRANCESCO CARNELLUTTI). Se não havia, à época do distrato, uma pretensão concretamente formulada (se houvesse, teria constado da homologação, nos termos da Súmula n. 330, I, do C.TST), decerto não se podia falar, nessa parte (sequer por expectação), em litígio para fins de transação. Prevenir litígios é prevenir conflitos de interesses concretos, que já se pronunciam no presente; não é obstar indiscriminadamente qualquer

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interesse futuro, porque aí não há mais transação, mas renúncia, abstrata, ampla, rasa e irrestrita, que sob tais circunstâncias é inadmissível, notadamente em vista do princípio da irrenunciabilidade que informa as relações de trabalho. Ademais, ainda que se pudesse reconhecer na adesão ao PDV um propósito de renúncia parcial, caberia entender, com ARNALDO SÜSSEKIND2, que essa renúncia teria como pressuposto de validade a existência de ato explícito e de interpretação restritiva, inocorrente na espécie: a declaração contida na cláusula 9a de fl. 119 é absolutamente genérica e, por outorgar quitação rasa e irrestrita para quaisquer pretensões presentes ou futuras, resulta inválida. Enfim, a matéria foi sepultada com a edição da OJ n. 270 da SDI-1/TST, em 27.9.2002:

"A transação extrajudicial que importa rescisão do contrato de trabalho ante a adesão do empregado a plano de demissão voluntária implica quitação exclusivamente das parcelas e valores constantes do recibo" (g.n.).

Pois bem: como se vê à fl. 120, não se reservou uma palavra sequer à questão da doença ocupacional do reclamante (que, aliás, a empresa-ré afirma inexistir [fls. 52-53); ou, se...

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