Doença profissional e ambiente de trabalho do motorista - aspectos médicos

AutorDirceu Rodrigues Alves Jr.
Páginas269-285

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1. Aspectos médicos sobre a atividade de motorista profissional

O transporte desorganizado, com máquinas móveis extremamente perigosas, desloca-se sem limites por toda a cidade comprometendo a saúde do trabalhador, do usuário e da população em geral.

O trinômio homem-máquina-meio é submetido à falta de organização e adequação.

As indústrias em geral apresentam fatores de risco que comprometem a saúde do trabalhador, por isso, são obrigadas a atuarem de maneira preventiva fazendo a profilaxia de tais riscos. Quando não tem como impedir o risco, tem que atuar com os equipamentos de proteção individual ou coletiva.

Conclusão, dentro de uma empresa fechada, cercada por muros, existem leis que regulam as atividades, as máquinas, o comprometimento da higiene ambiental, os riscos de acidentes e doença ocupacional. O trinômio Homem — Máquina-Meio é a todo o momento supervisionado e dirigido por uma equipe de segurança e medicina do trabalho e fiscalizada pela Delegacia Regional do Trabalho e pela Vigilância Sanitária.

Nesse trabalho, entra a matéria prima na máquina e lá no final sai o produto pronto.

Essas indústrias são proibidas por lei de comprometerem a saúde do trabalhador e o meio ambiente.

Quando falamos em transporte, estamos falando de máquinas mais perigosas do que aquelas que ficam entre muros. Estas são móveis o operador fica no seu interior e a matéria prima é gente.

É a indústria do transporte que acontece fora dos muros das fábricas, nas ruas e espalhadas por toda a cidade. Essa indústria é constituída por máquinas extremamente agressivas ao organismo do homem, pelos fatores de risco até mais exacerbados que algumas indústrias comuns. Nessa indústria a máquina tem o pior risco, é móvel.

A matéria prima é gente e o produto final tem que continuar a sendo gente.

O operador trabalha dentro da máquina. Não há “layout”, não temos como distribuir essas máquinas móveis de tal maneira que possamos reduzir os riscos aos operadores, aos usuários e a

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população em geral. Não vemos as visitas da Delegacia Regional do Trabalho e Vigilância Sanitária nos locais de operações. Não vemos serviço de Segurança e Medicina de Tráfego atuante para minimizar riscos.

O trabalho penoso é caracterizado pela sobrecarga física e mental.

A característica do trabalho é de ser extremamente penoso devido à sobrecarga física e mental. Tal sobrecarga é nitidamente demonstrável através do estresse a que todo trabalhador da área de transporte é submetido. O homem é submetido ao estresse físico marcado pelo excesso de movimentos dos membros superiores, membros inferiores e coluna.

AINDA PELO STRESS

— PSÍQUICO

— SOCIAL

Para demonstrar essa sobrecarga, fizemos um trabalho de pesquisa e observamos que num espaço de 80 km percorridos por um coletivo em área urbana, foram precisas 06 horas e 40 minutos e foram realizados 23.500 movimentos de pernas, braços e coluna.

O estresse psicológico é causado pelas preocupações com os movimentos do veículo, com entrada e saída de usuários, com os riscos de acidentes com relação ao usuário e pedestre, com irritação produzida pelo trânsito lento e ações de outros motoristas, assaltos, violência etc.

A tudo isso se soma o estresse social, afiorado pela irritabilidade socioeconômica, os problemas relacionados à família e tudo mais.

Este mesmo trabalho sofre ainda agressões por meio dos riscos físico, químico, biológico, ergonômico e de acidentes.

Além disso, ainda penoso pelos riscos físico, químico, biológico, ergonômico a que são submetidos. O risco físico é constituído por vibração de corpo inteiro, ruído que varia ente 78 a 98 decibéis e pelas variações térmicas. Sabemos que o ruído médio é em torno de 87 decibéis e que está acima do que preconiza a lei, que é de 85 decibéis para cada 08 horas como jornada de trabalho.

Sabemos que muitos dos trabalhadores dessa área chegam a desenvolver 12 a 16 horas de trabalho por dia, realizando em alguns casos, duas jornadas de trabalho, uma de 04 às 10 horas no pico da manhã e outra no pico da tarde-noite.

Para marcar o risco químico, temos a todo o momento, como produtos da combustão de derivados de petróleo, o monóxido de carbono, o dióxido de enxofre e o dióxido de nitrogênio, substâncias tóxicas para o nosso organismo. Ainda o material particulado constituído de poeiras e de fuligem. O risco biológico pode ser observado nos coletivos fechados e também naquelas em que há ar refrigerado, aparelhos estes que sempre por deficiência de manutenção introduzem no meio ambiente, fungos, bacilos, vírus, bactérias, outras poeiras etc. Naqueles que transportam material orgânico, como gado, aves, suínos etc.

Finalmente o risco ergonômico caracterizado por postura, esforço e condições ambientais como ventilação, iluminação etc. Ninguém ignora que o banco do motorista tem que ter uma maleabilidade para poder se adequar às necessidades individuais. Muitas vezes, a ausência dessa maleabilidade leva a postura incorreta e consequentemente a sinais e sintomas.

Em função de tudo isso é comum o motorista procurar o ambulatório médico com queixas variadas como:

• Fadiga

• dores nas pernas

• cãibras

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• remores de extremidades

• lombalgia

• zumbidos

• tonteiras

• dor de cabeça

• nervosismo

• dor cervical

• problemas respiratórios

Além disso, é comum apresentar como patologias frequentes:

• estresse

• tinitus

• perda auditiva

• surdez

• DORT / LER

Como incapacidade temporária:

• lombalgia

• lombociatalgia

• DORT / LER

• doenças metabólicas

Como incapacidade definitiva:

• deficiência visual

• surdez

• distúrbios psiquiátricos

• doenças degenerativas

• doenças convulsivas

• doenças metabólicas

Como acidente de trabalho e doença ocupacional:

• entorse de joelhos, tornozelos

• traumatismo de punho

• tinitus (lesão ciliar ouvido interno)

• perda auditiva

• surdez

• síndrome do túnel do carpo

Se não ficou clara a penosidade do trabalho, é importante lembramos o relógio biológico do operador com alterações importantes sobre micção, evacuação, alimentação e sono. Tudo ocorre no trânsito e nos pontos de parada. A fisiologia do indivíduo fica alterada em função das necessidades do trabalho que desenvolve.

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É o sofrimento orgânico em função do trabalho. Acreditamos que desta forma selamos o trabalho penoso, quando após a jornada de trabalho colocamos o motorista para dormir em dormitório coletivo com múltiplas pessoas entrando e saindo, conversando e isso quase sempre em ambiente de muito barulho produzido pela manutenção de veículos dentro da garagem onde normalmente se encontram tais dormitórios. Após 06 horas de um repouso tumultuado, retorna a atividade com destino a sua origem.

O sacrifício do trabalho aqui executado, não é protegido por equipes de segurança do trabalho e tão pouco com equipamentos de proteção e mesmo com melhor organização do trabalho para que o homem, elemento principal do esquema, possa minimizar o desgaste a que foi submetido, ter uma recuperação condizente para a próxima “jornada”.

Como se não bastasse, o motorista não protegido contra a perda auditiva, é punido com a incapacidade para a atividade profissional quando a perda é igual ou maior que 40dB.

O código nacional de trânsito e as Resoluções ns. 51 e 80 ainda punem o profissional que exposto ao ruído citado anteriormente, não protegido, evolui para perda auditiva e quando esta perda é igual ou maior do que 40 decibéis, média aritmética em 500, 1000 e 2000 Hz passa a ser considerado inapto para a atividade profissional. Tem sua carta rebaixada para categoria A ou B. Está incapacitado para atividade remunerada. Não conseguimos entender como e porque da incapacidade. Na realidade está sendo considerado apto para categoria A. Nessa categoria o ruído produzido pela máquina é grande o que deverá acentuar sua perda auditiva se não tiver proteção, isto é, um equipamento de proteção individual, que seria o plug ou o abafador de ruídos tipo concha. Quando veste o capacete, EPI obrigatório para a categoria A, tem redução do ruído ambiental em aproximadamente 20%. Ora, se já era considerado incapaz com 40 dB de perda, reduzindo 20% com capacete, terá audição muito mais comprometida (diminuída) para dirigir esse tipo de veículo de alto risco de acidente.

Um contra-senso!!!

Inabilitado para atividade profissional pela perda auditiva causada pelo trabalho não protegido, passa a ser habilitado para dirigir motocicleta.

Concluo que não é necessária a boa audição para dirigir veículos. Dentro do meu automóvel, com vidros fechados, som ligado e ar condicionado funcionando, não tenho como escutar o que vem de fora. Nessa condição estou surdo para o ambiente externo.

Num veículo blindado, vidros fechados, som e ar condicionado ligados ocorre o mesmo fato. Observe que não é proibido fechar os vidros, e ligar os dois aparelhos. A mesma coisa acontece na boleia de um caminhão que produz ruído acima de 90 decibéis, fechado o vidro, ligado o som e ar condicionado o motorista não tem como escutar a buzina de um FIAT 147 que tenta ultrapassá-lo.

Será que não posso dirigir veículo tendo perda auditiva?

Os incômodos momentâneos produzidos pelo ruído são irritação, dor no ouvido, zumbidos, tonteira e torpor. O fator mais importante na realidade é a perda auditiva não percebida de imediato e que é irreversível.

No trabalho que realizamos estudando a população que trabalha em prédios na Avenida Paulista, em São Paulo, centro financeiro do país, conseguimos mostrar a repercussão do ruído produzido pelo transporte que circula por aquela via sobre essas pessoas que desenvolvem trabalho burocrático. Entre outras patologias...

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