Dos acidentes de trabalho

AutorAnderson Angelo Vianna da Costa
Ocupação do AutorAdvogado com atuação na área previdenciária, sócio do escritório Vilela Vianna Advocacia e Consultoria, sediado em Curitiba
Páginas47-133

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1 - Considerações sobre o conceito de acidente do trabalho

A melhor forma de iniciar este tema é trazendo o conceito do que é acidente de trabalho. E, como veremos, parece reinar um entendimento equivocado (e elastecido) sobre ele, resultando em muitos procedimentos e exigências igualmente deturpados.

Curiosamente, o conceito de acidente do trabalho5 não está na legislação trabalhista, mas na Lei de Benefícios (Lei n. 8.213/91), assim grafado em seu art. 19:

Lei n. 8.213/91

Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço de empresa ou de empregador doméstico ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

Para melhor entender o conceito e ir preparando o terreno para facilitar a compreensão de nossas próximas sugestões gerenciais, convém destacar os três requisitos exigidos pela Lei para que uma ocorrência seja caracterizada como acidentária.

Para ser considerado como acidente do trabalho, há que se observar 3 requisitos:

Primeiro requisito: “o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço de empresa” - como se vê nesse primeiro requisito, somente poderá ser considerado como acidente do trabalho a ocorrência que tiver sido provocada ou decorrido do exercício de alguma tarefa vinculada à atividade laborativa, ou às obrigações funcionais, ou ainda ao ambiente de trabalho da empresa.

A preposição “pelo” existente no conceito é importante para afastarmos os entendimentos de que o acidente de trabalho seria todo aquele que ocorre “na” empresa, ou “durante” a jornada de trabalho.

Vejamos um caso que nos chegou para análise:

O trabalhador, motorista numa empresa de ônibus, estava aguardando na garagem a liberação de seu veículo, quando resolveu subir no muro da empresa para pegar uma fruta no terreno vizinho. Caiu e sofreu uma lesão. (Reclamatória Trabalhista, Processo n. 1001104-34.2015.5.02.0315, em trâmite na 5ª Vara do Trabalho de Guarulhos/SP).

Ora, nesse caso, o trabalhador estava nas dependências da empresa e sofreu a lesão durante sua jornada, mas sua ocorrência não deve ser classificada como acidente do trabalho, por lhe faltar o primeiro requisito: a ocorrência não se deu “pelo exercício do trabalho a serviço da empresa” .

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A sentença, acertadamente, afastou o nexo de causalidade, nos seguintes termos de seu relatório:

“Ainda, noutro aspecto, é importante mencionar que a queda sofrida pelo reclamante não foi responsabilidade da 1ª reclamada, tratando-se de culpa exclusiva do próprio trabalhador que se aventurou em subir numa árvore para colher frutas, o que não condiz com a atividade efetivamente desempenhada pelo trabalhador na reclamada.”

É importante que a ocorrência seja investigada, pois temos visto muitos casos em que essa análise não foi feita corretamente, provavelmente sob o viés comum e equivocado de que o local e a hora do acidente (se ocorreu na empresa ou durante a jornada) seriam preponderantes.

Já analisamos diversos e diversos casos de quedas provocadas por uso titubeante de salto alto, tropeços e quedas provocados por desatenção ao ver celular, incidentes vários ocorridos durante os intervalos para lanche ou almoço que não deveriam ter sido considerados como acidentes do trabalho, mas para os quais foram emitidas CAT, resultando em prejuízos e consequências desnecessários para as empresas.

Segundo requisito: aquele que provoca “lesão corporal ou perturbação funcional” - ainda que o evento tenha decorrido do exercício do trabalho a serviço da empresa, somente será considerado como acidente do trabalho se tiver provocado um lesão corporal ou perturbação funcional.

As lesões corporais poderão ser internas ou externas, de qualquer gravidade. Por perturbação funcional, qualquer prejuízo sensorial (tontura, desmaio, tremor, pânico, etc.), ainda que momentâneo, também deverá ser considerado, assim como os quadros mais graves que culminem em estresse, quadro depressivo ou transtornos outros.

Caso a lesão corporal ou perturbação funcional se revelem num momento posterior à avaliação inicial, o acidente do trabalho poderá ser reconhecido posteriormente, conforme preceitua o artigo 23 da mesma Lei n. 8.213/91, o que explicaremos melhor quando analisarmos o terceiro requisito, a seguir.

Terceiro requisito: aquele que provocar morte, perda ou redução, permanente ou temporária, para o exercício de sua atividade proissional - os casos de morte ou perda deinitiva da capacidade laborativa normalmente decorrem de eventos mais graves, quase sempre por acidentes típicos,sendo mais facilmente caracterizáveis.

Na maioria das vezes, temos os casos de ocorrências menos gravosas e que suscitam dúvidas dos gestores, sobretudo se emitem ou não CAT, e são essas que devem merecer nossa análise aqui.

Para ilustrar, vamos trazer dois casos: o primeiro, envolvendo um Analista de Recursos Humanos que, ao transitar pelo pátio da empresa, que estava molhado e mal sinalizado, escorregou e sofreu uma entorse no tornozelo, que veio a icar, inclusive, com uma característica equimose.

Nesse caso, seu ambiente de trabalho estava inadequado (molhado e sem sinalização), sendo a causa imediata da ocorrência, já que o analista estava executando uma das tarefas que lhe eram pertinentes. Logo, o primeiro requisito foi identificado. O segundo requisito (lesão corporal) também icou evidente, pela entorse sofrida, pela dor e pela vermelhidão inicial, seguida da equimose.

Entretanto, essa lesão não lhe provocou a mínima redução de sua capacidade laborativa, tendo o trabalhador retomado suas atividades laborativas sem qualquer prejuízo em seu desempenho, exercendo-a sem qualquer restrição. Assim, não tendo sido verificado o terceiro requisito exigido pela Lei, não foi caracterizado o acidente do trabalho.

Mas, extrapolando esse caso concreto, e se aquela lesão viesse a se...

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