Dos direitos da personalidade
Autor | Bassil Dower, Nelson Godoy |
Ocupação do Autor | Professor Universitário e Advogado em São Paulo |
Páginas | 134-154 |
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"Sendo uma expressão de personalidade, o nome de uma pessoa, viva ou morta, merece a proteção do Direito" (in RT 703/80).
Consideremos, como introdução ao direito da personalidade, os direitos autorais. Constatamos aí a existência de um direito da personalidade e de um direito patrimonial. O autor tem o direito de dispor da obra, de fruir, que é um direito patrimonial. Concomitantemente, tem o direito da personalidade, o direito moral do autor, um direito extrapatrimonial. Analise o inc. XXVII do art. 5º, da CF: "aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar".
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Em conclusão, pelas criações intelectuais o autor de obra literária, artística ou científica tem direitos morais, próprios da personalidade, e direitos patrimoniais.84
Por outro lado, foram, finalmente, regulamentados pelo Código Civil os chamados direitos da personalidade previstos expressamente pela Constituição Federal, cujo texto é o seguinte: "São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação" (art. 5º, X).
A personalidade é um atributo da pessoa natural. É um conjunto de faculdades e direitos que tem o homem, embora em estado de potencialidade. Todos nós o temos.
Tratando dos direitos da personalidade, com base em Maria Helena Diniz, Sílvio Venosa escreve o seguinte: "Para a satisfação de suas necessidades, o homem posiciona-se em um dos pólos da relação jurídica: compra, empresta, vende, contrai matrimônio, faz testamento etc. Desse modo, em torno de sua pessoa, o homem cria um conjunto de direitos e obrigações que denominamos patrimônio, que é a projeção econômica da personalidade". Continua: "Contudo, há direitos que afetam diretamente a personalidade, que não possuem conteúdo econômico direto e imediato. A personalidade não é exatamente um direito; é um conceito básico sobre o qual se apóiam os direitos".85
Dentre os direitos subjetivos que tem o homem, distinguem-se duas espécies:
01) os destacáveis. São os direitos separados da pessoa. A propriedade, por exemplo, é um direito destacável;
2) os não destacáveis. São os direitos inerentes à pessoa, direitos da personalidade ligados diretamente a ela de tal modo que são perpétuos e permanentes, como o direito à vida, à liberdade, ao nome, à imagem. "Cuidando-se do direito à imagem, - decidiu o STJ - o ressarcimento se impõe pela só constatação de ter havido a utilização sem a devida autorização. O dano está na utilização indevida para fins lucrativos, não cabendo a demonstração do prejuízo material ou moral. O dano, neste caso, é a própria utilização para que a parte aufira lucro com a imagem não autorizada de outra pessoa" (in RT 760/211).
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Os direitos da personalidade ou personalíssimos são os direitos que fazem parte da personalidade do titular como os direitos à liberdade, à vida, à saúde, à própria imagem, ao nome. Direito indisponível, inegociável, absoluto, vitalício, oponível contra todos, intransmissível. Vale ter presentes as palavras de Carlos Alberto Bittar sobre o assunto em tela: "Os direitos de personalidade são dotados de constituição especial, para uma proteção eficaz da pessoa, em função de possuir, como objeto, os bens mais elevados do homem. Assim, o ordenamento jurídico não pode consentir que o homem deles se despoje, conferindo-lhes caráter de essencialidade: são, pois, direitos intransmissíveis e indispensáveis, extra-patrimoniais, imprescritíveis, impenhoráveis, vitalícios, necessários e oponíveis erga omnes, sob raros e explícitos temperamentos, ditados por interesses públicos".86
A Constituição Federal, em seu art. 5.º, X, trata o direito da personalidade como um direito fundamental. Analise a dicção textual do inciso do artigo acima referido: "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação". Portanto, o direito da personalidade é tutelado pela nossa Constituição como um direito fundamental. Destaca-se o direito à imagem: O direito à imagem permite até que a pessoa escolha de como lhe convém aparecer em público, retirando, se desejar, os proveitos econômicos próprios pelo uso de sua imagem. Ainda, o direito à imagem assegura ao retratado o direito de impedir a reprodução ou veiculação de sua imagem. É evidente que o retratado tem o direito de difundir ou publicar sua própria imagem.
Os direitos da personalidade são aqueles que surgem dos atributos da pessoa humana sem os quais esta não pode existir. A personalidade consiste no conjunto de caracteres próprios da pessoa natural e estão inseridos no rol dos direitos fundamentais. Enfim, os direitos da personalidade considera a pessoa humana. Desde os primórdios da civilização humana sempre se verificou a existência de um rol básico de direitos da personalidade que exigiram a proteção do Estado.
O nosso entendimento, de que os direitos da personalidade são verdadeiros direitos subjetivos, é corroborado pelo preclaro Prof. Arnoldo Wald "pois implicam em criar um dever jurídico de abstenção para todos os membros da coletividade". E continua: "Assim nos casos de cerceamento da
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liberdade sexual ou de injúria, calúnia ou difamação, prejudicando a honra alheia, temos simultaneamente o recurso à via penal e à ação civil, obtendo-se por meio desta o ressarcimento dos prejuízos causados".87
Com maestria, Carlos Alberto Bittar preleciona, ainda, que nos "direitos da personalidade, a pessoa é, a um só tempo, sujeito e objeto de direitos, remanescendo a coletividade, em sua generalidade, como sujeito passivo; daí, dizer-se que esses direitos são oponíveis erga omnes (e, portanto, devem ser respeitados por todos os integrantes da coletividade). Trata-se, pois, de relação de exclusão, que impõe a todos a observância e o respeito a cada pessoa, em seus componentes citados, sob pena de sancionamento pelo ordenamento jurídico".88
Com o advento da Constituição Federal de 1988, a proteção à honra, à intimidade e à imagem de uma pessoa, passou a provir do seu art. 5.º, X, que é uma cláusula pétrea89.
A invasão da intimidade, a ofensa à honra ou a utilização não autorizada da imagem permitem ao prejudicado o direito de pleitear a reparação por quem as causou. "Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei" (CC, art. 12). Por conseguinte, os escritos, a palavra, a imagem e a intimidade das pessoas são protegidos contra atos prejudiciais ou não autorizados pelos titulares ou pela lei, com direito à indenização pelos danos decorrentes, inclusive a honra, a boa fama e a respeitabilidade. Analise o princípio estampado no art. 21 do CC: "A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma".
As características gerais traçadas pelo Código Civil estão no fato de
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que os direitos de personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, salvo previsão legal. É o que dita textualmente o art. 11 do CC, in verbis:
"Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária".
Estão aí incluídos os direitos à integridade do próprio corpo, direito ao nome, que não pode ser utilizado comercialmente por ninguém sem a autorização da pessoa, direito à privacidade etc. Proíbe, como vimos, os atos de disposição do próprio corpo, quando importarem diminuição permanente da integridade física, ou contrariarem os bons costumes, salvo exigência médica. Devemos relembrar que a lei garante o uso de medidas que façam cessar a ameaça ou a lesão, ao direito da personalidade, prevendo perdas e danos.
Concluindo: O direito da personalidade tem as seguintes características:
-
indisponibilidade;
-
intransmissibilidade. Ainda:
-
extrapatrimonialidade;
-
imprescritibilidade.
É importante salientar que os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1, III da Constituição Federal (Princípio da Dignidade da Pessoa Humana) e em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação90.
Os direitos da personalidade, geralmente, extinguem-se com a morte. Mas se há ofensa à honra do falecido atingindo seus familiares, qualquer
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parente em linha reta ou colateral até o quarto grau, ou o cônjuge sobrevivente tem legitimidade para defender o honra do morto. É o que determina o parágrafo único do art. 12 do CC, in verbis: "Em se tratando de morto, terá legitimidade para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau".91
Não é demais lembrar que o direito aqui discutido só pode ser de pessoa física, pois é um direito que decorre da personalidade do homem. Não da pessoa jurídica, embora tenha ela o direito de preservar sua imagem (nome e marca). Mas será uma proteção de fundo patrimonial decorrente de norma comum.
Ninguém pode ser...
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