Dos fatos jurídicos

AutorBassil Dower, Nelson Godoy
Ocupação do AutorProfessor Universitário e Advogado em São Paulo
Páginas265-274

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18. 1 Considerações introdutórias

Depois de tratarmos dos sujeitos de direito (pessoa física e jurídica); depois de estudarmos o objeto do direito (bens jurídicos), passaremos à análise da maneira pela qual se estabelece a relação entre os sujeitos e o objeto, dando lugar à aquisição e à perda dos direitos. Essa maneira de ligação entre os sujeitos e o objeto é o fato jurídico.

Um fato é um acontecimento e nenhum direito ou obrigação pode nascer, modificar-se ou extinguir-se, senão em decorrência de um fato. Por exemplo, o término de um contrato de trabalho é um fato, um acontecimento. Quando o término do contrato acontece sem a atuação da vontade das partes, caracteriza-se um fato jurídico natural. A morte do empregado é um fato jurídico natural, porque esse acontecimento ocorreu independentemente da vontade das partes contratantes.

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Outras vezes, no entanto, o acontecimento ocorre em função de uma manifestação da vontade. Quando os acontecimentos decorrem da atividade humana, e influem na esfera do direito, temos os chamados fatos jurídicos voluntários, correspondente a todo acontecimento humano capaz de criar, modificar, conservar ou extinguir relações jurídicas.

Vê-se, desse modo, que o fato jurídico ou é acontecimento que ocorre independente da vontade da pessoa, ou é acontecimento que se assenta na vontade.

18. 2 Fato simples e fato jurídico

Distingue-se o fato simples, do fato jurídico. No primeiro caso estão os acontecimentos provocados pela natureza, dos quais não resulta nenhuma conseqüência jurídica. Um raio que cai em alto mar sem ocasionar dano algum, ou o eclipse são acontecimentos que não fazem nascer, modificar ou extinguir qualquer direito. Se o raio, porém, atinge um barco de pescadores, ocasionando a morte influi na esfera do direito, determinando o nascimento, a modificação ou a extinção dos direitos e, nesse caso, o acontecimento é considerado um fato jurídico. Fatos reconhecidos e regulados pelo Direito são jurídicos e como tais, produzem efeitos.

O fato jurídico, por conseguinte, resulta em conseqüência jurídica, enquanto o fato simples não determina o nascimento, a modificação ou a extinção de direitos.

Fato jurídico, portanto, é o acontecimento dependente ou não da vontade, que produz conseqüência jurídica, isto é, faz nascer, modificar ou extinguir direitos. Conforme Clóvis Beviláqua, com base na definição clássica de Savigny, "fatos jurídicos são os acontecimentos, em virtude dos quais as relações de direitos nascem e se extinguem".188

18. 3 Classificação dos fatos jurídicos

Tanto os acontecimentos originários dos fatos jurídicos naturais como os decorrentes da atividade humana, são espécies do gênero fato jurídico em

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sentido amplo "latu sensu". Quando defluem da natureza são considerados involuntários; temos, aí, os fatos jurídicos propriamente ditos, "stricto sensu". Eis alguns: nascimento, cessação de incapacidade, morte natural. Se os acontecimentos decorrem da atividade humana, isto é, dependem da vontade, desde que produzam, também, efeitos jurídicos, temos os atos ou negócios jurídicos, desde que esses acontecimentos não tenham sido praticados contra a lei. O casamento, por exemplo, é um ato jurídico por estar caracterizada a voluntariedade dos efeitos que produz, sem intuito negocial.

O ato ou negócio jurídico é um ato de vontade, mas que produz efeitos jurídicos. Tem que ser um ato lícito, fundado em direito. Quando o ato humano (decorrente da atividade humana) produz efeitos contrários ao ordenamento jurídico, haverá um ato ilícito, que produz, efetivamente, reflexos no mundo do Direito e, por isso, iremos analisá-lo mais adiante.

Nosso Código Civil, ao tratar dos fatos jurídicos, como pressupostos da relação jurídica, não alcança os fatos jurídicos naturais; abrange apenas os atos jurídicos ou os negócios jurídicos e os atos ilícitos, os quais analisaremos nos capítulos seguintes, separadamente.

De outra banda, vale ter presente o princípio estampado no art. 185 do CC, in verbis:

"Aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, aplicam-se, no que couber, as disposições do Título anterior".

Dessa maneira, os atos lícitos que têm intuito negociais são negócios jurídicos. Aquele que não tem o intuito negocial, qualificado pela atuação humana, é um ato jurídico.

Vê-se, pois, que os fatos jurídicos dividem-se em atos lícitos (atos jurídicos) e negócios jurídicos. Consoante ensinamento de Sílvio Venosa, "a moderna doutrina prefere denominá-los negócios jurídicos, por ver neles o chamado intuito negocial. Assim, serão negócios jurídicos tanto o testamento, que é unilateral, como o contrato, que é bilateral, negócios jurídicos por excelência. Quem faz um testamento, quem contrata está precipuamente procurando atingir determinados efeitos jurídicos. Desses atos brotam naturalmente efeitos jurídicos, porque essa é a intenção dos declarantes da vontade. Já nos atos meramente lícitos não encontramos o chamado intuito negocial".189Aí aparece o ato jurídico.

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18. 4 Os efeitos aquisitivos, modificativos e extintivos do fato jurídico

Nenhum direito ou obrigação pode nascer...

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