Dos impactos negativos do NCPC no processo do trabalho

AutorAntonio de Pádua Muniz Corrêa
Páginas187-238

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As incompatibilidades do novo cpc com o processo do trabalho

Com a sanção da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015novo CPC – acendeu-se uma luz de alerta no meio trabalhista, principalmente porque determinadas alterações foram pensadas para o Processo do Trabalho, porém, a Justiça do Trabalho não foi ouvida para opinar, contribuir e dizer se tais alterações eram pertinentes e convenientes. Entraram em nossa casa e não pediram licença, fato tipicamente arbitrário e, no mínimo, deselegante.

De logo, pergunta-se: o Processo do Trabalho foi revogado pelo novo Processo Civil? Começamos logo com esta interrogação para sabermos se o novo CPC aplicar-se-á integralmente, sem qualquer ressalva, à Justiça do Trabalho, ou vai persistir o sistema de incompatibilidades que vigora nessa seara.

Além desta indagação, levantamos uma outra: o Processo do Trabalho perdeu a sua autonomia com a vigência do novo CPC? Tentaremos deixar claro o sentimento de um magistrado trabalhista de uma forma não radicalizada, deixando averbado que o Processo do Trabalho possui princípios, regras e rotinas próprias, tonificadas por uma singeleza peculiar. Por isso, o novo CPC não será encarado como lei fundamental, essencial e imprescindível nessa seara. Ao contrário, será força auxiliar ao procedimento trabalhista.

Pela redação do art. 15237 do NCPC, restou mais do que evidente que o Processo do Trabalho não foi anulado, revogado ou abrrogado, eis que nada mais é senão uma norma de civilidade, a qual, após breve intervenção dos trabalhistas, passou a pedir licença para adentrar à casa alheia, cabendo ao dono desta permitir o acesso ou não, segundo a sua conveniência ou interesse. Seria até dispensável em face dos termos do septuagenário art. 769 da CLT.

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Diante de tais evidências, torna-se inquestionável que o Processo do Trabalho continuará trilhando sua matriz, suas molas mestras, colunas, seus princípios e, acima de tudo, sua simplicidade, porque integralmente rígido e mantido na sua essência, eficiência, celeridade e na sua autonomia, haja vista a norma do art.15 do novo CPC falar em ausência de norma trabalhista para que o mesmo seja chamado, ou seja, quando houver omissão.

Por isso, caberá aos comandantes (juízes do trabalho) do navio – chamado Justiça do Trabalho – manterem-se no curso traçado há muitos anos, todos atuando apoiados no quarteto: simplicidade, celeridade, efetividade e compatibilidade.

Não podemos esquecer que na Justiça Comum o demandado/devedor, na grande maioria das causas, é sempre alguém abastado e que dispõe de meios para suportar um litígio demorado, pois dentre eles estão os Bancos, Companhias Telefônicas, grandes Imobiliárias, grandes Financeiras, grandes redes de super-mercados etc. Já na Justiça do Trabalho, a condição financeira do demandante é diametralmente oposta, por isso, tudo aquilo que alongar a demanda, deixá-la cara, dificultá-la ou inviabilizá-la, por meio de incidentes embaraçosos, será incompatível com o Processo Operário.

O processo, enquanto instrumento de pacificação e de materialização do direito reconhecido por um título, deve guardar íntima convivência com a celeridade, efetividade, singeleza de formas, omissão e compatibilidade. Em sendo assim, resssai que a primeira indagação deve ser respondida negativamente, ou seja, o novo CPC não revogou a CLT quanto ao Processo do Trabalho.

Portanto, segue íntegro, destarte, o sistema de complementaridade por omissão e por incompatibilidades, valendo ressaltar que, no processo de execução, por força do art. 889 da CLT, o primeiro sistema a ser consultado será a Lei de Executivos Fiscais, já que, a especialidade, em regra, afasta a generalidade.

Sendo o Processo Civil lei de caráter geral, deve respeitar as especificidades ou especialidades de outros ramos. É tão verdadeira esta premissa que o próprio art. 15 do NCPC faz ressalva expressa aos processos especiais que possuem regras próprias, tais como o trabalhista, o eleitoral e o administrativo.

Esta mesma ressalva foi novamente reafirmada no § 2º do art. 1.046238 do NCPC, segundo o qual permanecem em vigor as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, aos quais se aplicará supletivamente as novas regras do NCPC, ou seja, estas aplicar-se-ão tanto no caso de lacuna (omissão) quanto no de haver necessidade de complementação de regras processuais, mas, sempre jungidas à efetividade, simplicidade, celeridade, omissão

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e compatibilidade. Esta é uma regra de ouro a chamar à colação o NCPC, a ser seguida com prudência.

Por isso, a segunda interrogação deve ser respondida positivamente, isto é, a autonomia do Processo do Trabalho continuará ditando o procedimento sincrético em sua simplicidade, celeridade e efetividade, isto porque suas regras atuarão como força dominante, enquanto que as do novo CPC como força auxiliar.

Resta, pois, evidente que o NCPC continuará sendo aplicado ao Processo do Trabalho naquilo em que houver omissão, e, se tal regra não for incompatível com o quinteto que o sustenta, como visto acima. Não fosse só isso, havendo norma expressa no Processo Operário, por se tratar de norma especial, esta afastará as do NCPC, ainda que sejam recomendáveis e até desejáveis, salvo se a regra celetista for incompleta e exigir complementação, ajustando-se harmonicamente como uma luva.

A propósito, acerca das diferenças entre subsidiariedade e complementariedade, colho da doutrina de Edilton Meireles239:

E a resposta nos é dada pelo sub-relator da proposta legislativa que incluiu no projeto do novo CPC a expressão “supletiva”. Para o Deputado Federal Efraim Filho, “aplicação subsidiária visa ao preenchimento de lacuna; aplicação supletiva, à complementação normativa”.

Mais adiante, falando ainda sobre a lacuna ou omissão, MEIRELES240 assevera: “Daí se pode ter que regra supletiva processual é aquela que visa a complementar uma regra principal (a regra mais especial incompleta)”. Contudo, avançando no seu estudo da supletividade, MEIRELES241 registrou sua preocupação fazendo duas ressalvas. Vejamos:

Contudo, duas ressalvas devem ser postas de modo a não incidir a regra supletiva mesmo quando diante de uma suposta omissão. Primeiro porque, da norma mais especial se pode extrair a impossibilidade de aplicação da regra supletiva dada a própria disciplina da matéria. Tal ocorre quando a legislação mais especial esgota a matéria, não deixando margem para aplicação supletiva.

Por fim, concluiu o ilustre escritor acima citado que a supletividade não pode substituir integralmente a norma a ser complementada, sob pena de haver plena e completa revogação, por interpretação hermenêutica do exegeta. Eis o dito por Meireles242:

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Assim, em suma, neste ponto, podemos concluir que a regra subsidiária visa preencher a lacuna integral (omissão absoluta) do corpo normativo. Já a regra supletiva tem por objeto dar complementação normativa ao que foi regulado de modo incompleto (omissão parcial). Ali falta a regra, aqui a regra é incompleta. Ali, supre-se a ausência da regra; aqui, complementa-se a regra que não esgota a matéria.

Citamos, então, algumas incompatibilidades do NCPC, em um olhar ligeiro e ainda inquieto: o foro de eleição, previsto no art. 63243, o adiantamento das despesas processuais, principalmente os honorários periciais, previsto no § 1º do art. 82244 c/c art. 84, os honorários advocatícios, notadamente aqueles previstos no § 1º do art. 85245, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, na forma prevista no art. 134246, os centros de solução consensual de conflitos, previstos no art. 165247, a contagem dos prazos apenas em dias úteis, constante

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no art. 219248, o aditamento da petição inicial após o oferecimento da defesa em caso de ilegitimidade ad causam do réu ou de o mesmo não ser o responsável pelo prejuízo invocado, consoante art. 338249, o julgamento parcial do mérito, como preleciona o art. 356250, a inquirição de testemunhas diretamente pela parte, ante a literalidade do art. 459251, o tópico da sentença de que fala o art. 489, principal-mente o seu § 1º, IV e V252, além do art. 491253.

Feito o registro dos pontos polêmicos ou em colisão, especificarei, em apertada síntese, as razões pelas quais penso ser inaplicável a norma civilista:

Foro de eleição

O foro de eleição previsto no art. 63 do NCPC é completamente incompatível com o princípio da finalidade social, pois os órgãos da Justiça do Trabalho, nos limites da sua competência específica, atuarão tendo em vista o interesse do menos favorecido.

No Processo do Trabalho o polo ativo é, via de regra, ocupado por um trabalhador desempregado, ou seja, é quase sempre a parte hipossuficiente ou, em linguagem mais realista, o pobre, o necessitado, o desvalido economicamente.

Foi movido por essa situação – desprovimento econômico – que o legislador de 1943, ao editar a CLT, propiciou ao trabalhador um equilíbrio jurídico ante o desequilíbrio econômico, por isso elegeu alguns princípios protetores, promovendo

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um aparente desequilíbrio na relação processual, privilegiando a parte pobre, em alguns atos processuais, como, por exemplo, na sua ausência à primeira audiência, fato que gerará apenas...

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