Dos Pressupostos Recursais

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz Titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo. Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP. Professor Convidado dos Cursos de Pós-Graduação da PUC/SP (Cogeae)
Páginas114-185

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1. Conceito

Conforme José Augusto Rodrigues Pinto100:

Pressuposto, em seu sentido comum, é adjetivo qualificado de algo que se conjectura fazer. No direito passa a ter significado substantivo de ‘circunstância ou fato considerado antecedente de outro’. Neste último sentido, exato, restrito, devem ser compreendidos pressupostos recursais em qualquer sistema processual, inclusive o trabalhista, uma vez que todo recurso tem seu processamento e seu conhecimento invariavelmente sujeitos ao exame de atendimento de antecedentes imediatos, sem os quais a interposição se torna inoperante.

Os pressupostos recursais também são denominados pela doutrina como requisitos de admissibilidade dos recursos, pois constituem requisitos prévios que o recorrente deve preencher para que seu recurso seja conhecido e julgado pelo Tribunal.

Como bem adverte Nélson Nery Júnior101, estes requisitos não têm o condão de influir no mérito do recurso, razão pela qual não se classificam como questões prejudiciais.

Trata-se, na verdade, de pressupostos processuais de validade e desenvolvimento do recurso e também requisitos de viabilidade da pretensão recursal. São pressupostos processuais e condições da ação na esfera recursal.

Os pressupostos processuais são apreciados, provisoriamente, pelo órgão do qual se recorre: a quo, não obstante compete ao órgão ad quem, para o qual se recorre, a competência de decidir de forma definitiva sobre a admissibilidade do recurso.

Segundo classificação da melhor doutrina, os pressupostos processuais se dividem em: intrínsecos e extrínsecos. Há ainda, os que clasificam os pressupostos em objetivos e subjetivos. Os objetivos ligados ao próprio recurso, e os subjetivos, ligados à pessoa do recorrente.

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Ensina Nélson Nery Júnior102:

Os pressupostos intrínsecos são aqueles que dizem respeito à decisão recorrida em si mesma considerada. Para serem aferidos, leva-se em consideração o conteúdo e a forma da decisão impugnada. De tal modo que, para proferir-se o juízo de admissibilidade, toma-se o fato judicial impugnado no momento e da maneira como foi prolatado. São eles o cabimento, a legitimação para recorrer e interesse em recorrer (...). Os pressupostos extrínsecos respeitam aos fatores externos à decisão judicial que se pretende impugnar, sendo normalmente posteriores a ela. Nesse sentido, para serem aferidos não são relevantes os dados que compõem o conteúdo da decisão recorrida, mas sim fatos a ela supervenientes. Deles fazem parte a tempestividade, a regularidade formal, a inexistência de fato impeditivo ou modificativo do direito de recorrer e o preparo.

Adotando a classificação do professor Nery Júnior, podemos subdividir os pressupostos recursais no Processo do Trabalho da seguinte forma:

  1. intrínsecos: cabimento, legitimação para recorrer, interesse recursal, e inexistência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito de recorrer;

  2. extrínsecos: regularidade formal, tempestividade, e preparo.

2. Pressupostos recursais intrínsecos
2.1. Cabimento

Os recursos devem ser cabíveis à decisão a ser impugnada. Primeiramente, o ato judicial deve ser recorrível, ou seja, ser passível de impugnação por medida recursal. De outro lado, o recurso deve ser adequado a impugnar a decisão. Se a parte interpuser o recurso incorreto para a decisão, ele não será conhecido, salvo as hipóteses de aplicação do princípio da fungibilidade.

Esse pressuposto está atrelado aos princípios da taxatividade e unirrecorribili-dade dos recursos, pois a parte somente pode interpor os recursos previstos na lei processual.

Conforme destaca Nélson Nery Júnior103, a recorribilidade e a adequação precisam andar parelhas, pois se, por exemplo, contra a sentença se interpuser o agravo, não se terá preenchido o pressuposto do cabimento, ocasionando o não conhecimento do recurso.

Exemplifica, também, adverte Renato Saraiva104, caso a decisão judicial não seja passível de impugnação via recurso (como ocorre em relação aos despachos de

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mero expediente ou relativamente às decisões interlocutórias), o recurso não será conhecido em face da ausência deste pressuposto.

Desse modo, não basta a parte não se conformar com a decisão e pretender sua reforma para poder recorrer, o Recurso deve estar previsto em Lei e ser o meio processual adequado à impugnação da decisão.

No aspecto, vale destacar a seguinte ementa:

EMENTA: AGRAVO DE PETIÇÃO - INTERPOSIÇÃO ANTES DE EMBARGOS À EXECUÇÃO - INADEQUAÇÃO SISTÊMICA - NÃO CONHECIMENTO (...) Consumada a condenação, cabe à parte tratar de cumpri-la, e não iniciar infindável repetição de recursos. A defesa possível ao executado está vazada nos termos do art. 884/CLT, pelo meio de embargos, após a garantia do juízo. Ademais, ainda em sede destes últimos, que deve ser exceção, somente se pode arguir a alegação de cumprimento do julgado, prévia quitação ou a prescrição da pretensão executiva. A interposição de agravo de petição antes dos embargos à execução é, pois, prematura e inadequada, não desafiando conhecimento, por impropriedade sistêmica". (TRT da 3ª Região, 8ª Turma, AP 0000411-05.2012.5.03.0005, rel. Juiz convocado Vitor Salino de M. Eça, publicado em 14.9.2012)

2.2. Legitimidade

Legitimidade é a pertinência subjetiva da ação, ou seja, quais pessoas têm uma qualidade especial para postular em juízo, pois têm ligação direta com a pretensão posta em juízo. No processo de conhecimento, a legitimidade deve ser aferida no plano abstrato. Desse modo, está legitimado aquele que se afirma titular do direito e em face de quem o direito é postulado.

Em razão dos princípios do acesso à justiça, da inafastabilidade da jurisdição e o caráter instrumental do processo, a moderna doutrina criou a chamada teoria da asserção de avaliação das condições da ação, também chamada de aferição in statu assertionis. Segundo essa teoria, a aferição das condições da ação deve ser realizada mediante a simples indicação da inicial, independentemente das razões da contestação e também de prova do processo. Se, pela indicação da inicial, estiverem presentes a legitimidade, o interesse de agir e a possibilidade jurídica do pedido, deve o Juiz proferir decisão de mérito.

A legitimidade recursal é a pertinência subjetiva para recorrer, ou seja, quais pessoas podem interpor recurso no processo.

Na esfera recursal, não se aplica a teoria da asserção, uma vez que a lei processual determina, de forma taxativa, quem pode recorrer.

A CLT não disciplina a questão. Desse modo, resta aplicável ao Processo do Trabalho (art. 769 da CLT) o disposto no art. 996 do CPC, in verbis:

"O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.

Parágrafo único. Cumpre ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual."

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Desse modo, podem recorrer no Processo do Trabalho: a) as partes do processo;

  1. o Ministério Público quando atuou como parte ou oficiou como fiscal da ordem jurídica; c) o terceiro juridicamente interessado.

    As partes que figuraram no processo - reclamante, reclamado, litisconsortes, assistentes, denunciados à lide, chamados à lide, opoentes - podem recorrer, pois figuraram no processo na fase de conhecimento.

    2.2.1. Da Legitimidade do terceiro

    Pode também recorrer o terceiro prejudicado (artigo 996 do CPC), ou seja, aquele que não participou do processo na fase anterior ao recurso, mas que tem interesse jurídico, pois pode sofrer os efeitos e ser prejudicado pela decisão.

    A doutrina tem sustentado que os terceiros, para recorrer, devem demonstrar o chamado interesse jurídico, ou seja que sofrerá os efeitos da decisão, como acontece nas hipóteses de assistência e intervenção de terceiros. Desse modo, o recurso do terceiro é modalidade de intervenção de terceiros na fase recursal.

    Como bem destaca Nelson Nery Junior105, "o CPC confere legitimidade para recorrer ao terceiro prejudicado pela decisão. Exige, no entanto, a demonstração, pelo terceiro, do liame existente entre a decisão e o prejuízo que esta lhe causou. É terceiro aquele que não foi parte no processo, quer porque nunca tenha sido, quer haja deixado de sê-lo em momento anterior àquele em que profira a decisão. Este recurso do terceiro prejudicado não é mais do que uma espécie de intervenção de terceiro na fase recursal."

    Diante da EC n. 45/04, o instituto da intervenção de terceiros passa a ser admitido com maior flexibilidade no Processo do Trabalho, máxime quando não se postula um crédito oriundo da relação de emprego. Entretanto, cabe ao Juiz do Trabalho, como diretor do processo, zelar pela celeridade e efetividade do procedimento (art. 765 da CLT), avaliar o custo-benefício da intervenção de terceiros e indeferi-la quando não traga benefícios aos litigantes, não iniba o direito de regresso e gere complicadores desnecessários ao rápido andamento do processo.

    Desse modo, ao avaliar a pertinência do recurso de terceiro, deve o Tribunal verificar não só a existência do interesse jurídico em recorrer, mas também o custo-benefício que o recurso trará para o processo.

    Podemos citar como terceiros que podem recorrer no Processo do Trabalho: o sócio de empresa reclamada que foi condenada; e a empresa do mesmo grupo econômico que não participou do processo.

    2.2.2. Legitimidade do INSS

    A Emenda Constitucional n. 20/98 acrescentou o § 3º ao art. 114 da CF, atribuindo competência à Justiça do Trabalho para executar, de ofício, as contribuições previdenciárias das sentenças que proferir.

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