Alfabetização ecológica e cultura constitucional

AutorJeferson Dytz Marin
CargoDoutor em Direito ? UNISINOS. Mestre em Direito ? UNISC. Professor do Mestrado em Direito Ambiental da UCS. Pesquisador CNPQ da UCS
Páginas119-139
Alfabetização ecológica e cultura
constitucional
Jeferson Dytz Marin*
1. Introdução
A educação, hoje, especialmente no que tange às Ciências Humanas –
com peculiar interesse nas Ciências Jurídicas – tem sinalizado no sentido
do rompimento com o estudo sacralizado do direito que venera as verda-
des absolutas e o mito da certeza jurídica, esteios do vã afã de estabilizar
as relações sociais.
Por certo que o Direito não consiste num receituário pronto, que é a
panacéia para todas as patologias sociais, através da mera aplicação da lei
aos fatos concretos. O Direito, com ênfase na recuperação do pensamento
aristotélico, traz atualmente um novo pensar, construído a partir da veros-
similhança, da quase certeza, das verdades relativas que permitem que a
Ciência Jurídica acompanhe a evolução social, ditando seu mote a partir
da convivência humana e não a partir da busca incessante de leis que guar-
dem angularização perfeita com o fato social em apreço, numa perspectiva
kelseniana. Enf‌im, o direito rompeu com o cartesianismo, com o raciona-
lismo e encontrou-se num novo locus das ciências do espírito.
A construção do conhecimento diário e a relação docente-discente têm
muito a se benef‌iciar dessas teorias que fundamentam a idéia de siste-
ma social, combatendo o positivismo-ortodoxo, que fecha o direito num
* Doutor em Direito – UNISINOS. Mestre em Direito – UNISC. Professor do Mestrado em Direito Ambiental
da UCS. Pesquisador CNPQ da UCS. Email: jdmarin@ucs.br
Direito, Estado e Sociedade n.39 p. 119 a 139 jul/dez 2011
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limbo e percebe-o como detentor de todos os instrumentos necessários à
disciplina dos fatos sociais, através da aplicação da subsunção absoluta,
impossível do ponto de vista pragmático, o que acaba por dar azo aos de-
cisionismos, arbitrariedades e enf‌im, apreciações calcadas numa axiologia
externa ao direito, fruto de pretensões pessoais, que muitas vezes conf‌litam
com as pretensões anunciadas pelas constituições.
Fundamental, nesse sentido, que o Direito desenvolva uma “pedagogia
da alfabetização ecológica”, com o intuito de f‌irmar a relevância do
caráter intergeracional do meio ambiente. A construção de uma cultura
constitucional que contribua para uma sociedade ciente de seus direitos
civis, sociais e, especialmente, do dever de proteção do ambiente como
legado às futuras gerações constitui um caminho muito mais sólido do
que a coerção, que gera efeitos pontuais e descontextualizados.
2. A contribuição da teoria da complexidade para a ciência jurídica
O Direito, ao contrário do que convenciona principalmente a teoria
kelseniana, que se alinha à matriz analítico/normativista – por óbvio, com
as inf‌luências das particularidades dos períodos históricos –, não produz
consenso, mas sim diferenças. E é essa produção de diferenças que permite
o surgimento de novos paradigmas e def‌lagra a construção do Direito a
partir do próprio Direito, com cortes epistemológicos da f‌ilosof‌ia, da semi-
ótica, da sociologia e demais ciências correlatas.
Uma das teorias que se propôs a compreender essas novas dimensões
educacionais, que rompem com o cartesianismo, foi a teoria sistêmica, que
registra uma série de variantes. Dentre elas, pode-se trazer à baila um pen-
samento que foi iniciado nos anos oitenta, sustentado por dois biólogos
chilenos, Humberto Maturana e Francisco Varela, que revolucionaram as
Ciências Biológicas com a teoria autopoiética1. Estes autores buscavam a
resposta para um problema histórico da ciência e da f‌ilosof‌ia: o da vida.
Através de pesquisas neurof‌isiológicas, os biólogos descobriram que um
sistema vivo apresenta no seu circuito interno uma interação fechada de
seus elementos constituintes, possibilitando sua auto-organização e a au-
to-reprodução dos mesmos elementos que constituem este sistema. Tais
1 A palavra autopoiesis denota auto-organização e é trabalhada, na sociologia, dentre outros, por Niklas
Lhumann. Vem do grego, auto (por si próprio) e poiesis (criação, produção, poesia).

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