Educação à distância e formação profissional do/da assistente social: elementos para o debate

AutorClaudia Neves da Silva, Patrícia Palmeira Gonçalves
Páginas90-100

Page 90

90 DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-02592020v23n1p90

ESPAÇO TEMÁTICO - SERVIÇO SOCIAL: FORMAÇÃO, TRABALHO POFISSIONAL E TENDÊNCIAS TEÓRICAS CONTEMPORÂNEAS

Educação a distância e formação profissional do/da assistente social: elementos para o debate

Patrícia Palmeira Gonçalves 1

https://orcid.org/0000-0002-2450-4145

1 Prefeitura Municipal de Londrina, Secretaria Municipal de Assistência Social, PR, Brasil

2 Universidade Estadual de Londrina, Departamento de Serviço Social, Programa de Pós-Graduação em Serviço Social e Política Social, PR, Brasil

Educação a distância e formação profissional do/da assistente social: elementos para o debate

Resumo: Este artigo tem por objetivo analisar em que medida a formação em Serviço Social a distância se fundamenta ou se distancia dos princípios das diretrizes curriculares da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) de 1996. O Ensino a Distância está previsto na política educacional de ensino superior no Brasil e se caracteriza pela mercantilização e por um discurso de democratização que escamoteia a precarização do ensino. Não temos por intenção fazer críticas ou julgamentos em relação aos trabalhadores ou estudantes desta modalidade. Verificamos que o ensino a distância tem se operacionalizado como ensino de massa e a padronização e a tecnologia como mediador principal submete os trabalhadores à alienação do trabalho. Esse é um determinante do processo formativo nessa modalidade. Outras características levantadas foram, a superficialidade do material apostilado, que não contempla o rigor teórico-metodológico preconizado pelas diretrizes da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social e a inexistência do tripé ensino-pesquisa-extensão.

Palavras-chave: Serviço Social. Diretrizes Curriculares. Ensino a Distância. Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social.

Distance Learning and Social Workers’ Professional Education: Elements for Debate

Abstract: The purpose of this article is to analyze the extent to which distance social work training is based on or distant from the principles of the ABEPSS curriculum guidelines of 1996. We set out to analyze educational policy based on the framework we have adopted, distance education policy in Brazil, characterized by excessive commercialization and a discourse of democratization that eschews the precariousness of teaching, and does not expose or criticize the workers or students who work and study in this modality, that “motivates” the subjects to act in this modality is the material reproduction of the daily life. We have verified that distance education has been operationalized as mass education. Standardization and technology as the main mediator subjects workers to alienation at work. This is a determinant of the formative process in this modality. Other characteristics raised were the superficiality of the apostilled material, which does not contemplate the theoretical - methodological rigor advocated by ABEPSS guidelines and the inexistence of the tripod research - teaching and extension.

Keywords: Social Work. Curricular Guidelines. Distance learning. ABEPSS.

Recebido em 30.06.2019. Aprovado em 17.09.2019. Revisado em 20.11.2019.

© O(s) Autor(es). 2020 Acesso Aberto Esta obra está licenciada sob os termos da Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional (https://creativecommons.org/licenses/by-nc/4.0/deed.pt_BR), que permite copiar, distribuir e reproduzir em qualquer meio, bem como adaptar, transformar e criar a partir deste material, desde que para fins não comerciais e que você forneça o devido crédito aos autores e a fonte, insira um link para a Licença Creative Commons e indique se mudanças foram feitas.

R. Katál., Florianópolis, v. 23, n. 1, p. 90-100, jan./abr. 2020 ISSN 1982-0259

Claudia Neves da Silva2https://orcid.org/0000-0003-1337-4741

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Introdução

O interesse pelo Ensino à Distância (EaD) no Serviço Social surgiu após participação e vivência no conjunto Conselho Federal de Serviço Social (CFESS)/Conselho Regional de Serviço Social (CRESS)da Seccional de Londrina, na gestão de 2014-2017. O tema nos chamou a atenção por ser um assunto sobre o qual o conjunto tem tratado com frequência e por residir em uma região onde existe uma instituição que oferece o curso de Serviço Social a distância.

O fato de residir e estudar na cidade onde há, atualmente, a coordenação do maior grupo educacional em EaD, de certa forma funcionou como um facilitador no que diz respeito a acessar as/os profissionais que trabalham nesta modalidade de ensino, e um dificultador, por ter um grande número de assistentes sociais da região que são trabalhadores do ensino a distância, como tutores ou professores, e por vezes não se sentirem à vontade para tratar do assunto, por receio de sofrer algum preconceito ou represália por parte da instituição.

O motivo que nos levou a estudar essa modalidade de ensino é a preocupação com a formação e o exercício profissional do/da assistente social, tendo em vista que pelas pesquisas realizadas por Pereira (2012), na última década esta modalidade teve grande crescimento, o que provocará mudanças no perfil dos/das assistentes sociais nos próximos anos.

Acreditamos que à medida que ampliarmos o debate, trazendo cada vez mais para a concretude do cotidiano, poderemos avançar no sentido da formação que a categoria profissional deseja, através do projeto profissional que foi construído no decorrer desses oitenta anos – 1936/2019. Assim, temos por objetivo analisar em que medida a formação em serviço social a distância se fundamenta ou se distancia dos princípios das diretrizes curriculares da ABEPSS de 1996.

Os sujeitos que fizeram parte do universo da pesquisa são professores, tutores e aluno do ensino a distância que trabalharam e estudaram respectivamente na instituição de ensino superior a distância. Para evitar constrangimento ou retaliação da instituição de ensino aos sujeitos da pesquisa, decidimos por selecionar àqueles que já se desligaram da instituição, não os identificar pelo nome e não identificar o período que trabalharam na instituição. Nossa amostra constituiu-se de 1 (um) professor, dois tutores e 1 (um) estudante1.

Para a realização da análise dos dados coletados, elegemos como parâmetro as diretrizes curriculares da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), publicadas no ano de 1996. Afinal, as diretrizes são frutos de um processo histórico de amplo debate entre as instituições de ensino de Serviço Social, cujo objetivo foi definir o perfil profissional que se deseja formar, a partir do acúmulo teóricometodológico, técnico-operativo e ético-político realizado na profissão.

As orientações dos organismos internacionais para o ensino superior brasileiro

Nas últimas décadas, os sujeitos políticos coletivos do capital - Grupo Banco Mundial (BM), Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e, mais recentemente, a Organização Mundial do Comércio (OMC) “ vêm promovendo e orientando um conjunto de reformas econômicas e políticas para os países da periferia do capitalismo (LIMA, 2007). Nesse conjunto de contrarreformas estão inseridas as reformas educacionais, cuja premissa é a de que o acesso à capacitação é o passaporte para a empregabilidade e o desenvolvimento.

A privatização dos serviços públicos, incluindo a política de educação, principalmente a educação superior nos países da periferia do capitalismo se daria, segundo Lima (2007), através de dois processos norteadores: a diversificação das instituições de ensino superior (IES) e dos cursos e a diversificação das fontes de financiamento. Esses eixos e orientações estão presentes no documento O ensino superior: as lições derivadas da experiência (BANCO MUNDIAL, 1994).

Neste documento estão expressas as estratégias para a reforma da educação superior na América Latina, Ásia e Caribe. A estratégia de diversificação das instituições e dos cursos de ensino superior, sob o pressuposto do desenvolvimento de universidades públicas, privadas e de instituições não universitárias, se concentra principalmente em cursos politécnicos e de curta duração, direcionados para trabalhadores e filhos de trabalhadores.

O documento também destaca o Ensino a Distância, que “[...] pode ser eficaz para aumentar, a um custo moderado, o acesso dos grupos desfavorecidos, que em geral estão deficientemente representados entre os estudantes universitários” (BANCO MUNDIAL, 1994, p. 36).

No Brasil, as mudanças na educação superior foram consubstanciadas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB-96). O capítulo sobre educação superior da LDB, segundo Sguissardi e Silva Júnior (1999), é uma espécie de plataforma legal a dar guarida presente e futura à série de ações de reforma que se fundamen-

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tam em princípios defendidos tanto por organismos supranacionais, como o Banco Mundial, quanto por analistas e mentores nacionais da modernização do sistema de educação superior no País.

Ainda de acordo com Sguissardi e Silva Júnior (1999), a associação de ensino, pesquisa e extensão (modelo humboldtiano) deveria estar restrita a algumas instituições universitárias, com a maioria dedicando-se apenas ao ensino; não obstante a Lei n. 5.540 de 1968 preconizar o modelo humboldtiano das universidades de pesquisa, a realidade se apresentava de forma diferente: na década de 1990-das quase 900 instituições de ensino superior existentes no país, apenas 140 estavam organizadas como universidades, sendo as demais instituições isoladas e excepcionalmente desenvolvendo pesquisas (SGUISSARDI; SILVA...

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