Equiparação salarial e reforma trabalhista

AutorGustavo Filipe Barbosa Garcia
Páginas150-155

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Ver Nota1

1. Introdução

A equiparação salarial concretiza o princípio fundamental da igualdade no plano do Direito do Trabalho, especificamente quanto à contraprestação a ser recebida pelo empregado.

A igualdade, em sentido mais amplo, é assegurada no art. 5º, caput, e inciso I, da Constituição Federal de 1988.

No Estado Democrático de Direito, que tem como um de seus objetivos “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º, inciso III, da Constituição da República), a mencionada igualdade não pode ser meramente formal, mas também em seu aspecto substancial.

Logo, deve-se conferir tratamento igual àqueles em iguais condições e desigual àqueles em condições desiguais2.

A equiparação salarial também concretiza o princípio de proibição da discriminação, o qual figura como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil (art. 3º, inciso IV, da Constituição de 1988).

A respeito do tema, segundo Américo Plá Rodriguez, o princípio da não discriminação no Direito do Trabalho “leva a excluir todas aquelas diferenciações que põem um trabalhador numa situação de inferioridade ou mais desfavorável que o conjunto, e sem razão válida nem legítima”3.

Nesse enfoque, os incisos XXX, XXXI e XXXII do art. 7º da Constituição Federal de 1988 estabelecem disposições fundadas na vedação de discriminação, as quais também devem ser observadas quanto ao tema em estudo4.

No plano internacional, a Convenção n. 100 da OIT, promulgada pelo Decreto n. 41.721/1957, prevê a igualdade de remuneração entre homens e mulheres.

A Convenção n. 111 da OIT, promulgada pelo Decreto n. 62.150/1968, veda a discriminação no emprego e qualquer distinção, exclusão ou preferência, baseada em sexo.

Por sua vez, a Convenção n. 117 da OIT, promulgada pelo Decreto n. 66.496/1970, prevê que um dos fins da política social deve ser o de suprimir qualquer discriminação entre trabalhadores por motivo de raça, cor, sexo, crença, filiação sindical, no que se refere ao contrato de trabalho, inclusive quanto à remuneração.

2. Requisitos da equiparação salarial

O art. 461 da CLT estabelece os requisitos do direito à equiparação salarial, tendo a sua redação modificada pela Lei n. 13.467/2017, que dispõe sobre a reforma trabalhista.

Trata-se de critérios estabelecidos pelo sistema jurídico para que se possa concluir pelo direito de receber o mesmo valor salarial de outro empregado.

Como já mencionado, a identidade de tratamento exige igualdade de condições, as quais, a rigor, verificam-se quando presentes os requisitos legais da equiparação salarial5.

Nesse sentido, conforme estabelece o art. 5º da Consolidação das Leis do Trabalho, a “todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual, sem distinção de sexo”.

Cabe analisar cada um desses requisitos, que devem ser interpretados em consonância com os seus fundamentos constitucionais, com destaque não apenas aos princípios

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da igualdade e da proibição de discriminação, mas da valorização do trabalho e da dignidade da pessoa humana6.

3. Identidade de função

Segundo o art. 461 da CLT, com redação dada pela Lei n.
13.467/2017: “Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade”.

O critério fundamental para o direito à equiparação salarial é que a função exercida pelos empregados seja a mesma.

Faz-se necessária a efetiva identidade de funções, independentemente da denominação formal atribuída aos cargos, pois prevalece a primazia da realidade no âmbito das relações trabalhistas.

Além disso, não basta a mera semelhança de atribuições, sendo exigida a identidade nas tarefas e atividades desempenhadas entre os empregados, para que façam jus ao mesmo salário.

A respeito do tema, conforme a Súmula n. 6, item III, do TST: “A equiparação salarial só é possível se o empregado e o paradigma exercerem a mesma função, desempenhando as mesmas tarefas, não importando se os cargos têm, ou não, a mesma denominação”.

Admite-se a equiparação salarial entre empregados que exercem funções intelectuais, mesmo porque a lei não faz restrições a respeito.

Nesse sentido, assim prevê a Súmula n. 6, item VII, do TST: “Desde que atendidos os requisitos do art. 461 da CLT, é possível a equiparação salarial de trabalho intelectual, que pode ser avaliado por sua perfeição técnica, cuja aferição terá critérios objetivos”.

Entretanto, há evidente dificuldade em saber quais podem ser efetivamente os mencionados “critérios objetivos”, tornando a prova da identidade de funções certamente mais difícil no caso de trabalho intelectual.

Ainda quanto ao tema, de acordo com a Orientação Jurisprudencial n. 297 da SBDI-1 do TST:

Equiparação salarial. Servidor público da administração direta, autárquica e fundacional. Art. 37, XIII, da CF/1988. O art. 37, inciso XIII, da CF/1988, veda a equiparação de qualquer natureza para o efeito de remuneração do pessoal do serviço público, sendo juridicamente impossível a aplicação da norma infraconstitucional prevista no art. 461 da CLT quando se pleiteia equiparação salarial entre servidores públicos, independentemente de terem sido contratados pela CLT.

O art. 37, inciso XIII, da Constituição Federal de 1988 estabelece ser “vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público”.

Portanto, conforme o entendimento firmado pela Súmula Vinculante n. 37 do STF: “Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia”.

Frise-se que a Orientação Jurisprudencial n. 297 da SBDI-1 do TST é voltada apenas ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional.

Diversamente, quanto ao empregado público da socie-dade de economia mista, aplica-se a Súmula n. 455 do TST, com a seguinte redação:

Equiparação salarial. Sociedade de economia mista. Art. 37, XIII, da CF/1988. Possibilidade. À sociedade de economia mista não se aplica a vedação à equiparação prevista no art. 37, XIII, da CF/1988, pois, ao admitir empregados sob o regime da CLT, equipara-se a empregador privado, conforme disposto no art. 173, § 1º, II, da CF/1988.

O mesmo entendimento também pode ser aplicado, em tese, ao empregado público de empresa pública, tendo em vista o mesmo fundamento do art. 173, § 1º, inciso II, da Constituição Federal de 1988.

4. Identidade de empregador

Outro requisito para a equiparação salarial é que o empregador dos empregados seja o mesmo.

Esse aspecto pode apresentar maior dificuldade quando se trata de empresas do mesmo grupo econômico (art. 2º, § 2º, da CLT). A controvérsia a respeito da existência (ou não) de empregador único na hipótese reflete no tema voltado à equiparação salarial.

Efetivamente, caso seja adotada a teoria do grupo de empresas como empregador único, como ocorre na situação retratada na Súmula n. 129 do TST7, o requisito em questão estará presente.

Caso prevaleça a teoria de que o grupo econômico acarreta apenas a responsabilidade solidária, ou seja, a solidariedade passiva, sendo o empregador cada empresa

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distinta, não haverá identidade de empregador entre empregados de empresas diversas, ainda que pertencentes ao mesmo grupo econômico.

Defende-se que essa análise deve ser feita em cada caso concreto, objetivando verificar, na realidade dos fatos, se o empregador verdadeiro é o próprio grupo econômico ou a empresa em si, isto é, se a relação jurídica de emprego é mantida, na verdade, com o grupo em seu todo ou com certa empresa que dele participa.

Tratando-se da primeira situação, em que o grupo figura como o empregador único, entende-se que o mencionado requisito estará presente.

5. Identidade de estabelecimento

Como se verifica do art. 461, caput, da CLT, com redação dada pela Lei n. 13.467/2017, exige-se que os empregados trabalhem no mesmo estabelecimento empresarial, para haver o direito à identidade de salário.

Anteriormente, o art. 461 da CLT exigia, de forma mais ampla, a “mesma localidade”.

A atual previsão do art....

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