Escalas de construção da Justiça: Nancy Fraser à luz de Rainer Forst

AutorJosé Rodrigo Rodriguez
CargoProfessor da Graduação, Mestrado e Doutorado da UNISINOS, Pesquisador Permanente do CEBRAP, São Leopoldo, Rio Grande do Sul, E-mail: jrodrigorodriguez@gmail.com.
Páginas149-165
Escalas de construção da Justiça: Nancy
Fraser à luz de Rainer Forst
Scales of Justice Construction: Nancy Fraser in
light of Rainer Forst
José Rodrigo Rodriguez*
Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo – RS, Brasil.
1. Introdução
“Igualdade do que? Igualdade entre quem?”: como afirma Nancy Fraser,
tradicionalmente, estas têm sido as duas perguntas que as teorias da jus-
tiça procuram responder. “O que?” e “Quem?”, estas duas perguntam se
dirigem para os problemas da igualdade e da liberdade, que podem ser
expressos pelos conceitos de redistribuição e de reconhecimento. Ainda de
acordo com Fraser, estamos falando, respectivamente, de questões relativas
à distribuição de riqueza entre os cidadãos ou cidadãs e questões relativas ao
status dos cidadãos e cidadãs, ou seja, sua posição simbólica em relação aos
demais membros da sociedade.1
A par destas questões, segue a autora, a teoria da justiça contemporâ-
nea precisa responder a um outro tipo de questão, posta pelo processo de
globalização que se acelerou a partir dos anos 90 do século XX.2 Tal pro-
cesso vem relativizando o poder dos estados nacionais e, por via de con-
sequência, o poder da política, protagonizada por seus cidadãos e cidadãs,
de influir sobre a formação das normas que regulam a vida dos homens e
mulheres em suas respectivas sociedades. Vejamos como isso se dá.
* Professor da Graduação, Mestrado e Doutorado da UNISINOS, Pesquisador Permanente do CEBRAP, São
Leopoldo, Rio Grande do Sul, E-mail: jrodrigorodriguez@gmail.com.
1 FRASER, 2009.
2 FRASER, 2009, p. 12.
Direito, Estado e Sociedade n.57 p. 149 a 165 jun/set 2020
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Direito, Estado e Sociedade n. 57 jun/set 2020
Os cidadãos e cidadãs são afetados por uma série de decisões tomadas
por empresas transacionais ou por investidores internacionais sem ter o
poder de influir sobre elas. Decisões que podem resultar, por exemplo,
em problemas ambientais ou na falta de financiamento para o déficit de
determinados estados. Esta terceira dimensão da justiça, que permaneceu
em segundo plano enquanto a política nacional foi a principal protagonis-
ta, ganha centralidade e torna problemático o “quem” da teoria da justiça.
Não é mais autoevidente hoje que as questões de justiça digam res-
peito apenas aos estados nacionais e seus cidadãos e cidadãs, fato que le-
vanta problemas de enquadramento para as questões tratadas pelas teorias
de justiça. Os problemas de redistribuição e reconhecimento passam a ser
discutidos também no que diz respeito à sua escala, posto que estão liga-
dos, na maior parte das vezes, a fenômenos e instituições fora do alcance
dos estados nacionais.
Por exemplo, questões relacionadas à igualdade e à reforma do sistema
tributário, precisam hoje levar em conta os investidores internacionais, res-
ponsáveis por financiar as dívidas dos estados. Um aumento de impostos
pode resultar na falta de investimentos internacionais com consequências
graves para a capacidade dos estados de manter em funcionamento os ser-
viços públicos. Da mesma forma, problemas de liberdade, relacionados ao
desrespeito aos direitos civis de uma pessoa podem ser levados a instâncias
internacionais, por exemplo, o comitê de direitos humanos da ONU, res-
ponsável por se manifestar sobre abusos cometidos no âmbito dos estados
que tenham ficado impunes.
Por essas razões, é necessário, como mostra Nancy Fraser, raciocinar
em termos de escalas de justiça, buscando desenvolver uma teoria da jus-
tiça capaz de integrar todos os aspectos do problema. Aos problemas do
“que” e do “quem” será preciso acrescentar o problema do “como”, o qual,
como já dito, permanecia sem significativa problematização pelas teorias
da justiça, ainda centradas nos estados nacionais.3
O objetivo deste texto é apresentar as principais abordagens da teoria
da justiça hoje em debate com a finalidade de evidenciar suas diferenças
essenciais. Para realizar esta tarefa, iremos apresentar a visão de justiça
de Rainer Forst que, ao apresentar a sua posição, constrói uma classifica-
ção que nos parece extremamente útil para organizar as teorias da justiça
3 FRASER, 2009, p. 15.
José Rodrigo Rodriguez

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