Estabelecimento empresarial virtual: regime jurídico

AutorTarcisio Teixeira
Páginas27-33

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Introdução

Inicialmente, para tratarmos do estabelecimento empresarial virtual e os aspectos do trespasse e da proteção do ponto, mister se faz relembrar o que vem a ser o estabelecimento empresarial "convencional". No Brasil, a teoria do estabelecimento comercial foi introduzida por Oscar Barreto Filho, que o definiu como o "complexo de meios materiais e imateriais, pelos quais o comerciante explora determinada espécie de comércio".1

Por sua vez, o Código Civil de 2002, no art. 1.142, expressa que "considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária".

Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa lembra que o estudo do estabelecimento deve passar pelos tipos de universalidade - de fato e de direito -, noção de patrimônio, tutela jurídica dos bens, sua estrutura e funcionamento, elementos que o compõem e demais negócios a ele relativos.2 No entanto, iremos nos deter na questão dos bens corpóreos e incorpóreos, considerando que a internet como suporte do estabelecimento virtual opera em um sistema digitalizado.

Quanto aos bens que compõem o estabelecimento, os bens corpóreos são aqueles que se caracterizam por ocupar espaço no mundo exterior, por exemplo, as mercadorias, as instalações, as máquinas etc. Por sua vez, os bens incorpóreos são coisas imateriais, que não ocupam lugar no mundo exterior, sendo resultado da elaboração abstrata humana, como os títulos dos estabelecimentos, as marcas, as patentes, os desenhos industriais etc.3

Um dos temas mais relevantes quanto ao estabelecimento empresarial é a questão do ponto comercial, que é a localização física ou lugar do comércio (por sua vez, protegido pela ação renovatória do contrato de locação, de acordo com a Lei n. 8.245/1991, art. 51, que será visto a seguir).

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1. Estabelecimento empresarial virtual

Na internet, a localização virtual é dada por um nome de domínio, que, muitas vezes, se expressa pela mesma nomenclatura do título do estabelecimento (físico) ou pela nomenclatura da marca.

Ao falar do título do estabelecimento, Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa considera: "O título do estabelecimento corresponde ao nome ou à expressão utilizados pelo empresário para identificar o local onde está instalado".4 A marca, por seu turno, identifica o produto ou o serviço do empresário, diferenciando-os de outros da mesma natureza.5 Logo, é pelo site que a atividade do empresário - atuante no comércio eletrônico - passa a ser difundida e desenvolvida, pois é ali que seus clientes podem fazer as compras.

No mundo empresarial um site pode ser tido como estabelecimento virtual, cuja origem é o estabelecimento empresarial. Até alguns anos atrás, o estabelecimento era físico, em um local em que os clientes do empresário se dirigiam para realizar negócios. Mais recentemente, surgiu o estabelecimento virtual, que é um local não físico para onde os clientes também "vão" (não por deslocamento físico) em busca de negócios. O estabelecimento virtual é identificado pelo nome de domínio.

Assim, o site empresarial, ou estabelecimento virtual, passa a ter aptidão de produzir lucros para o empreendedor.

Esse fato é chamado "aviamento", que é a aptidão de produzir lucros conferida ao estabelecimento a partir do resultado de variados fatores pessoais, materiais e imateriais. É um atributo do estabelecimento, sendo a clientela um dos fatores do aviamento.6

Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa faz a distinção de aviamento objetivo e subjetivo. O primeiro decorre da localização do estabelecimento (local goodwill); o segundo, da competente atuação do empresário à frente de seu negócio (personal goodwill).7

Já a clientela é definida por Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa como "o conjunto de pessoas que, de fato, mantém com o estabelecimento relações continuadas de procura de bens e de serviços".8

Percebe-se que, os conceitos expostos até aqui (estabelecimento, título do estabelecimento, marca, aviamento e clientela) são aplicáveis ao fato de o site poder ser considerado um estabelecimento virtual. Dessa forma, o nome de domínio (que espelha o endereço virtual do estabelecimento) goza de proteção jurídica, que, no Brasil, é regulado pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto Br -NIC.BR.

Considerando-se que os bens que compõem o estabelecimento empresarial podem ser corpóreos e incorpóreos, parece que seria bastante razoável situar o estabelecimento virtual como um bem incorpóreo, por não ocupar lugar no espaço físico. Assim sendo, poderia ser considerado extensão do estabelecimento, uma vez que possibilita a comercialização de produtos e a prestação de serviços.

Sobre considerar o estabelecimento virtual "auxiliar" ou "extensão" do estabelecimento empresarial, Aldemário Araújo Castro defende que os sites não podem ser qualificados como estabelecimentos virtuais, devendo apenas ser considerados meras extensões dos estabelecimentos físicos.9

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Para Fábio Ulhoa Coelho é a acessibilidade que define se o estabelecimento empresarial é físico ou virtual; se para o acesso houver deslocamento no espaço é físico, se houver transmissão e recepção eletrôni-ca de dados é virtual; porém, há elementos comuns aos dois, a formação do fundo de comércio, por guardarem a mesma natureza jurídica.10

No que diz respeito à natureza jurídica do estabelecimento, seja físico ou virtual, Maria Eugênia Reis Finkelstein considera não haver diferenças entre ambos. A peculiaridade de cada um é basicamente a maneira como se tem acesso aos produtos ou serviços.11

Ainda sobre a natureza do site como estabelecimento, é importante trazer o que escreve Elidie Palma Bifano: "O web site, conquanto não possa ser tido como estabelecimento, integra o conjunto dos bens de que um comerciante se utiliza no desempenho de suas atividades, portanto integra o fundo de comércio e pode ser negociado com o conjunto formador do estabelecimento ou separadamente. O valor de mercado de um web site está diretamente vinculado ao número de visitas (clicks) que ele recebe".12

Nesse ponto, se o estabelecimento virtual for considerado aviamento objetivo (dada a localização virtual na internet), em especial pelo nome de domínio, tal opinião esbarra na questão tratada por Oscar Barreto Filho, segundo o qual o aviamento não existe como elemento separado do estabelecimento, não podendo ser objeto autônomo de direitos, por si só, suscetível de ser alienado ou dado em garantia.13

Mas, levando-se em conta que o aviamento agrega valor ao estabelecimento empresarial, podemos até dizer que há um fundo de comércio no estabelecimento virtual, na medida em que o site seja altamente conhecido pelo grande volume de negócios, o que acrescentaria valor ao seu trespasse.

Aqui, nesse momento, é importante ter presente o que escreveu Marco Aurélio Greco sobre os tipos de sites: meramente passivos; canalizadores de mensagens; e inteligentes.

Basicamente, segundo os apontamentos do autor, os meramente passivos são os que apenas mostram imagens, informações de alguém ou de produtos e serviços (parecido com outros veículos...

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